quinta-feira, 5 de outubro de 2006

Grupo de pressão

Um grupo de pressão é um grupo de interesse que exerce uma pressão, que passa do mero estádio da articulação e da agregação de interesses e trata de influenciar e pressionar o decisor político, saindo do âmbito do mero sistema social e passando a actuar no interior do sistema político. A pressão pode ser aberta ou oculta, pode actuar directamente sobre o decisor ou, indirectamente, actuando sobre a opinião pública. Entre as pressões abertas, destaca-se a acção de informação, a de consulta, bem como a própria ameaça. As duas principais formas de pressão oculta, isto é, não publicitada, são as relações privadas e a corrupção. As relações privadas passam pelo clientelismo, pelo nepotismo e pela pantouflage. A corrupção, como processo de compra de poder, tanto pode ser individual como colectiva, nomeadamente pelo financiamento dos partidos. Entre as acções dos grupos de pressão sobre a opinião pública, temos tanto o constrangimento como a persuasão. Na primeira, temos a greve, as manifestações, os boicotes ou os cortes de vias de comunicação. A persuasão tem sobretudo a ver com a propaganda e a informação.
Um interesse é o que faz o homem actuar, o fim que o movimenta, a relação de um homem com uma coisa ou com outro homem que lhe permite satisfazer uma necessidade. Já Cícero definia a res publica como uma multidão unida pelo consenso do direito e pela utilidade comum, ou por uma pacto de justiça e uma comunidade de interesses, que implicaria a communio. Pufendorf fazia derivar a sociabildade dos próprios interesses, porque os homens, em virtude daquilo que considera a imbecilitas, isto é, o desamparo de cada um, quando entregues a si mesmo, encontram-se num estado de necessidade (naturalis indigentia), necessitando uns dos outros para poderem sobreviver.
Hegel, por seu lado, fala na sociedade civil como a imagem dos excessos e da miséria, onde se desenrola o combate dos interesses privados, da luta de todos contra todos. Seria uma espécie de Estado Exterior (Aussererstaat), um Estado privado de eticidade, da consciência da sua unidade interna essencial, dado que na sociedade civil, apenas os indivíduos seus componentes se consideram governados pelos seus interesses particulares.
Jhering entende que a luta pelo direito abrange tanto a luta do homem pela realização dos respectivos interesses como a luta do Estado pela realização do interesse geral, chegando memso a considerar que os direitos subjectivos são interesses juridicamente protegidos.
Já Max Weber substituiu a noção de bem comum pela de interesse, salientando que enquanto a pertença à sociedade, ou associação, assenta numa partilha de interesses, marcada por uma vontade orientada por motivos racionais, já a comunidade é entendida como um grupo a que se pertence por aceitação de valores afectivos, emotivos ou tradicionais, considerando que a acção comunitária refere‑se à acção que é orientada pelo sentimento dos agentes pertencerem a um todo. A acção societária, por sua vez, é orientada no sentido de um ajustamento de interesses racionalmente motivado. Mais do que isso: Weber estabelece uma graduação associativa que passa pelos graus de sociedade, grupo, empresa, instituição, Estado. Na sociedade os indivíduos calculam os interesses mútuos. E de uma sociedade pode passar‑se ao grupo quando esse entendimento de interesses passa a contrato explícito, acontecendo uma empresa quando o fim é determinado de forma racional. Um grau mais elevado de empresa é a instituição, quando a empresa é habilitada a impor aos respectivos membros o seu comportamento pela via do decreto ou de textos regulamentares. Já os grupos de pressão exercem a chamada influência, essa forma atenuada de poder, de capacidade de actuar sobre o comportamento de um determinado actor, que não usa a força, a autoridade ou a função. O conceito de influência tem sido bastante desenvolvido pelos politólogos contemporâneos, principalmente por Lasswell e Dahl, principalmente pelas distinções feitas entre o mesmo e os conceitos de força e de poder.
A influência situa-se na zona de fronteira entre a manifestação do interesse e a pressão, situando-se antes da utilização da força. Para Harold Lasswell, é a capacidade de alguém poder impor, de forma coercitiva, determinados interesses numa determinada relação social. Se é menos do que poder, dado que este tanto implica uma participação na tomada de decisões, ligando-se a uma coerção mais severa, é, contudo, mais do que a força, dado que esta não passa de mera situação de facto. Tanto o poder como a influência constituem formas de relação entre pessoas, pela qual, uma delas, no lado activo, leva a que outra, situada no lado passivo, actua de forma diversa do que actuaria sem a pressão da primeira. Contudo, na relação de poder, um caso especial de influência, a sanção é mais forte do que no caso da influência.
Dahl faz uma distinção entre força, influência e poder. A força é entendida como mera situação de facto, enquanto a influência aparece como uma relação entre actores, onde um deles leva os outros a agir de modo diferente daquele em que teriam agido sem a presença do primeiro. Já o poder constitui um caso especial de influência que implica perdas severas para quem recusa conformar-se-lhe, significando a capacidade para alterar a probabilidade dos resultados a obter.
Já em 1867 o nosso Eça de Queirós indicava a influência como um género onde se incluíam várias espécies, se utilizavam como meios a compra pura e simples de votos, a pressão e ameaça. Daí o desencanto: doze ou quinze homens, sempre os mesmos, alternadamente possuem o Poder, perdem o Poder, reconquistam o Poder, trocam o Poder. O Poder não sai duns certos grupos, como uma péla que quatro crianças, aos quatro cantos de uma sala, atiram umas às outras, pelo ar num rumor de risos.

