sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Leis Fundamentais

Precisando o conceito de leis fundamentais, já o nosso António Ribeiro dos Santos salientava a existência dos inalienáveis direitos da nação no âmbito das leis fundamentais do Estado, desde as primitivas e primordiais às posteriores Se as primeiras se teriam estabelecido expressamente no princípio da monarquia, ou se supusream como tais na sua instituição e formação, já as segundas seriam as que por mútuo consentimento de nossos Reis e dos povos se estabeleceram em Cortes, ou fora delas, sobre as coisas essenciais do governo. As mesmas, longe de ficarem no arcano e confusão, devem ser as primeiras, que mais se declaram , e se ponham em maior luz; para que os povos e os Principes saibam exactamente os seus foros, e conheçam todos sem dúvida alguma e controvérsia, sempre arriscada em semelhantes matérias, quais são os sagrados direitos, por que uns imperam, e outros obedecem, e quais os ofícios, que se devem mutuamente. São entre todas as leis, por sua origem, por sua autoridade, e por seus efeitos as mais sagradas, invioláveis de todo o Estado. Estas afirmações foram produzidas em 1789, em plena "viradeira" de D.Maria I, como censura ao projecto de "Código de Direito Público de Portugal" elaborado pelo pombalista Melo Freire. O facto de, nos finais do século XVIII, se não ter optado pelo conselho de Ribeiro dos Santos, preferindo-se o arcano do despotismo esclarecido, levou a sucessivas rupturas revolucionárias e aos seus contrários contra-revolucionários, cada um decretando a sua "constituição" ideologicamente, segundo as modas estrangeiradas que , pela sua natureza não fundamental, depressa passam de moda e obrigam a sucessivas revisões que tornam conjuntural o que devia ser estrutural e adequado à índole profunda da comunidade de homens que formam Portugal, onde os constitucionalistas contemporâneos, maravilhados pelo dogmatismo conceitual e pela terminologia de códigos constitucionais estrangeiros bem como pelas glosas e anotações dos seus mestres-pensadores, nunca foram capazes de prescutar a mão invisível ou os génios invisíveis da cidade que revelaram os nossos manifestos primordiais, mesmo que poeticamente apócrifos. Impotentes para conservar o que deve ser, sempre tentaram decretar iluministicamente um texto, para que os vindouros fossem obrigados a conservar esse "que está posto", que, aliás, não assume as raízes nem tem saudades de futuro. Ribeiro dos Santos, fiel ao libertacionismo dos juristas da Restauração, como João Pinto Ribeiro e Francisco Velasco Gouveia, soube entender o consensualismo dos factores democráticos da formação de Portugal expressão consagrada por Jaime Cortesão - e ousou implantar entre nós um modelo cultural análogo ao constitucionalismo norte-americano e inglês, tentando superar a ilusão das revoluções", que são sempre pós-revolucionariamente frustradas ou contra-revolucionariamente degoladas, pelo sonho de uma reforma, conservadora nos princípios, mas metodologicamente entendida como uma revolução evitada, apesar de marcada pelos objectivos revolucionários da liberdade e da justiça, pessoais e comunitárias. Nele prepassa o subsolo filosófico que animou John Locke e Montesquieu bem como a a militância cívica de John Adams e dos federalistas e triste tem sido o seu destino, dado que continua alcunhado como precursor de um desenraizado liberalismo que cronologicamente lhe sucedeu, mas que curiosamente sempre preferiu o filosofismo do seu rival, Pascoal de Melo, cujos manuais continuaram a conformar gerações estudantis depois de 1820 e de 1834. Leis fundamentais como acção do todo sobre o todo em Rousseau,130,904 Leis fundamentais em Garrett,130,904.

