quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Estado Novo

Os quarenta e oito anos de vida política portuguesa subsequentes ao golpe militar de 28 de Maio de 1926, que liquidou os dezasseis anos da Primeira República, corporizaram um regime político que a si mesmo se qualificou como Estado Novo o qual, depois da chamada Ditadura Nacional, entre 1926 e 1933, vai durar até 25 de Abril de 1974, sendo marcado pelo poder pessoal de dois chefes do governos: primeiro, António de Oliveira Salazar, até 1968, e, depois, Marcello Caetano, nos últimos cinco anos e meio do modelo.

Tudo se desencadeou a partir de 27 de Abril de 1928, quando a primeira dessas personalidades, antigo deputado do Centro Católico e professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, assumiu a pasta das finanças, instaurando aquilo que então se designou laudatoriamente como Ditadura das Finanças, um modelo que permitiu vencer o crónico défice orçamental português, gerando uma liquidez que deu crédito externo ao país e permitiu o lançamento de um grandioso plano de obras públicas, mesmo depois de sofrermos os efeitos da Grande Depressão, iniciada nos finais de 1929. Em 5 de Julho de 1932, o prestigiado ministro já ascende à chefia formal do Governo, começando, a partir de então, a institucionalizar-se um novo modelo de legalidade que se concretiza com a aprovação de uma nova Constituição, pelo plebiscito nacional de 19 de Março de 1933.
O novo regime, mesmo no contexto dos anos trinta, assumia-se de forma atípica. Salazar, com efeito, não emerge como um ditador clássico nem se configura como o chefe de um
pronunciamento, dado que só a partir da gradual conquista do poder se vai constituindo um movimento político de apoio à situação, onde contou menos a cartilha de uma ideologia e mais o pragmatismo do líder de tal empirismo organizador que foi sucessivamente eliminando os bloqueios da componente
militar do regime. Assim se compreende a adesão de uma nova geração de tecnocratas, desejosa de instaurar o admirável mundo novo do modernismo, não faltando o apoio esparso de seareiros, republicanos conservadores e até de alguns fundadores do próprio Partido Comunista Português.
Entre 1932 e 1945, o regime vai viver a euforias dos chamados anos áureos, marcados pelo autoritarismo, pelo milagre financeiro, pela política de obras públicas, pelo proteccionismo económico, pelo lançamento do Estado Providência e por uma hábil política de propaganda nacional, designada por política de espírito, onde se destacou António Ferro.