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Grupo de interesse

No estudo dos grupos de interesse e dos grupos de pressão, coloca-se neste momento o problema da regulamentação da actividade dos lobbies, tanto no plano intra-estadual, como no domínio das relações internacionais, no âmbito da chamada sociedade civil internacional. Vive-se, com efeito, o abandono do anterior general good sense com a introdução de formalized rules, nomeadamente com a introdução do registo de interesses dos parlamentares e com o estabelecimento de regimes de incompatibilidades.
No mesmo sentido, estudam-se formas de controlo da pantouflage, nomeadamente com o estabelecimento de regras sobre o emprego dos membros do governo, depois destes abandonarem as funções. Mas o estudo clássico dos grupos de interesse prossegue: Truman [1951], Milbrath [1963], LaPalombara [1964], Wooton [1970], Moe [1980], Berger [1981], Grelle [1987], Berry [1989], Loomis e Cigler [1991], Mundo [1992], Jeffrey Birnbaum [1992], e Petracca [1992]. Há, aliás, uma tendência para englobar os grupos de pressão no conceito mais vasto de grupos de interesse, começando a ser raros os trabalhos que utilizem como elemento central a expressão grupos de pressão - ver, contudo, Eckstein [1960], Castles [1967], Richardson [1979], e Ball e Millard [1987] - , apesar da politologia francesa persistir nesta terminologia. A partir dos trabalhos de Piker e Stritch [1974], Schmitter [1975 e 1979], Wilensky [1976], Wiarda [1977], Panitch [1980], Cawson [1982 e 1986], Katzenstein [1984], Grant [1985], Keeler [1987], Lehmbruch [1987], Scholter [1987], Magagna [1988], Colas [1988], e Crepz [1992], começou a delinear-se a teorização do neocorporatism, isto é, de um especial processo sócio-político distinto do pluralismo, em que os grupos de interesse voltam a ser uma espécie de corpos intermediários entre a sociedade e o Estado, constituindo organizações quase monolíticas, em número limitado. Uma teorização, iniciada a partir dos Estados Unidos, que visa responder à crise da representação política, do sindicalismo e da própria cidadania activa. Contrariamente ao pluralismo, no qual as organizações são rivais, no corporatism seria o centro do aparelho de poder estadual a decretar quais são as associações representativas, independentemente da autenticidade associativa das mesmas. No fundo, o corporatism é uma degenerescência do pluralismo e constitui um fenómeno pós-capitalista em que existe uma economia privada, mas não uma economia de mercado.
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Governo Constitucional (Eric Weil)

O contrário do governo autocrático. Se no governo autocrático os cidadãos não dispõem de qualquer recurso legal contra os actos da administração, já no governo constitucional há independência dos tribunais e o cidadão pode invocar o direito diante de autoridades independentes do governo e da administração e obter deles tanto a declaração de invalidade de uma medida legal como também a reparação de uma violação. Além disso, eis que no governo constitucional, a lei exige a participação dos cidadãos na feitura da legislação e na tomada de decisões políticas, pelo que a instituição que principalmente caracteriza o Estado constitucional é o parlamento que, exprimindo os desejos e a moral viva da sociedade-comunidade particular, permite e controla a acção racional e razoável do governo e dá-lhe a possibilidade de educar o povo.
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Governo, Estrutura do