A perspectiva vintista

No mesmo sentido consensualista, adoptado por Ribeiro dos Santos, o Manifesto da Junta Provisional do Governo Supremo do Reino de 15 de Dezembro de 1820, proclamava os inalienáveis direitos que a natureza nos concedeu, como concede a todos os povos, que os seus maiores sempre exercitaram e zelaram. Palavras diversas que traduzem, contudo, a mesma substância: a existência de regras que exprimam aos objectivos permanentes e que estabeleçam as estruturas conformadoras básicas de um determinada comunidade. Aí se criticava o desvio despotista do absolutismo: não é uma innovação,é a restituição de suas antigas e saudáveis instituições corrigidas e applicadas segundo as luzes do século e as circunstâncias políticas do mundo civilizado;é a restituição dos inalienáveis direitos que a natureza lhes concedeu,como concede a todos os povos;que os seus maiores constantemente exercitaram e zelaram,e de que somente há um século foram privados,ou pelo errado systema do governo, ou pelas falsas doutrinas com que os vis aduladores dos principes confundiram as verdadeiras e sãs noções de direito público.As Côrtes e a Constituição não são cousa nova n'estes reinos:são os nossos direitos e os dos nossos pais. Esta mesma filosofia básica do Estado, que assumia a reforma em nome do próprio tradicionalismo, já aparece também entre os próprios emigrados anti-absolutistas sitos em Londres. João Bernardo da Rocha Loureiro,em O Portuguez,em 1814, se repudia o governo absoluto e despótico, diz também claramente que nenhum apreço damos à democracia pura, preferindo um governo misto como o da Inglaterra ou semelhante à representação nacional dos Estados Unidos da América. Para tanto requer uma Constituição e a restauração das Côrtes e das antigas formas do nosso Governo, que mais se achegam às do governo britânico e tanto distam da maneira absoluta e destemperada por que hoje somos governados. Também Edmund Burke criticava asperamente os homens de leis e os homens de letras por não considerarem que a verdadeira constituição de um país é a constituição histórica, positiva, o modus vivendi. A ideia de leis fundamentais aparece, aliás, no próprio Rousseau, para o qual se as leis civis exprimem a relação dos membros entre si ou com todo o corpo, as leis políticas ou leis fundamentais exprimem a acção de todo o corpo agindo sobre si próprio, isto é, a relação do todo com o todo ou do soberano com o Estado.

A ideia de estabelecimentos constitucionais contra o despotismo

O citado António Ribeiro dos Santos, defendendo o modelo de liberdade política das monarquias democráticas, considerava que o mesmo era confirmado pelos princípios portugueses das cortes como estabelecimentos constitucionais, porque sem elas os reis não podiam exercitar o direito legislativo, ou fosse fazendo leis gerais e perpétuas, ou dispensando-as ou revogando-as, nem impor tributos, nem alhear os bens da Coroa, nem cunhar nova moeda, ou alterar a antiga", "nem fazer a guerra", "nem resolver e deliberar os outros negócios mais graves do seu Estado". E isto porque "em um governo que não é despótico, a vontade do rei deve ser a vontade da lei.Tudo o mais é arbitrário; e do arbitrio nasce logo necessariamente o despotismo

A base representativa da constituição histórica

Portugal, antes de 1822, também tinha uma Constituição histórica que, como dizia o então panfletário do vintismo, Almeida Garrett, se se fundava em sólidos e naturais princípios, como o da base representativa e da derivação do poder real do princípio democrático, era, no entanto, destituída de garantias e remédios legítimos para os casos de infracção da lei positiva ou aberração do seu espírito e forçosamente corria o perigo de ser mal conhecida, e esquecida da Nação, desprezada e, portanto, infringida pelo Governo.

Falta de verbalização e de codificação

O problema, como referia o miguelista José Acúrsio das Neves, talvez estivesse na material circunstância de não estar recopilado tudo isto em um caderno de 100 páginas, dividido por títulos, capítulos , e artigos mui pequenos, segundo a moda. Um pormenor que, por exemplo, não constituiu qualquer impedimento para que os britânicos se constituissem na mais antigas das democracias ocidentais. A nossa constituição histórica, com efeito, era constituída por aquele tipo de normas que, conforme a recente teorização de Friedrich Hayek, são observadas na acção sem serem conhecidas do actor sob a forma de palavras ('verbalizadas' ou explícitas). Normas que, em primeiro lugar, se manifestam numa regularidade de acção e que, em segundo lugar, vêm a ser observadas pelo facto de conferirem ao grupo que as pratica um poder superior mas sem que esta consequëncia seja prevista por aqueles que estas regras guiam.Isto é, não por serem inatas, mas p or fazerem parte de uma herança cultural Com efeito, os britânicos seguem as respectivas leis fundamentais tal como os portugueses seguiam a respectiva constituição histórica. Porque tais normas constituem uma receita que lhes deu, ou lhes tinha dado, bons resultados, tanto na harmonia social interna como pelo plena realização do respectivo poder, no contexto internacional.