Vai, em primeiro lugar, repor-se a autoridade do aparelho de Estado, superando-se o neofeudalismo de várias forças vivas que, constituíam verdadeiros Estados dentro do Estado. Assim, os partidos foram proibidos, as forças armadas passaram a depender da hierarquia do governo, a Maçonaria foi ilegalizada e mesmo a Igreja Católica teve de aceitar a laicização do Estado, não retomando, mesmo depois da Concordata de 1940, alguns dos privilégios que usufruía antes de 1910. O modelo salazarista foi essencialmente marcado pelo primado do executivo, dado que o formal presidencialismo bicéfalo era, na prática, um sistema de autoritarismo paternalista do Presidente do Conselho e onde os próprios Presidentes da República não passaram de venerandos Chefes de Estado, isto é, de meras figuras simbólicas. Curiosamente, o próprio partido único, a União Nacional, surgiu por decreto do Conselho de Ministros, de 30 de Julho de 1930. Contudo, apesar da ideologia oficial do regime se assumir como pleonasticamente antiliberal e antidemocrática, a Constituição de 1933, marcada por um programático corporativista, não cortou todas as ligações formais às tradições demoliberais, iniciadoras de uma legitimidade, segundo a qual a soberania reside essencialmente em a nação. A Assembleia Nacional continuou a ser eleita por sufrágio universal e directo e não deixou de estruturar-se um sistema de direitos individuais que só a prática política e a legislação ordinária vieram minimizar e, em muitos casos, suprimir. Por seu lado, a Câmara Corporativa, nunca veio a passar o nível de órgão consultivo de carácter técnico. Para além do milagre financeiro, o Estado Novo enveredou por uma política de obras públicas que retomou o modelo de Fontes Pereira de Melo, com construção de estradas, pontes, barragens, bairros económicos, portos e aeroportos, onde se destacou o ministro Duarte Pacheco, concretizando-se um programa que permitiu o lançamento das infra-estruturas que sustentarão a nossa revolução industrial que, só nos anos sessenta vem a adquirir contornos significativos. No tocante ao fomento económico, abandonou-se a timidez liberalista da Primeira República e passou a assumir-se um claro intervencionismo, de acordo com o chamado Estado-Providência. Retomando-se o socialismo catedrático de Napoleão III e Bismarck que, entre nós, tivera como principal prócere Oliveira Martins, estabeleceu-se um regime de coordenação e disciplina da iniciativa privada pelo aparelho estadual, além de se terem lançado as linhas gerais do planeamento. Levou-se também à prática uma ousada política social que venceu a fome, impôs um efectivo horário de trabalho e promoveu a habitação social, superando-se a fase da casuística caridade estadual e criando-se pela primeira vez um real sistema de segurança social. Marcado pelas doutrinas da encíclica Rerum Novarum e pelos modelos da Escola Social de Fréderic le Play, o Estado Novo vai também assumir-se como uma espécie de ecologismo avant la lêtre, defendendo o viver habitualmente de uma sociedade rural e provinciana, adversa ao individualismo e ao industrialismo futuristas, como transparece nos filmes do período, com destaque para A Aldeia da Roupa Branca e O Pátio das Cantigas. Salazar não se assume como o herdeiro do Marquês de Pombal, mas antes como o detentor da magistratura extraordinária de um principado que suspendeu o regime republicano, onde o principal dos cidadãos, mais paternalista do que totalitarista, não passou do tal presidente de ministério que faltou ao rei D. Carlos para fazer regressar a monarquia aos tempos de D. João III, promovendo uma espécie de nova Contra-Reforma comandada por lentes de leis e com uma legião quase missionária de sargentos e bacharéis. Parafraseando o que ele próprio confessou a Manuel Múrias, diremos que foi o Primeiro Ministro de um rei absoluto que não houve.
Depois da segunda guerra mundial, o regime do Estado Novo, ficou isolado numa Europa Ocidental marcada pela euforia da restauração das democracias e da reconstrução económica, perdendo muito do que, na década de trinta, tinha de criativamente reformista e entrando na rotina da sobrevivência. Isto é, deixou de haver uma revolução nacional e passou-se ao regime da mera situação. Atingiu-se, deste modo, o extremo do hibridismo e o próprio Salazar tratou de considerar o regime como uma democracia orgânica, um sistema ideologicamente hesitante, mas firme no plano da praxis que, se deixava de ter uma doutrina, não deixava de ser uma força, onde o elemento aglutinador era, sobretudo, a obediência à bissectriz do conglomerado de forças que constituía o regime.. De facto, os condicionamentos geopolíticos impediam o livre desenvolvimento da semente corporativa do salazarismo, que foi condenado a murchar doutrinariamente. Sucedeu uma espécie de desertificação da sociedade civil, onde funcionava o temor reverencial. Contrariamente ao quem não por mim é contra mim dos totalitarismos, este modelo autoritário preferia o quem não é contra mim, é a meu favor, que, através de subtis processos de condicionamento psicológico gerou o menos policiesco de todos os aparelhos ditatoriais. Se não havia um Estado de Direito, não deixava de existir um Estado de Legalidade, tal como, no plano económico, não existia uma economia de mercado, apesar de funcionar em pleno um regime de economia privada. De qualquer maneira, o modelo, se propunha uma certa concepção do mundo e da vida, à maneira dos Estados éticos, nunca caiu na tentação de a impôr, permitindo a manutenção daquilo que o Professor Adriano Moreira tem qualificado como democracia da sociedade civil. Apesar de tudo, o regime não foi condenado à quarentena que marcava o franquismo em Espanha e, graças à política de neutralidade colaborante praticada face ao aliados durante a Segunda Guerra Mundial e por pressão da guerra fria, o regime pôde participar na fundação da NATO, da União Europeia de Pagamentos, da OECE e da EFTA, assumindo um acordo de associação com a CEE, em 1972. Entre 1945 e os começos da década de sessenta, o regime transformou-se num situacionismo que ensaiou os modelos do Estado de Segurança Nacional dos tempos da guerra fria. Se a oposição, herdeira do reviralhismo republicano e da unidade antifascista entrou em refluxo, eis que se deu uma alteração nas antigas forças vivas apoiantes do Estado Novo, emergindo uma oposição católica e alguns movimentos monárquicos e conservadores que se independentizaram do regime, bem como um forte movimento operário marcado pela doutrina social da Igreja Católica. É também no período que se torna dominante, entre o oposicionismo, a capacidade organizacional do Partido Comunista Português, intimamente ligado ao sovietismo e dotado de um aparelho clandestino bastante eficaz que pôde resistir à repressão da polícia política. Contudo, a guerra colonial ou das campanhas de África, desencadeada a partir de 1961, vai alterar todo o processo do regime e das oposições. Com efeito, o empenhamento militar vai sacudir um Portugal adormecido e o velho instinto de legítima defesa faz cerrar fileiras em torno de quem então chefiava a nação, de tal maneira que republicanos ultramarinistas e até militantes do velho Partido Socialista aparecem a apoiar o esforço de defesa do espaço ultramarino português. O inimigo exterior que subsidiava e apoiava as guerrilhas vai enfraquecer os inimigos interiores do salazarismo que, em nome do Portugal uno e indivisível, do Minho a Timor, como que vai renascer das cinzas e tentar um reformismo, bem simbolizado na acção de Adriano Moreira, na pasta do Ultramar, entre Abril de 1961 e Dezembro de 1964. Serão treze longos anos de guerra em três frentes de batalha africana e de guerra psicológica entre todos os portugueses e dentro de cada português, uma guerra que, no fim, vai ser perdida, não pela derrota militar no campo de batalha, mas pela derrota política nos meandros de uma revolução que transformou os portugueses e os africanos até então sujeitos à soberania portuguesa, em peões do xadrez das superpotências, surgindo uma das graves crises da identidade nacional que vai fazer regredir o espaço territorial português às fronteiras medievais.