História portuguesa

Só por abstracção e pela utilização de conceitos modernos é que pode falar-se numa administração pública medieval, dado não ser possível detectar na época conceitos como os de Estado ou de soberania, bem como um aparelho burocrático de poder, deles derivado.
O rei medieval, como protector e governador da comunidade, vai, sobretudo, administrar o regnum segundo os modelos do chefe de família na administração doméstica. E é a partir do núcleo da casa do rei, do palatium, domus, schola ou curia que vai diferenciar-se, gradualmente e por via costumeira, o que mais tarde irá constituir a administração pública do Estado. É precisamente a partir da Cúria Regia, constituída pelos próceres, maiores ou barões do reino (altos dignitários eclesiásticos e nobiliares, bem como familiares do rei) que vão destacar-se os principais funcionários palatinos e os futuros órgãos da administração central do reino. A cúria régia portuguesa , à semelhança da antecedente cúria leonesa, marcada pelo modelo franco, e na linha de continuidade do sacrum consistorium do Baixo Império Romano e do officium palatinum ou aula régia dos visigodos, tanto funcionava em reuniões restritas daqueles que constantemente acompanhavam o rei (cúria restrita ou ordinária) como em reuniões alargadas a todos os notáveis do reino (cúria alargada ou extraordinária). Deste último tipo de reuniões, vai surgir, a partir de 1254, com a participação do braço popular, a instituição das Cortes que, já em 1261, detém um verdadeiro direito em matéria tributária e, em 1331, passa a reunir apartadamente por braços, classes ou estados. Quanto à primeira forma, já na cúria condal de D.Henrique e de D.Teresa se detectam determinados funcionários palatinos com atribuições próximas dos actuais ministros. É o caso do armiger ou alferes-mor, porta-bandeira ou chefe da milícia; do maiordomus curiae ou mordomo-mor, também designado por dapifer curiae, com funções de superintendência na gestão do palácio e na administração civil do território; é também o caso do chanceler, cancelarius, notator ou notarius, responsável pela elaboração, validação e expedição de diplomas régios. Além destes grandes oficiais, existiam vários outros auxiliares, genericamente designados por ovençais (de obedentiales), dos quais se destacam o porteiro-mor, inicialmente intermediário no acesso à pessoa do rei e depois transformado em superintendente na cobrança de tributos e receitas patrimoniais régias, o capelão régio, o tenente dos selos de el rei, os notários ou tabeliães da corte e os escribas ou escrivães. Nos finais do século XII, surge também o dapifer regis ou vedor que vai exercer as funções de administração palaciana que anteriormente competiam ao mordomo-mor. Na hierarquia palatina, se nos primeiros tempos da guerra de reconquista, o primeiro lugar pertencia ao alferes mor, em breve caberá ao mordomo mor a coordenação dos ministros da coroa. Contudo, paralelamente à recepção do direito romano, começa a ganhar preponderância o chanceler mor que, pelo menos a partir de D.Dinis, já superintende em toda a administração régia. Refira-se o caso especial do escrivão particular ou da intimidade do rei, o chamado escrivão da puridade, com quem o rei despachava directamente e que vai converter-se no ministro da confiança do monarca. Já com D.Pedro I este funcionário tem a missão de distribuir assuntos pelos diversos ministros e o privilégio dum circuito burocrático próprio, independente da chancelaria régia. É também da cúria régia ordinária que vai corporizar-se o Conselho de El Rei, constituído pelos conselheiros privados do monarca, os privati, normalmente legistas, que já encontramos no tempo de D.Afonso III.
Vai também caber à Curia Régia auxiliar o monarca na administração da justiça, constituindo-se no tribunal supremo do reino. E a partir de meados do século XII surgem-nos determinados membros da cúria especializados em funções jurisdicionais, primeiro os sobrejuízes ou superjudices e, depois, também os ouvidores. Mais tarde, a cúria, enquanto tribunal, vai desdobrar-se em três casas: Casa de Justiça da Corte, Tribunal da Corte ou Tribunal da Casa do Rei ( com D.Afonso IV passa a designar-se Casa da Suplicação), que acompanhava o rei nas respectivas deslocações; Casa do Cível ou Casa do Cível e Crime, com sede fixa, primeiro em Santarém, e , depois, com D.João I, em Lisboa; Audiência da Portaria, na área do contencioso fiscal. No tocante à administração financeira, já em 1255 nos surge o referido porteiro-mor a que no século XIV vão suceder, primeiro, os ouvidores da portaria e, depois, os vedores da fazenda, ambos com funções quer de superintendência tributária quer de contencioso fiscal.No domínio da fiscalização financeira, com D.Dinis. destaca-se da cúria régia a estrutura dos Contos, cujo primeiro regimento conhecido data de 5 de Julho de 1389, desdobrados em Contos de Lisboa e Contos de El Rei e que D.Manuel unifica nos Contos do Reino e Casa, sob a direcção de um provedor mor. 2- Com a expansão ultramarina e a paralela estruturação do reino enquanto Estado, segundo os modelos organizacionais do romanismo justinianeu e por intermédio da centralização do poder real, o pluralismo quase pactício da monarquia medieval vai cedendo face ao monismo regalista do Estado Moderno. Mas o absolutismo pré-iluminista não vai fazer tábua rasa do pluralismo medieval, antes procurando conformá-lo a partir de dentro, pela instrumentalização dos respectivos mecanismos institucionais sem que, contudo, se atinja o uniformismo administrativizante. Tanto os centralismos sebastianistas e filipistas como o próprio despotismo de Pombal nunca degeneraram num centralismo geométrico, como vai acontecer com Mouzinho da Silveira e as posteriores reformas administrativas pós-revolucionárias, mantendo, na sua essência, o pluralismo institucional da chamada monarquia limitada pelas ordens.
Com o Estado Moderno surgem-nos já órgãos da administração pública claramente diferencados da administração privada das coisas do rei, órgãos claramente estaduais especializados e homogeneizados, cuja hierarquização e competência relativa vão variando ao longo dos tempos. Mas a sucessiva criação de novas estruturas não é, contudo, acompanhada pela extinção das anteriores, gerando-se uma aparente fragmentação de atribuições e uma sobreposição de serviços. Comum a todo este período é, contudo, a tendência para a criação de órgãos colectivos especializados, dotados de pesados aparelhos burocráticos de apoio, que vão actuando no espaço anteriormente ocupado por funcionários que estavam na directa dependência do monarca. Um dos princiais órgãos do Estado Moderno vai ser precisamente um deses conselhos: o Desembargo do Paço que detem um poder de jurisdição quase tão absoluto como o do próprio monarca, podendo dispensar as leis e usar poderes extraordinários não concedidos mesmo aos outros tribunais do paço. Já nas Ordenações Afonsinas nos apareciam os Desembargadores do Paço, integrados na Casa da Suplicação , com autonomia nas matérias de graça que tocassem à justiça. O órgão aparece autonomizado com D.João II e como estrutura dotada de competência própria já é tratado nas Ordenações Manuelinas (I,3).vai posteriormente ser objecto de sucessivas reformas e aperfeiçoamentos (diplomas de 10 de Outubro de 1534, 30 de Maio de 1553, 2 de Novembro de 1564 e 20 de Junho de 1568) até à estruturação que lhe foi dada por Filipe I (Regimento de 1582). Com D.João III, em 1532, é criada a Casa da Consciência, com atribuições em matérias que dissessem respeito à consciência do rei.mais tarde, com a incorporação na coroa das ordens militares, passa a designar-se Mesa da Consciência e Ordens. Detém, assim, uma larga esfera de acção, desde matérias do foro eclesiático à administração de bens das ordens, passando pelas capelas do padoado régio à própria tutela da Universidade - até ao século XVIII. Tem regimentos de 24 de Novembro de 1558, 20 de Junho de 1567 e 23 de Agosto de 1608. Embora não possa formalmente considerar-se um organismo dependente do estado, saliente-se o Conselho Geral do Santo Ofício, cuja criação foi autorizada por bula papal de 16 de Julho de 1547 e que vai ter o primeiro regimento logo em 1552.Em 1570 é o regimento do cardeal D.Henrique, aprovado por D.Sebastião; em 1613, o Regimento de Pedro Castilho, o primeiro a ser impresso; em 1640, o de Francisco de Castro; em 1774, o Regimento pombalino do Cardeal Cunha que vem equiparar o Santo Ofício a qualquer outro tibunal régio.è apenas extinto em 1821. Em 5 de Abril de 1768 era criada a Real Mesa Censória que D.Maria I extingue em 21 de Julho de 1787, substituindo-a pela Real Mesa da Comissão Geral sobre o Exame e Censura dos Livros.
A expansão ultramarina vai também impor a criação de novas estruturas organizacionais.Logo com D.Duarte surge uma Casa de Ceuta, em Lisboa, e, mais tarde, uma Casa da Guiné, primeiro em Lagos e depois em Lisboa, que virá a ser designada Casa da Mina, Casa da Guiné e Mina ou Casa da Mina e dos Trautos da Guiné e, nos primeiros anos do século XVI, Casa da Índia, predominantemente vocacionada para questões financeiras e comerciais. A Casa da Índia vem a ser extinta por Decreto de 17 de Setembro de 1833, passando as respectivas competência para a Alfandega Grande de Lisboa.
Em 14 de Julho de 1642, D.João IV criou o Conselho Ultramarino, com atribuições em áreas finnaceiras e administrativas, primeiro, da África e da Índia e , depois, de todo o ultramar, incluindo o Brasil. Retomava-se o episódico Conselho da Índia dos filipes, criado em 25 de Julho de 1604, mas logo extinto em 1614.O Conselho Ultramarino vai ser extinto por Decreto de 30 de Agosto de 1833 para ser novamente recriado por Decreto de 23 de Setembro de 1851. Na área da administração financeira vai surgir em 20 de Novembro de 1591 o Conselho da Fazenda, onde se integram a casa dos Contos, a Casa da Índia e as Alfandegas, competindo-lhe centralizar todas as matérias financeiras e sendo presidido pelo vedor da fazenda, assistido por quatro conselheiros. Em 1663 passa também a coordenar as matérias referentes às companhias de comércio. Com o Marquês de Pombal, por lei de 22 de Dezembro de 1761, o Conselho trnasforma-se em mero tribunal de jusrisdição voluntária e contenciosa, passando a competir ao Tesouro Geral ou Erário Régio a centralização de todas as receitas e despesas públicas, extinguindo-se também a Casa dos Contos. O Erário era presidido pelo Inspector-Geral do Tesouro, cargo exercido pelo Marquês de Pombal. Foi extinto pelo decreto nº 22 de 16 de Maio de 1832, sendo substituído pelo Tribunal do Tesouro Público. No domínio da administração económica, salienta-se a Junta de Comércio destes Reinos e seus Domínios, criada em 30 de Setembro de 1755, tendo como antecedente a Junta do Comércio, criada por D.João IV em 1649, esta com atribuições restritas à navegação comercial com o Brasil.A Junta oitocentista, que recebe estatutos em 16 de Dezembro de 1756, tem competência no tocante ao comércio externo e interno, à indústria agrícola e manufactureira e aos seguros.Dela estão dependentes a Mesa do Bem Comum dos Mercadores (licenciamento do comércio retalhista, com estatutos oficializados em 13 de Dezembro de 1757) e a Aula do Comércio (estatutos publicados em 19 de Abril de 1759). Por decreto de 1778 recebe também a categoria de tribunal régio passando a designar-se por Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, embora com mais reduzida actuação fiscalizadora. Em 1657 era também criada a Junta do Tabaco destinada a administrar um imposto sobre o produto, cuja rceita era consignada ao pagamento das guarnições militares do reino. Na área militar, com a Restauração, surge-nos o Conselho da Guerra, uma espécie de ministério colectivo da guerra e de supremo tribunal militar, que vai ter novo regimento em 22 de Dezembro de 1643. Para a administração dos fundos destinados à guerra é criada em 18 de Dezembro de 1643 a Junta dos Três Estados, composta por representantes das três classes representadas nas Cortes. A proliferação de juntas e conselhos especiais não impediu, contudo, a existência de um conjunto de altos funcionários na dependência directa do rei com intervenção nos negócios públicos e até a criação de um órgão de consulta pessoal do rei, o Conselho de Estado, surgido em 1562, durante a regência do Cardeal D.Henrique, e a que D.Sebastião vai dar regimento em 8 de Setembro de 1569. Este órgão durante o regime filipista é, de certa maneira, substituído pelo Conselho de Portugal em Madrid. É no Conselho de Estado que tomam assento os ministros assistentes ao despacho, os quais, com D.João IV já são coordenados por um secretário de estado. D.Afonso VI, por alvará de 29 de Novembro de 1643, cria duas secretarias de estado, a da Assinatura de Documentos Régios e a das Mercês, que prefiguram já os modelos dos ministérios contemporâneos, além de atribuir a tarefa de coordenação política ao velho cargo de escrivão da puridade, desempenhado, então, pelo Conde de Castelo melhor.D.Pedro I, que não volta a prover o cargo de escrivão da puridade, reune quotidianamente um Gabinete do Rei. Com D.João V, por alvará de 28 de Julho de 1736, surgem três secretarias de estado: a dos Negócios Interiores do Reino, a dos Negócios Estrangeiros e da Guerra bem como a da Marinha e dos Domínios Ultramarinos, às quais, por alvará de 15 de Dezembro de 1778, se vai acrescentar a dos Negócios da Fazenda que, no contudo, só entra em funcionamento em 6 de Janeiro de 1801, cabendo, por inerência ao respectivo secretário de estado, a presidência do Erário Régio e do Conselho da Fazenda. 3-A partir de 1820, o liberalismo vai modificar radicalmente as estruturas da administração pública portuguesa, estabelecendo um novo edificio político geometrizante que eliminou o pluralismo organizacional do antigo regime. Se as primeiras medidas se esboçam já nas Cortes Constituintes de 1821-1823, vai caber, no entanto, às reformas administrativas de Mouzinho da Silveira a estruturação do modelo administrativo de figurino napoleónico que, nas suas grandes linhas de força, ainda hoje nos rege. Uma administração pública uniformizante e ehierarquizada que serviu o demo-liberalismo, monárquico e republicano, e que o centralismo integracionista do estado Novo hipostasiou.Se o despotismo ministerial do iluminismo absolutista lançou as sementes do sitema de Estado contemporâneo, vai caber ao parlamentarismo liberal absolutizá-lo em nome da lei, como expressão da vontade geral, numa linha de continuidade cujo clímax se atinge com a governamentalização salazarista que, depois de 1974, só no plano do programático constitucional se superou. Ao conjunto das secretarias de Estado existentes, o liberalismo, logo nos seus alvores, vai acrescentar mais duas: por lei de 23 de Agosto de 1821 surge a dos Negócios Eclesiásticos e da Justiça e por decreto de 22 de Setembro de 1822 a dos Negócios Estrangeiros separa-se da da Guerra. E a Constituição de 1822 no respectivo artigo 122º enumerava as seguintes Secretarias de Estado:
-dos Negócios do Reino
-da Justiça
-da Fazenda
-da Guerra
-da Marinha
-dos Estrangeiros
A partir de 26 de Fevereiro de 1828, o legitimismo miguelista recria o cargo de Ministro Assistente ao Despacho , com funções de coordenação política, sucessivamente ocupado pelo Duque de Cadaval e pelo Conde de Basto. Deu também nova conjugação às Secretarias de Estado:
-Reino e Marinha
-Justiça
-Fazenda
-Guerra
-Estrangeiros
Entretanto, a partir de 3 de Março de 1830, instala-se em Angra do Heroísmo a regência liberal nomeada por D.Pedro, composta pelo marquês de Palmela, pelo conde Vila Flor e por José António Guerra. Esta nomeia nesse mesmo dia Mouzinho da Silveira como Secretário de Estado da Regência, com intervenção em todas as áreas governativas, situação que se mantem até 28 de Março de 1832, quando D.Pedro assume a regência e retoma a divisão por Secretarias de Estado à maneira de 1822.
Com efeito, a Carta Constitucional de 1826 não impunha um número rígido de secretarias de Estado, estabelecendo apenas que o rei é o chefe do poder executivo e o exercita pelos seus ministros de Estado (art.75º), bem como que haverá diferentes secretarias de Estado, pois a lei designará os negócios pertencentes a cada um, e seu número e as reunirá ou separará como mais convier (artigo 101º).
Mas a ordem das secretarias de Estado pouco irá variar ao longo do constitucionalismo monárquico. A Regeneração, por decreto de 30 de Agosto de 1852, cria o Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria, a partir do Ministério do Reino.
Em 22 de Junho de 1870 era criado ditatorialmente o Ministério da Instrução Pública, que em 27 de Dezembro do mesmo ano, virá a ser extinto por não concessão parlamentar do bill de indemnidade àquele acto da Saldanhada. Ainda em 5 de Abril de 1890 se restaura, até 3 de Março de 1892, o mesmo departamento com a designação de Ministério da Instrução Pública e das Belas-Artes.
A estrutura governamental dos primeiros tempos da República mantem o modelo anterior, apenas com alteração de certas designações:
-Ministério do Interior
-Ministério da Justiça (pelo Decreto nº 1 105, de 26 de Novembro de 1915, da Justiça e Cultos)
-Ministério das Finanças (em vez da anterior designação da Fazenda)
-Ministério da Guerra
-Ministério da Marinha e Colónias
-Ministério dos Negócios Estrangeiros
-Ministério do Fomento( em vez de Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria)