Leis fundamentais escritas

Na verdade, antes das constituições escritas do liberalismo, já existiam leis fundamentais, aquilo que se designa por Constituição Histórica, reunindo leis escritas e não escritas. Em Portugal, entre as leis fundamentais escritas, para além das de 1674 e 1698 sobre a tutela dos príncipes menores e a regência do reino, valiam como leis fundamentais até 1820 as Actas das Cortes de Lamego, documento apócrifo, forjado pelos alcobacenses durante a dinastia dos Filipes, mas formalmente adoptado depois de 1640, que estabelecia uma série de princípios sobre a natureza do Governo e a sucessão da Coroa. Aí se proclamava que o Senhor Rei com a espada nua na sua mão, com a qual entrou na batalha, disse:Bendito seja Deus, que me ajudou, com esta espada vos livrei e venci nossos inimigos e vós me fizeste Rei e Companheiro vosso e pois me fizeste, façamos Leis pelas quais se governe em paz a nossa Terra.Disseram todos: queremos Senhor rei e somos contentes de fazer leis, quais vós mais quiserdes, porque nós todos com nossos filhos e filhas, netos e netas , estamos a vosso mandado.

Leis fundamentais consuetudinárias

Mas o essencial estava nas leis fundamentais não escritas ou consuetudinárias, definidas por António Ribeiro dos Santos como costumes gerais e notórios ... introduzidos de tempo imemorial por consentimento tácito dos seus Principes , e dos estados do Reino e confirmado por uso constante e prática de acções públicas e reiteradas. Destas, refiram-se as seguintes: - a profissão da religião católica; - a indivisibilidade do reino; - a indivisibilidade dos bens da Coroa; - o estabelecimento dos três estados do reino; - a liberdade do povo se tributar; - a estabilidade do valor da moeda; - o provimento dos ofícios em naturais do reino. Todas estas normas estavam marcadas pela ideia básica da defensão, conservação e aumento do Reino. Partiam do princípio de que o poder régio ou político está em toda a República,Povo ou Comunidade, conforme a expressão de Francisco Velasco Gouveia, porque procede da razão natural da conservação que per direito natural não está determinado o modo de governar. Do mesmo modo se admitia o consensualismo de que todo o poder se deve temperar pela justiça e pela equidade, conforme as palavras de Manuel Rodrigues Leitão.

Retirado de Respublica, JAM

Leibniz, Gottfried Wilhelm (1646-1716)

Defende uma tese de filosofia em 1663 e uma de direito em 1666. O que não o impede de também se dedicar à química e à matemática. Luternado, filia-se na Rosa-Cruz. Vive em Paris de 1672 a 1676. Bibliotecário do Hanôver.

Outro elemento marcante do período é o luterano alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716), que, fiel à máxima da reconciliação, harmonia e síntese, tentou recuperar a escolástica aristotélica. Apesar de não ter especial originalidade no tocante ao pensamento jurídico, é responsável pela criação de uma forma mentis racionalista que tentou reagir contra os excessos laicistas.

No plano epistemológico, procurou elaborar uma teoria onde se conciliariam a causalidade com a finalidade, a necessidade com a liberdade, bem como a história do mundo com a graça divina, tentando introduzir-se no entendimento divino através do cálculo infinitesimal, considerando que o universo, uma vez criado, passa a ser uma entidade autárcica. Neste sentido, considerando que a harmonia universal é Deus, pretendia instaurar uma espécie de alfabeto do pensamento, onde a física, a mecânica e a matemática deveriam ocupar o espaço da metafísica, como defende em Monadologias, de 1695.

O fulcro do pensamento leibniziano são as mónadas, essas realidades indivisíveis e independentes umas das outras que não têm janelas pelas quais qualquer coisa possa lá entrar ou sair, mas que formam a substância. As mónadas, equivalentes a cada um dos indivíduos, são entendidas como um mundo à parte, auto‑suficiente, permitindo que vivêssemos numa perfeita independência face à influência de todas as outras criaturas. São centros espirituais dinâmicos em que se compenetrariam individualidade e substancialidade, assumindo-se, ao mesmo tempo, como um espelho do mundo e como uma criação original. E é através delas, entendidas como microcosmos, que cada indivíduo se une ao cosmos, reflectindo aquela totalidade do mesmo, uma harmonia pré-estabelecida por Deus.

descobriu em 1675 os princípios fundamentais do cálculo infinitesimal, na mesma altura em que, de forma independente, Isaac Newton chegava também a tal descoberta (1666). Para Leibniz universo seria composto de mónadas, entendidos como centros de força espiritual ou de energia. Cada uma delas seria um micro-cosmos, um espelho do universo, através de vários degraus de perfeição e desenvolvendo-se independentemente de outras mónadas. O universo que as mesmas constituiriam seria harmonioso, resultando de um plano divino, gerando-se aquele melhor dos mundos possíveis, que Voltaire caricaturizaria na novela Candide de1759. As Monadologias seriam publicadas em latim sob o título de Principia Philosophiae, em 1721. Só em 1840 é que Erdmann utilizou aquele título para um trabalho que Leibniz tinha deixado sem baptismo.