Entrevistas

24 de Março de 1966. Salazar é entrevistado pelo New York Times

Discursos e comunicações de Salazar

23 de Novembro de 1932. Discurso programa na posse dos corpos gerentes da União Nacional.

26 de Fevereiro de 1940. Na União nacional sobre Fins e necessidade da propaganda política

28 de Maio de 1953. Discurso na apresentação do Plano de Fomento: a Europa empobreceu com as suas guerras e o seu socialismo

30 de Novembro de 1954. Comunicação de à Assembleia nacional sobre a questão da Índia.

30 de Junho de 1958. Às Comissões da União Nacional, depois das eleições presidenciais: a campanha das oposições não foi propriamente de propaganda dos candidatos ... mas o desenvolvimento de um processo subversivo

6 de Dezembro de 1958. Na tomada de posse da nova comissão executiva da União Nacional depois das eleições: eu temo que a intensificação materialista que aí vem com todo o esplendor das suas riquezas e a repercussão que hã-de ter na alma dos povos, seja desamcompnahada de conveniente actuação moral

30 de Novembro de 1960. Discurso na AN sobre Portugal e Campanha Anticolonialista.

28 de Maio de 1966 Discurso na biblioteca pública de Braga, para onde se deslocou na sua primeira e única viagem de Avião. Elogia a política ultramarina de Norton de Matos.

23 de Setembro de 1966. Ao inaugurar o arranha-céus da Praça de Londres em Lisboa, onde se instala o ministério das corporações, Salazar proclama: no nosso século somos a única revolução corporativa que triunfa.


Outros discursos do regime

10 de Junho de 1966 Discurso de Veiga Simão: a pátria honrai que a pátria vos contempla.


Cerimónias e manifestações

1 de Maio de 1940. Lusitos da MP vão saudar Salazar a S. Bento que lhes rspondem com a saudação de braço ao alto.

11 de Maio de 1943. Oficiais saúde salazar no seu 7º aniversário como ministro da guerra.