Vão surgindo ,entretanto, novos Ministérios:
-Ministério das Colónias (por Decreto da Assembleia Nacional Constituinte de 23 de Agosto de 1911), depois designado Ministério do Ultramar (Decreto-Lei nº 38 300, de 15 de Junho de 1951)
-Ministério da Instrução Pública (criado por lei de 7 de Julho de 1913), depois designado Ministério da Educação Nacional (Lei nº 1941, de 11 de Abril de 1936)
-Ministério do Trabalho e Previdência Social (criado pela Lei nº 494, de 16 de Março de 1916 e extinto pelo Decreto nº 11 627 , de 25 de Novembro de 1925)
-Ministério do Comércio (criado pelo Decreto nº 3511, de 5 de Novembro de 1917, com a extinção do Ministério do Fomento), depois designado Ministério do Comércio e Comunicações (Decreto nº 3902, de 9 de Março de 1918)
-Ministério da Agricultura (criado pelo decreto nº 3902, de 9 de Março de 1918)
-Ministério das Subsistências e Transportes (id.)
A partir de 28 de Maio de 1926, pelo Decreto nº 21 454, de 7 de Julho de 1932, surgem os Ministério do Comércio,Indústria e Agricultura e o Ministério das Obras Públicas e Comunicações. O primeiro , pelo Decreto-Lei nº 22873, de 24 de Julho de 1933, vai ser cindido em dois ( o Ministério do Comércio e Indústria e o Ministério da Agricultura), para, mais tarde, pelo Decreto-Lei nº 30692, de 27 de Agosto de 1940, se voltar a concentrar no Ministério da Economia. Quanto ao segundo, pelo Decreto nº 36061, de 27 de Dezembro de 1946, autonomizava-se o Ministério das Comunicações.
Pelo Decreto nº 37909, de 1 de Agosto de 1950, criavam-se, na Presidência do Conselho os lugares de Ministro da Presidência e de Ministro da Defesa, surgindo também um Ministério das Corporações e da Previdência Social, além de se mudar a desoignação do Ministério da Guerra para Ministério do Exército.
Pelo Decreto nº 41825, de 13 de Agosto de 1958, surgia o Ministério da Saúde e Assistência e pelo Decreto nº 43748, de 22 de Junho de 1961, surgiam, em lugar do Ministro da Presidência, dois lugares de Ministro de Estado Adjunto do Presidente do Conselho, depois reduzidos a um, pelo Decreto-Lei nº 46 618, de 10 de Outubro de 1968.