Mónada, de onde vem monismo, significa o uno como aquele que é oposto ao plúribo. O termo, criado por Pitágoras, já era utilizado por Platão, sendo retomado por Giordano Bruno, no sentido dos elementos físicos ou psíquicos simples que compõem o universo

advoga a ligação entre o direito e a moral bem como o carácter omnicompreensivo da justiça, admitindo a existência de vários graus do bem: num primeiro grau, equivalente ao honeste vivere, temos aquilo que ele considera como a justiça universal, em relação com Deus e correspondente à piedade, abarcando todas as virtudes e tendo por fim a salvação.

Num segundo grau, correspondente ao suum cuique tribuere, surge a justiça distributiva, em relação com a humanidade, correspondente à equitas e identificando-se com a caridade.

Num terceiro grau, correspondente ao neminem laedere, temos o direito em sentido estrito, a relação com a sociedade política.

Deus

Piedade

honeste vivere

Humanidade

Caridade

suum cuique tribuere

Sociedade política

Direito

neminem laedere


Uma classificação tripartida que Leibniz identifica com os praecepta iuris dos romanos, conforme o quadro seguinte:

Justiça distributiva

Justiça comutativa ou sinalagmática

Justiça geral, social, protectiva ou tutatrix

suum cuique tribuere

Alterum non laedere

honeste vivere

Relações totium ad partes (do todo para com as partes)

Relações partium ad partes (das partes para com as partes)

Relações partium ad totum (das partes para com o todo)

O que o todo deve a cada um

O que cada um deve ao outro

O que cada um deve ao todo

Proporção geométrica

Proporção aritmética

Bem comum

Dar a cada um conforme as suas necessidades

Igualdade relativa

De cada um, conforme as suas possibilidades

Considera, assim, que a justiça inclui a caridade e a sabedoria, tendo o direito e a moral a sua origem num Deus que é acessível a todos os homens pela razão natural, pelo que os seus princípios devem inspirar o direito voluntário ou humano.

No plano propriamente jurídico, se começou por reflectir um estreito voluntarismo nominalista, logo tentou conciliar-se com o racionalismo, à maneira da escolástica peninsular, acabando por defender a necessidade de uma doutrina do direito natural segundo a doutrina dos cristãos. Cabe-lhe também a defesa de uma sistematização unitária do direito, precedendo o movimento da codificação.

Compreende-se pois que advogue a ligação entre o direito e a moral e que adopte uma concepção globalista ou omnicompreensivo da justiça, considerando a existência de vários graus do bem. Num primeiro grau, equivalente ao honeste vivere, trata-se da justiça universal (iustitia universalis), da relação com Deus, correspondendo à piedade (probitas ou pietas) e abarcando todas as virtudes, tendo por fim a salvação

Num segundo grau, correspondente ao suum cuique tribuere, trata-se da justiça distributiva, da relação com a humanidade, tendo a ver com a aequitas e identificando-se com a caridade.

Num terceiro grau, correspondente ao neminem laedere e à justiça comutativa, temos o direito em sentido estrito (ius ou ius strictum), a relação com a sociedade política.

É com base nesta classificação tripartida que proclama a necessidade da justiça incluir a caridade e a sabedoria. Porque, tendo o direito e a moral a sua origem num Deus que é acessível a todos os homens pela razão natural, devem os seus princípios inspirar o direito voluntário ou humano.

De particular destaque, são os projectos do luterano alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716), de 1677 e 1678, onde se sugere a criação de um colégio universal, religioso e político, sob a dupla autoridade do papa e do imperador.

Leibniz constitui talvez das últimas grandes figuras da intelectualidade europeia a manter fidelidade ao modelo da res publica christiana, insurgindo-se contra as teses de Hobbes e Bossuet.