27 de Abril de 1953. 25º aniversário da subida de Salazar ao poder. Sessão na Assembleia Nacional e Te Deum em S. Domingos. Reitor e professores da Universidade de Coimbra vêm a Lisboa homenagear o colega.

9 de Junho de 1960. Inaugurada a I Feira Internacional de Lisboa.

5 de Outubro de 1960. 5oº aniversário da implantação da República. Tomás põe coroa de flores no túmulo de Manuel de Arriaga e à noite inaugura o terceiro anel do Estádio da Luz.

13 de Abril de 1966. Salazar é homenageado por representantes das forças vivas de Angola.

15 de Junho de 1970. Sindicatos nacionais e Casas do Povo vêm a S. Bento homenagear Marcello Caetano. Dois dias depois são os armadores e pescadores.


Comemorações

1940. Comemorações dos Centenários

1951. Cerimónias de encerramento do Ano Santo em Fátima, a 13 de Outubro.

1960. V Centenário da Morte do Infante D. Henrique, as chamadas comemorações Henriquinas.

1960. V Centenário da Morte do Infante D. Henrique, as chamadas comemorações Henriquinas.

1966. Comemorações do 40º aniversário da Revolução Nacional sob o lema Celebrar o passado, construir o futuro. Sessão de encerramento na Assembleia Nacional em 29 de Dezembro.


Obras do regime

14 de Abril de 1940. Base aérea da Ota.

19 de Junho de 1940. Refinaria da Sacor em Cabo Ruivo.

17 de Dezembro de 1940. Construção de 12 500 salas de aula do ensino primário, com o Plano dos Centenários.

Março de 1950. Viaduto do caminho de ferro na Avenida da República em lisboa.

28 de Maio de 1950. Estádio 28 de Maio de Braga.

21 de janeiro de 1951. Barragem de castelo de Bode.

8 de Novembro de 1951. Teatro Monumental em Lisboa.

30 de Dezembro de 1951. Ponte Marechal Carmona em Vila Franca de Xira.

2 de Março de 1952. Paquete Vera Cruz entregue à Companhia Colonial de Navegação

Outubro de 1952. Lançado à água o paquete Santa Maria

15 de Setembro de 1958. Edificío da Polícia Judiciária e dos Serviços de Identificação

12 de Dezembro de 1958. Instituto de Medicina Tropical em Lisboa.

6 de Agosto de 1966. Inauguarda a Ponte sobre o Tejo, depois chamada, sucessivamente, Ponte Salazar e Ponte 25 de Abril.

3 de Novembro de 1966. Electrificação completa da Linha do Norte dos caminhos de ferro.

7 de Dezembro de 1966. Panteão Nacional de Santa Engrácia.


Viagens oficiais

15 de Julho de 1970. Tomás começa viagem a S. Tomé e Prícipe, interrompida pela morte de Salazar

10 de Abril de 1972. Tomás parte para o Brasil transportando os restos mortais de D, Pedro IV. Regressa a 10 de Maio.

10 de Junho de 1972. As cerimónias realizam-se pela primeira vez junto à Torre de Belém.

4 de Julho de 1972. IV Centenário da publicação d’ Os Lusíadas.


Visitas a Portugal

17 de Janeiro de 1951 Eisenhower

20 de Fevereiro de 1952. Reunião da Nato em Lisboa, com sessões no Instituto Superior Técnico.

Maio de 1952. Salazar recebe Daniel Rops e Henri Massis

30 de Outubro de 1958. Paul-Henri Spaak, secretário-geral da NATO

10 de Janeiro de 1960 Visita Lisboa o ministro da defesa alemão Franz Josef Strauss

29 de Janeiro de 1960. Visita Lisboa o secretário-geral da ONU Dag Hammarkjold

5 de Maio de 1960. Sukharno em Lisboa.

19 de Maio 1960. Visita de Eisenhower.

Agosto de 1960. Visita dos reis da Tailândia

14 de Dezembro. Costa e Silva, presidente do Brasil.

4 de Junho de 1970. Primeiro ministro da África do Sul em Lisboa.

14 de Dezembro de 1970 Visita Lisboa Lopez Bravo, ministro dos estrangeiros de Espanha.