Presidente do Conselho
Saliente-se que as funções de coordenação política do Governo passam a ser legalmente exercidas, a partir da Carta de Lei de 23 de Junho de 1855, por um Presidente do Conselho de Ministros. Com a República surge-nos um Presidente do Ministério, que é necessariamente um dos ministros, segundo o sistema de gabinete. Com a Constituição de 1933 estabelece-se o Presidente do Conselho, que coordena e dirige a actividade de todods os ministros, que perante ele respondem politicamente pelos seus actos [artigo 108º], para depois de 1974, se introduzir a figura do Primeiro-Ministro.

A possibilidade de o número , a designação e as atribuições dos ministérios e secretarias de Estado, bem como as formas de coordenação entre eles poderem ser determinados ... pelos decretos de nomeação dos respectivos titulares (art. 186º da Constituição de 1976), conduziu a uma pulverização institucional dos ministérios e a uma proliferação de secretários e subsecretários de Estado, sem que se tenha redignificado o quadro de directores-gerais ou equiparados, como aconteceu durante o demoliberalismo, monárquico ou republicano.
Com a República Corporativa, em nome da participação dos elementos estruturais da Nação na vida administrativa (art. 5º da Constituição de 1933), vai intensificar-se a administrativização de sindicatos e associações patronais, bem como de outras associações profissionais, culturais e de assistência social que, sem nunca terem atingido a forma de um sistema corporativo integral, conformaram um intervencionismo estadual, nomeadamente na actividade económica, que o socialismo posterior a 1974 veio consolidar. Surgiu assim um sector empresarial do Estado quer a nível da administração indirecta, como nos organismos de coordenação económica e noutros institutos públicos, quer no domínio das empresas públicas e das empresas participadas ou intervencionadas pelo Estado.