Ainda acreditava que toda a cristandade forma uma espécie de república e que o Império representa o braço secular da Igreja universal, defendendo que a totalidade dos espíritos deve formar a Cidade de Deus, isto é, o mais perfeito Estado possível, sob o mais perfeito dos Monarcas. Esta Cidade de Deus, esta verdadeira monarquia universal, é um mundo moral no mundo natural, e é o que mais se deve exaltar entre as obras de Deus.

Contrariando o a leitura absolutista, então assumida por Bossuet, considerava que tal unidade não resultava do direito divino, dado ter surgido do consenso unânime dos que não se opuseram ao bem comum da Cristandade.

Se, por um lado, defende a soberania de todos os príncipes alemães, mesmo dos não eleitores, pugna pela maiestas do Império que deveria ter alguma autoridade, uma espécie de primazia, o que se poderia obter transformando os Concílios ecuménicos num Senado Geral da Cristandade.

Ei-lo luterano, a reconhecer a necessidade de unificação da cristandade através de um papado verdadeiramente universal. Chega mesmo a observar que a Reforma não teria sido necessária se tivessem sido aplicadas as decisões do Concílio de Constança e se as teses do movimento conciliarista do século XV tivessem sido assumidas pela Igreja.

A chave para o entendimento desta conciliação entre a supremacia ou soberania das várias unidades do Império e a maiestas deste, levava, contudo, a uma rejeição do conceito de soberania de Hobbes.

Com efeito, para os soberanistas só poderia haver Estados unitários ou uma aliança de Estados unitários, enquanto Leibniz advoga um conceito de soberania divisível e a consequente possibilidade de um duplo governo, algo menos que um Estado unitário e algo mais do que uma simples aliança.

Para ele, existiriam vários degraus de autoridade: o primeiro era a superioritas do simples direito de jurisdição, que atribui ao senhor a potestas de causis statuendi; o segundo era o ius manus militaris ou a superioridade territorial; o terceiro degrau era a supremitas ou a autarcia, típica do príncipe livre ou república, implicando a capacidade real de resistência face a potências estrangeiras. Só depois viria a maiestas, o direito supremo de comando que, enquanto honra, pertenceria ao Imperador e, enquanto poder, ao Imperador e ao Império, representado pela Assembleia dos príncipes.

Contrariando o conceito monista de soberania indivisível, omnipotente e absoluta, para quem a totalidade dos iura regalia pertenceria a um único soberano, Leibniz considerava que os mesmos não passariam de iura aggregata, não determinando a essência da soberania e que, portanto, poderiam ser separados, por analogia com o próprio direito privado. É que, segundo as suas próprias palavras, a soberania subsiste, não obstante as obrigações, ou, se se quiser, todas as sujeições que submetem um príncipe às ordens de qualquer outro

Se os adeptos do monismo soberanista consideram que uma entidade soberana exige três monopólios: o do constrangimento, o da jurisdição e o da organização dos poderes públicos, já Leibniz permite que os dois últimos possam ser repartidos: vários territórios podem reunir-se num só corpo, mantendo intacta a hegemonia de cada um, citando os exemplos do Império, da Suíça e das Províncias Unidas.

Chega mesmo a considerar que, neste sentido, só poderia existir soberania numa república onde Deus fosse o rei, só aqui é que poderia existir omnipotência. Deste modo, entende que o conceito hobbesiano de soberania não poderia ser aplicado a um Estado civilizado e nem mesmo no império turco, dado ser contrário à natureza humana

Retomando Vitória, para quem cada Estado, como parte do universo ou o mundo cristão, tem deveres relativamente ao todo a que pertence, não tarda que, em novo escrito, o mesmo autor desenvolva este modelo, propondo a expansão espiritual da Europa pela concertação entre as principais potências, de certo modo antecipando algumas das ideias que vêm a marcar a frustrada Santa Aliança.

Coloca-se assim contra a tentativa de estatização que não só expropriou os poderes dos collegia que existiam abaixo do Estado como das autoridades universais existentes acima do Estado. Para ele, o Estado era apenas o quinto degrau da sociedade natural, depois da comunidade dos homens e das mulheres, o primeiro degrau; da comunidade dos pais e dos filhos, o segundo degrau; da comunidade dos senhores e dos servos, o terceiro degrau; e de todas as households, o quarto degrau.