10 Julho de 1972. Visita de Giscard d’Estaing, então ministro das finanças francês.


Visitas ao estrangeiro

15 de Abril de 1952. Encontro de Salazar e Franco em Ciudad Rodrigo.

Setembro de 1954 Paulo Cunha no Brasil

Junho de 1960. Salazar encontra-se com Franco em Mérida.

25 de Janeiro de 1960. Teotónio Pereira, ministro da presidência, visita o Paquistão.

20 de Maio de 1970. Marcello Caetano visita Espanha.


Marcelismo

Em 6 Setembro de 1968, Salazar, por motivo de doença, abandona o governo, sendo substituído por um outro professor de direito, Marcello Caetano, que vai procurar instituir um novo modelo de renovação na continuidade e de primavera política que tenta repopularizar o regime, utilizando as novas técnicas do marketing político, nomeadamente pela comunicação televisiva e pelos frequentes banhos de multidão do novo chefe do governo, bem como eliminar alguns dos sinais exteriores de autoritarismo.


Vacas gordas

Nos primeiros anos do marcelismo, o período das chamadas vacas gordas, assiste-se também a um processo de desenvolvimento capitalista da economia, com maior liberdade de acção para os grandes grupos económicos e melhores condições oferecidas ao investimento estrangeiros. No plano político, Caetano vai tentar alargar empiricamente a base de apoio político ao regime, através da chamada liberalização que, sem hostilizar os chamados ultras e a legitimidade formal do Chefe de Estado, Américo Tomás, procura o colaboracionismo de quem duvida em ser hostil.


Ala liberal

Assim, nas listas do partido único, apresentadas às eleições para a Assembleia Nacional de Outubro de 1969, inclui políticos como Francisco Sá Carneiro, Miller Guerra e José Pedro Pinto Leite, enquanto pelo governo passam João Salgueiro, Xavier Pintado e Rogério Martins, para além do ministro da educação Veiga Simão. Numa apreciação global, poderá dizer-se que o Estado Novo, que Marcello Caetano tentou requalificar como Estado Social, não deixou de ser um normal anormal, uma espécie de perpetuação de circunstâncias extraordinárias que, com vários pretextos, sempre foi justificando a não aplicação plena dos direitos, liberdades e garantias que tinha formalmente consagrado no texto da Constituição de 1933. Isto é, o regime sempre se viu como algo de provisório, como mero ponto de passagem da Ditadura Militar para um sonhado corporativismo, que, aliás, nunca veio a concretizar-se institucionalmente, porque quando podia transformar a respectiva imagem de poder num aparelho coerente, eis que sobrevieram a segunda guerra mundial, a guerra fria e a guerra ultramarina. Por isso, o regime sempre esteve mal com as várias modas políticas do tempo europeu em que nasceu, cresceu e sobreviveu, o que agravou as respectivas contradições. Se, nos anos trinta, não foi suficientemente totalitário e mesmo anti-semita, eis que, depois, não se coadunou com a moda demoliberal e europeizante do pós-guerra. Finalmente, acabou por morrer com os ventos da história da descolonização, em plena guerra fria. De qualquer maneira, o Estado Novo foi sobretudo uma criatura resultante do prestígio alcançado por António de Oliveira Salazar, um estadista que concretizou projectos que haviam sido tentados frustradamente por homens de Estado como João Franco ou Sidónio Pais, assumindo uma legitimidade contrária aos modelos da democracia, do pluralismo, da economia de mercado de cariz capitalista e do Estado de Direito que, na Europa ocidental, se tornarão dominantes depois de 1945.


Estado de Segurança Nacional

O regime acabou por fenecer como aqueles Estados de Segurança Nacional que, segundo as palavras de João Paulo II, na Centesimus Annus, visavam controlar de modo capilar toda a sociedade para tornar possível a infiltração marxista. Assim, exaltando e aumentando o poder do Estado, os seguidores de tal modelo pretendiam preservar o seu povo do comunismo; mas, fazendo isso, correram o grave risco de destruir aquela liberdade, aqueles valores da pessoa em nome dos quais era preciso opor-se àquele.

Retirado de Respublica, JAM