Ministérios económicos depois de 1974
Por decreto de 15 de Maio de 1974, com o I Governo Provisório, surge o Ministério da Coordenação Económica, cujo titular é Vasco Vieira de Almeida, com seis secretarias de Estado: finanças, planeamento económico, indústria e energia, agricultura, comércio externo e turismo; e abastecimento e preços. Em 18 de Julho, com o II governo provisório, volta-se à separação entre o Ministério das Finanças e o Ministério da Economia. Com o III governo provisório, a partir de 26 de Março de 1975, este último ministério fracciona-se em cinco: ministérios do Planeamento e Coordenação Económica (Mário Murteira), da Indústria e Tecnologia, do Comércio Externo, da Agricultura e Pescas (Fernando Baptista) e dos Transportes e Comunicações. Com o V governo provisório, em 7 de Agosto, surge um Ministério do Comércio Interno (Macaísta Malheiros) que se mantém no VI governo provisório (Magalhães Mota, do PPD), com duas secretarias de Estado, a do comércio alimentar (Mário Baptista, PS) e do comércio não alimentar (Alfaia Pinto Pereira, PPD) e dois subsecretários de Estado, para a defesa do consumidor (Isabel Carmelo Rosa) e do fomento cooperativo (Bento Gonçalves)..
Com o I Governo Constitucional do PS, surge um Ministério do Comércio e Turismo (primeiro, com António Barreto, e depois com Mota Pinto).Mantém-se o Ministério da Agricultura e Pescas (primeiro, com Lopes Cardoso e depois com António Barreto) e surge um Ministério do Plano e da Coordenação Económica.

BIBLIOGRAFIA:
Antigo Regime
De 1640 a 1643, com D. João IV, apenas existia um cargo de Secretário de Estado, ocupado por Francisco de Lucena. A partir de 29 de Novembro de 1643, surge o Secretário das Mercês e do Expediente. Em 12 de Julho de 1662, surge um terceiro elemento, o Escrivão da Puridade, cargo ocupado pelo conde de Castelo Melhor, com regimento de 12 de Março de 1663. Depressa este último cargo passa a Secretário de Estado do Reino e notário público da Corte e da casa real. Em 28 de Julho de 1736, há apenas três secretarias de Estado: dos negócios interiores do reino (1); da marinha e domínios ultramarinos (2); dos negócios estrangeiros e da guerra (3). Estas três secretarias são coordenadas por um ministro assistente ao despacho, uma espécie de primeiro ministro. Em 19 de Julho de 1759, surge também um secretário adjunto dos negócios do reino, cargo ocupado pelo conde de Oeiras. Em 1788, surge mais uma secretaria de Estado, a da fazenda, que só entrou em funcionamento em 1801. Refira-se, no entanto, que, por duas vezes, a guerra se destacou temporariamente: em 1787 e em 1801.

Liberalismo
Contudo, em 1820, volta-se às três secretarias: do reino e fazenda; da marinha e domínios ultramarinos; e dos negócios estrangeiros e da guerra. Em 30 de Janeiro de 1821 já são cinco: reino, fazenda, guerra, marinha e estrangeiros. Passam a 6 em 23 de Agosto do mesmo ano, quando a justiça se destaca do reino.
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Golpe de Estado

Golpe de Estado, em sentido clássico, tem como paradigma o que foi levado a cabo por Luís Napoleão em 1851, quando, depois de eleito presidente da II República Francesa se proclamou como Imperador. Isto é, mudaram-se os titulares do poder, mas dentro dos mesmos quadros de legitimidade, ao contrário do que acontece numa revolução quando se muda a legitimidade estabelecida. Em sentido estrito, golpe de Estado é o ataque directo aos detentores do poder, conduzido pelos chefes das forças armadas. Com efeito, sob tal nome, abarcam-se outras movimentações como os pronunciamentos (intervenção de oficiais de carreira e de unidades, ou fracções de unidades regulares, que pretendem substituir um governo ou um regime, pela violência ou pela ameaça de violência, podendo também ser levados a cabo por milícias, com a passividade das forças armadas regulares), os levantamentos (um pronunciamento que depende da colaboração de guerrilhas ou de corpos de milicianos, bem como do apoio de populares, utilizando a violência à partida), a insubordinação colectiva de oficiais, os motins (desobediência colectiva de praças ou oficiais de patente inferior de uma dada unidade militar, com propósitos políticos ou simplesmente sócio-profissionais).Diverso é o conceito de rebelião, do lat. rebellione, recomeço das hostilidades, de rebellis, de re+bellum, aquele que recomeça ou retoma uma guerra. Através do cast. rebelde. Diz-se hoje da acção de resistência violenta a uma autoridade. Próximo do conceitos de revolta, sedição e insurreição. A rebelião é sempre uma oposição violenta, tem de mobilizar um conjunto significativo de pessoas e entra em confronto com uma autoridade legitimamente estabelecida. Alguns apontam que a rebelião se distingue da revolução, porque nesta se visa substituição dos governantes por membros de outra classe, enquanto a rebelião se joga dentro do mesmo grupo situacionista.

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Girondinos

Um dos clubes políticos da Revolução Francesa. Surgiram em 1791-1792, durante o regime da Assembleia Legislativa, destacando-se dos Jacobinos. Se dominam a Assembleia, não controlam Paris. Têm como chefes Gensonni, Guadet e Vergniaud, tendo o apoio do marquês de Condorcet. Com o regime da convenção, opõem-se ao grupo dos Montagnards, resultantes da fusão entre os jacobinos e os cordelliers. Apesar de dominarem a convenção são derrotados pelo golpe de Estado de 2 de Junho de 1793, passando à categoria de contra-revolucionários.