Mas, acima do Estado estaria a Igreja de Deus, incluindo tanto a Igreja propriamente dita, como o Imperador, a cabeça e o defensor da res publica christiana

Leibniz sempre foi marcado pelo impossível de conciliar os contrários, através daquilo que qualificava como reconciliação, harmonia e síntese. Assim, eis que, enquanto homem do iluminismo, tentou recuperar a escolástica aristotélica, do mesmo modo que, como luterano convicto, procurou a reconciliação com os católicos.

Chega mesmo a procurar conciliar a causalidade com a finalidade, a necessidade com a liberdade, bem como a história do mundo com a graça divina. Tenta assim introduzir‑se no entendimento divino através do cálculo infinitesimal, considerando que o universo, uma vez criado, passa a ser uma entidade autárcica. Neste sentido, considerando que a harmonia universal é Deus, pretendia instaurar uma espécie de alfabeto do pensamento, onde a física, a mecânica e a matemática deveriam ocupar o espaço da metafísica.

Os seus planos de harmonia europeia remontam a 1671, ao escrito Consilium Aegyptiacum onde procura convencer Luís XIV a lançar-se na conquista do Egipto, argumentando que o rei de França, poderia, deste modo, galardoar-se com o título de Imperador do Oriente e assumir-se como o federador da catolicidade europeia.

O governo francês, que tinha acabado de sair da Guerra da Devolução (1667-1668) e via levantar-se contra ele a Tríplice Aliança de Haia, entre a Inglaterra, a Suécia e as Províncias Unidas, declarou então ao filósofo que os projectos de guerra santa têm, de notoriedade pública, perdido qualquer actualidade desde a época de S. Luís.

Luís XIV preferia então o jogo da diplomacia e da guerra no próprio teatro de operações da Europa. Primeiro, consegue quebrar a aliança entre as Províncias Unidas e a Inglaterra, aliando-se a esta, pelo Tratado de Douvres, depois assegura-se da neutralidade do Imperador. Com esta cobertura diplomática, lança-se então numa invasão das Províncias Unidas, desencadeada a partir de Maio de 1672, o que obrigou os holandeses a resistir pela abertura dos diques, que retardou a conquista e permitiu que em 1673, surgisse uma coligação contra a França, integrada pela Espanha, pelo Imperador e pelo Brandeburgo. A guerra vai depois generalizar-se com Luís XIV a voltar-se contra a Espanha nos Países Baixos e no Franco Condado, enquanto a Inglaterra abandonava a sua luta contra os holandeses, logo em 1674, enquanto se dava a emergência da Prússia, que expulsa os suecos da Pomerânia Oriental.

Entretanto, Leibniz que, a partir de 1676, passa a estar ao serviço do príncipe João Frederico de Hanôver, com o cargo de bibliotecário, elabora, a pedido deste, em 1677, um tratado sobre o direito de supremacia ou de soberania e de embaixada dos eleitores e príncipes do Império alemão De jure suprematus et legationis electorum et principum Germaniae, utilizando o pseudónimo de Caesarinus Furstenerius.

A obra que se destinava a dar argumentos ao Congresso de Nimega, que vai concluir-se em 1678, sugeria também a criação de um colégio universal, religioso e político, sob a dupla autoridade do papa e do Imperador.

Aí constrói o modelo teórico de soberania que já referimos, procurando aplicá-lo aos príncipes alemães, a fim de considerar que, sendo estes soberanos, também deveriam ter ius legationis, procurando, deste modo, acabar com a distinção entre os meros Príncipes e os Príncipes Eleitores.

Depois disso, em 1678, o mesmo Leibniz chega a publicar um opúsculo intitulado Entretien de Philarète de d'Eugène. Sur la question du temps agitée à Nimwègue touchant le droit de Souverainité et d'Embassade des Electeurs et princes de l'Empire, onde desenvolve e vulgariza as ideias eruditamente apresentadas em 1677.

Nesta última obra, considera que a Europa não cessa de conspirar contra si mesma, propondo que ela refaça a sua unidade espiritual, considerando o Imperador como director e chefe espiritual da Igreja Universal.

Leibniz, que não pretendia o regresso à ideia medieval de monarquia universal, dado que esta só poderia concretizar-se através da existência de um ditador europeu, visava tão só o estabelecimento de uma suprema arbitragem: Non Monarchiam Universalem ... sed Directionem generalem seu arbitrium rerum esse.