Gens

Instituição romana. O conjunto de famílias que se encontram ligadas e submetidas politicamente a uma autoridade comum, o pater gentis. Usam um nome comum por se julgarem descendentes de um antepassado comum. Dá origem à expressão gentílico, aquilo que provém de uma mesma raiz, aquilo que tem a mesma origem. É equivalente ao genos grego e ao conceito de natio de Santo Isidoro de Sevilha, cujo entendimento permanece até ao século XIX.

Funcionalismo

Doutrina que compara a sociedade a um organismo onde as diferentes parcelas da mesma exercem um determinado papel neessário para o conjunto. Segundo as teses de Talcott Parsons a sociedade e a respectiva cultura formam um sistema integrado d'accomplis sement de fonctions. Ao mesmo tempo que ocorria o choque da revolução behaviorista, desenrolava-se, nos domínios da ciência política, o processo de recepção das ideias de função, estrutura e de sistema, principalmente a partir das teorias gerais da antropologia e da sociologia.
Malinowski
Contudo, a aplicação do conceito de função no domínio das ciências sociais receberá um profundo incremento com o trabalho dos antropólogos evolucionistas como Bronislaw Malinowski (1884-1942) e Alfred Reginald Radcliffe-Brown (1881-1955) que estão, respectivamente, na base do funcionalismo absoluto, na teoria que pretende fornecer uma explicação completa e coerente de um dado objecto social, deduzindo-o das contribuições que esta dá para a satisfação de um certo número de necessidades sociais, e do funcionalismo estrutural, ou relativo, a teoria que utiliza o funcionalismo como mero paradigma formal que se propõe encarar os objectos sociais a partir das relações de contribuição que os ligam entre si e elaborar, nesta base, um certo número de propostas explicativas que não são vistas como necessárias nem exaustivas.

A partir de então, dizer função passa a significar dizer satisfação de uma necessidade e o todo social é visto como uma totalidade orgânica, onde cada elemento tem uma tarefa a desempenhar dentro de uma aparelhagem instrumental, conforme as palavras de Malinowski, autor que enumera uma série de princípios gerais que unem os seres humanos, os chamados princípios de integração. Em primeiro lugar, surge a reprodução, geradora de instituições como a família e o clã; em segundo lugar, vem o território, a comunidade de interesses devido à propinquidade, contiguidade e possibilidade de cooperação, gerando os grupos de vizinhança, entre os quais inclui os munícipios, a horda nómada, a aldeia e a cidade; em terceiro lugar, o princípio da integração fisiológica, as distinções devidas a sexo, idade e estigmas ou sintomas corporais; em quarto, as associações voluntárias; em quinto, o princípio da integração ocupacional e profissional, isto é, a organização de seres humanos por suas actividades especializadas para fim de interesse comum e mais plena execução de suas capacidades especiais; em sexto lugar, a classe ou condição, destacando nestas os estados medievais, as castas e as estratificações por etnia; em sétimo e último lugar coloca a assimilação, a integração por unidade de cultura ou por poder político, que tem a ver com a nação e o Estado, respectivamente. Refira-se que a tribo de Malinowski, segundo as suas próprias palavras, consiste num grupo de pessoas que têm a mesma tradição, o mesmo direito consuetudinário e as mesmas técnicas e igualmente a mesma organização de tipos menores, tais como a família, a municipalidade, a corporação ocupacional ou a equipa económica. Refere mesmo que o índice mais característico de unidade tribal lhe parece ser a comunhão de linguagem, pois uma tradição comum de habilidades e conhecimento, de costumes e crenças, apenas pode ser levada avante conjuntamente por pessoas que possuam a mesma língua.
Radcliffe-Brown
Já para A. R. Radcliffe-Brown, a função surge como o papel desempenhado na vida social total, a contribuição dada por um determinado elemento para a manutenção da estrutura.
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Fórmula de Cline

Segundo Ray S. Cline:

Pp = (C+E+M) x (S+W).

O poder apercebido - perceived power [Pp] é igual à massa crítica - função do território e da população [C] - mais capacidade económica [E], mais capacidade militar [M], vezes a coerência e adequação da estratégia nacional [S] mais a vontade nacional - a will to porsue national strategy[W], em função quer da vontade anímica da população, quer da sua adesão à estratégia nacional concebida pelo poder estabelecido.

Retirado de
Respublica, JAM

Elite

A expressão elite tanto pode ter uma conotação neutra, enquanto indivíduos ou grupos que ocupam as mais altas posições numa hierarquia social estratificada, como um sentido pejorativo, quando, com ela, quer significar-se um pequeno grupo de pessoas com um desproporcionado poder de influência sobre as decisões finais de um determinado grupo. Pode até ter um sentido positivo, quando com a expressão se entende um grupo de pessoas que possui melhores condições para o exercício de determinadas funções, nomeadamente pela educação recebida ou pelas capacidades demonstradas.

Neste último entendimento, a expressão tem a conotação de aristocracia, como o governo dos melhores, equivalendo à meritocracia e não ofendendo o princípio da igualdade, se existirem efectivas condições para o estabelecimento da igualdade de oportunidades.

De qualquer maneira, o estudo das elites constitui uma constante da ciência política. Depois de nos anos cinquenta, sessenta e setenta, dentro do esquema sociologista e comportamentalista, surgirem os trabalhos de Meisel [1957 e 1958], Benn e Peters [1959], C. Wright Mills [1956], Treves [1961], Keller [1963], Bottomore [1964], Parry [1969], Domhoff [1967, 1970, 1978 e 1990], Amstrong [1973], Giddens e Stanworth [1974], Austin [1975], Freund [1976], Putnam [1976], Lebedoff [1981], e Marger [1987], eis que, recentemente, se prossegue essa pesquisa numa perspectiva mais globalista, com destaque para os trabalhos de Pierre Birnbaum [1977 e 1985].

Entre nós também António Marques Bessa, na sua dissertação de doutoramento de 1993, Quem Governa? Análise Histórico-Política do Tema da Elite, e, posteriormente, n’A Arte de Governar, introduz o tema no universo da politologia portuguesa. O estudo das elites abrange não apenas a matéria teórica, como a investigação empírica sobre as elites administrativas, centrais e locais, os dirigentes e activistas políticos e os parlamentares.

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Conflito

Conflito vem do latim conflictus. Originário do verbo confligo, confligere. Choque entre duas coisas, embate de pessoas que lutam entre si. Na base, o radical grego flag que também aparece em flagelar. Diz-se do embate violento entre duas forças contrárias. É um estado de coisas onde duas ou mais partes reclamam a posse da mesma coisa quando esta não pode ser possuída simultaneamente pelas várias partes que a querem possuir.
Trata-se de situação normal em qualquer sistema social e condição fundamental para o desenvolvimento, se o sistema dispuser de condições para a resolução dos conflitos. Podem existir os mais variados conflitos, desde os conflitos de valores aos conflitos de interesses, para não falarmos dos próprios conflitos territoriais.Já Platão considerava a política como uma arte de conciliar contrários, semelhante à do tecelão, onde reinar é fazer juntar e convergir grupos opostos de seres humanos e até qualidades contrárias, como a bravura e a doç ura.A política é pois a arte de conciliar contrários. É a tensão entre o governo tirânico e o governo político. Entre o poder e a liberdade. Entre a coacção e o cumprimento espontâneo.Um governo legítimo é pois aquele que governa pelo consentimento e pela persuasão, aquele que, como o tecelão, sabe harmonizar contrários e que não usa a violência e a opressão.
Heráclito referia: o que se opõe, coopera, e da luta dos contrários deriva a mais bela harmonia. Porque só pode atingir-se a transcendência pela imanência. Porque todo o transcendente só pode ser um transcendente situado. Porque toda a essência só pode realizar-se através da existência. É o tal existencialismo que não é anti-essencialista e o tal laicismo que não é deicida. A política seria uma actividade de harmonização de contrários, obtida pelo consentimento e pela persuasão. Governar tornar-se-ia assim num processo de ajustamento entre grupos, num processo de negociação e de troca, num modo dinâmico de gerir crises, através da articulação de interesses.
Para Moses I. Finley, o conflito não é apenas inevitável; é também uma virtude na política democrática, porque é o conflito, em conjunto com o consentimento, e não o consentimento sozinho, que evita que a democracia se desgrace Para Bernard Crick o conflito não é apenas inevitável; é também uma virtude na política democrática, porque é o conflito, em conjunto com o consentimento, e não o consentimento sozinho, que evita que a democracia se desgrace. Porque, onde há política, há liberdade. Onde quer que seja que o governo reconheça, através de meios institucionais, a necessidade de consultar com os interesses divergentes, sobre bases regulares e conhecidas, porque a política é uma forma de governar nas sociedades divididas, sem o uso indevido da violência. Sendo a sociedade um complexo de grupos, a máquina que a faz funcionar é o processo de luta de grupos, mediante o qual todos os grupos tratam de realizar ou de elevar ao máximo os seus interesses. O resultado é uma espécie de caldeira de água a ferver, caracterizada por um equilíbrio instável, para utilizarmos as palavras de David Truman.
Aron é um dos grandes teorizadores do pluralismo, quando concebe que a democracia moderna, tem na sua realidade efectiva, poderá ser caracterizada pela institucionalização dos conflitos.
Isto é, a democracia, partindo do conflito, tende para a concórdia. Do lat. concordia, de cum mais cor, cordis, coração. O mesmo que harmonia e equilíbrio. Nome de uma deusa romana, filha de Júpiter e Témis, a qual era representada, tendo na mão um ramo de oliveira. A deusa grega equivalente chamava-se Homonoia.
O corpo político é assim visto como a concórdia das discórdias, como a unidade da diversidade, onde o todo é teleologicamente entendido, dado que a unidade resulta da existência de um fim comum mobilizador, gerando a coordenação de elementos dispersos, uma concórdia dos discordes, onde, em vez da disciplina unidimensional, predomina a harmonia. Onde, em vez de um bloco monolítico hierarquista, tenta imitar-se o pluralismo e a flexibilidade da harmonia cósmica. Foi com o estoicismo de Marco Aurélio (121-180), que se destacou a concórdia como um reflexo da ordem divina do universo e da lei que o rege, a razão do homem, pelo que as várias pátrias físicas estariam para a comunidade humana como as famílias para a cidade. Santo Agostinho considera-a como o objectivo da política: a paz da cidade é a concórdia bem ordenada dos cidadãos no governo e na obediência. Uma paz relativa, dado que só poderia haver verdadeira paz com justiça, acreditando que a vocação última da humanidade é a paz da cidade de Deus.
É a união de vontades que produz a harmonia. Neste sentido, S. Isidoro de Sevilha nas Ethimologiae define a civitas como a multidão humana associada pelo consenso do direito e pela comunhão da concórdia.
Álvaro Pais diz que o reino também deve ser ordenado" e unido pela concórdia, pois a multidão sem ordem é confusão. Ora a ordem do reino consiste nisto:que nele haja diversos graus de homens, diversos estados, diversos ofícios, conforme convém, igualmente, à utilidade e honra do reino. E para o Bispo de Silves os reis não são proprietários, mas defensores, administradores e aumentadores dos seus reinos.
Também D. Jerónimo Osório considera, como ideal social, a harmonia, a união de todos, a paz duradoura, a concórdia firme e duradoura. Onde o rei deve incitar a todos à prática do bem, deve procurar a salvação do povo e o bem da república. Finalmente, assinale-se João Pinto Ribeiro, para quem todas estas Repúblicas particulares concorrerão juntas para que representando-se nos três estados do Reino... fizessem uma república. Desta República maior, e universal deram ao Principe o governo, e senhorio, pera que lhes administrasse justiça, e os regesse em paz, e concórdia com os melhores deste todo, sobre que havia de reprtir parte do melhor governo, que dele se prometiam, e esperavam.

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