As suas perspectivas eram assim mais vastas que as de Sully e de Crucé, dado que , além da reorganização da Europa, visava também um movimento de expansão da evangelização. A França seria a responsável por África. A Suécia e a Polónia pela Sibéria e pela Taurídia. A Inglaterra e a Dinamarca pela América do Norte. A Espanha pela América do Sul. A Holanda pelas Índias Orientais.

Como dizia numa carta dirigida a Mme Brinon, de 29 de Setembro de 1791, a união opera-se, a catolicidade reforma-se, a Germânia e a Latinidade reencontram a sua comunhão espiritual, as Províncias Unidas e a Inglaterra regressam, por seu turno, numa Igreja que é ao mesmo tempo romana e reformada, e os crentes, todos os crentes, opõem-se às forças dissolventes que ameaçam a respectiva fé.

Era uma visão mística, bem semelhante àquela que, depois, vai levar Alexandre, através da Senhora Krüdener, à ideia de Santa Aliança. Neste sentido, procurou mesmo a conciliação entre católicos e protestantes e, com este espírito, levou Frederico o Grande a fundar em Berlim uma Academia das Ciências, em 1700, de que foi o primeiro presidente. E, apesar de estar ao serviço de Hanôver, de 1676 até à data da sua morte, não deixou de colaborar também com o próprio Pedro o Grande da Rússia, para quem elaborou um projecto de reforma do direito russo.

· Nova methodus docendaeque docendaeque jurisprudentiae, 1667.

· Observationes de principio juris, 1670.

· De juri suprematus ac legationis Principum Germaniae, 1677.

· Specimen demonstrationum politicarum pro eligendo Rege Polonorum.

Retirado de Respublica, JAM

Foto picada de Matheplanet

Lei da Separação (1911)

A Lei da Separação do Estado das Igrejas de 20 de Abril de 1911. Os respectivos defensores chamar-lhe-ão lei intangível, os adversários, lei celerada. Magalhães Lima chama-lhe lei basilar da República. O decreto foi inspirado por legislação republicana francesa (1905), mexicana e brasileira. Abrange pela primeira vez o clero secular, ao contrário da legislação anticlerical da monarquia liberal. O Estado deixa de subsidiar o culto católico; são extintas as côngruas; criadas associações cultuais, de que os párocos são excluídos; nacionalizadas as propriedades eclesiásticas; atribuídas as clérigos pensões vitalícias anuais; proibição do uso público de vestuário eclesiástico aos padres portugueses (os inglesinhos continuaram a usar as respectivas vestes); estabelecido o beneplácito para os documentos emitidos por Roma e pelos bispos.. A maioria dos padres mantém-se fiel à hierarquia episcopal. Em 7 de Agosto, só 217 deles tinha aceite pensões do Estado (cerca de 20%). . Este diploma vai levar ao rompimento das relações com a Santa Sé. Ângelo Ribeiro, p. 478.. Oliveira Marques, Nova História de Portugal, pp. 495 ss.; . Joaquim Maria Lourenço, pp. 126 ss.; . Manuel Braga da Cruz, pp. 248 ss.; . Rui Ramos, pp. 452-453; . Vasco Pulido Valente, p. 219.

Lei e vontade geral,29,183

Lei –Hipótese depois de verificada, para o cartesianismo,8,68

Lei Le Chapelier, fonte do totalitarismo,136,951

Lei universal do justo e do injusto,137,959

Lei, consentimento de muitos cidadãos numa mesma vontade,125,873.

Retirado de Respublica, JAM

Lei injusta

Em termos meramente formais, a lei injusta continua a ser lei, tal como o Estado tirânico continua a ser Estado, mas não passam de um mais imperfeito que pode, ou tem de, ser superado pelo desejo comunitário do mais perfeito. O injusto, relativamente à lei, tal como o tirânico, no tocante à polis, não passam de degenerescências do modelo, pelo que todo o trabalho teórico que visa transformá-los em espécies de um género maior, que também pode incluir o anti-justo e o anti-político, significa rebaixamento dos fins do social e a admissão, como normal do anormal do iuristitium e da dictatura. Santo Agostinho considera que a lei injusta não merece o nome de lei, por ser violência e não obrigar em consciência, embora tenhamos de a cumprir para se evitarem escândalos e perturbações, desde que a mesma não atente contra a lei divina positiva. Radbruch, num artigo de 1947, proclama: a ciência do Direito tem de meditar, de novo, sobre a milenar verdade de haver um Direito superior à lei, um Direito natural, um Direito divino, um Direito racional, medido pelo qual a injustiça continua a ser injustiça, ainda que revista a forma de lei, e diante do qual a sentença pronunciada, de acordo com esta lei injusta, não é Direito, mas o contrário do Direito.

Retirado de Respublica, JAM

Lei de ferro da oligarquia (Robert Michels)

Robert Michels analisando o SPD, o principal partido de organização de massas na viragem do século XIX para o século XX, vem falar na lei de ferro da oligarquia, segundo a qual quem diz organização diz necessariamente oligarquia, na emergência dentro destes novos grupos, de uma nova minoria organizada, que se eleva à categoria de classe dirigente. Paradoxalmente, eis que partidos socialistas surgiu o princípio segundo o qual uma nova classe dirigente se substitui fatalmente a outra e a lei, segundo a qual... a oligarquia é como a forma pré-estabelecida da vida em comum dos grandes agregados sociais... O partido, enquanto formação externa, mecanismo, máquina, não se identifica necessariamente com o conjunto dos membros inscritos, e ainda menos com a sua classe. Tornando-se um fim em si mesmo, atribuindo objectivos e interesses próprios, separa-se pouco a pouco da classe que representa. Neste sentido, considera que os revolucionários de hoje são os reaccionários de amanhã.

Retirado de Respublica, JAM

Lei da Fome, 1899

Nome dado à lei cerealífera de 14 de Julho de 1899. Proposta pelo ministro Elvino José de Brito, durante o governo progressista de José Luciano. Estabelece um regime proteccionista à produção nacional de trigo. Os preços do pão ao consumo aumentam cerca de 40%.


Retirado de Respublica, JAM

Leis Eleitorais Portuguesas

Lei eleitoral de 1870.

Em 12 de Dezembro de 1870, Alves Martins apresenta uma proposta de reforma da lei eleitoral, visando instaurar a representação proporcional, com salvaguarda das minorias, através do sistema do quociente eleitoral. Dias Ferreira na CD havia dito que as eleições em Portugal não são feitas pelos eleitores mas pelas autoridades. A proposta de reforma não foi aprovada.

Lei Eleitoral de 1878 (8 de Maio)
Proposta pelo governo de Ávila e aprovada durante o governo regenerador de Fontes. Aumento do número de círculos e alargamento do sufrágio. Passa a haver 149 deputados. Os círculos eleitorais no continente aumentam de 92 para 127. O colégio eleitoral passa de 480 000 para 820 000, chegando-se quase ao sufrágio universal para os cidadãos masculinos e maiores. Seguem-se as eleições de 13 de Novembro de 1878.

Lei eleitoral de 1884 (21 de Maio).
Em 21 de Maio de 1884 era aprovada nova lei eleitoral, com o apoio da oposição progressista. Dissolução em 24 de Maio. Aumento do número de deputados para 169. 79 círculos uninominais no Continente. Alargamento do sufrágio. Abrangida cerca de 70% da população adulta. A lei vai vigorar durante uma década. Discussão do projecto na Câmara dos Deputados em 13 de Fevereiro de 1884. Aumentado o número de deputados. Paralelamente, apresentada a proposta de Acto Adicional, criando pares electivos. Apoio da oposição progressista e dos antigos constituintes. Apenas 5 votos contra na Câmara dos Deputados. Entre os votos contra, para além dos republicanos, D. José de Saldanha e António Maria de Carvalho. Na Câmara dos Pares, oposição do conde de Bonfim, do visconde de Chanceleiros e de Casal Ribeiro. Este chega mesmo a anunciar a intenção de criação de um novo partido. A proposta governamental foi defendida na Câmara dos Deputados por Júlio de Vilhena e na Câmara dos Pares por Hintze Ribeiro. Importante intervenção do deputado republicano Manuel Arriaga. 151 eleitos em 100 círculos no continente e ilhas e 12 pelo ultramar; seis eleitos por acumulação de votos; atribuídos 22 lugares às minorias, apenas no continente. Sufrágio misto com círculos plurinominais de lista incompleta nos círculos com sede nas 21 capitais de distrito. Visava-se a passagem para o sistema proporcional. A outra metade dos deputados é eleita em círculos uninominais. 6 deputados por acumulação de votos (pelo menos 5 000 em todo o reino). Garantida assim a representação das minorias. Alargado o sufrágio a todos os que soubessem ler e escrever ou fossem chefes de família (abrangida cerca de 70% da população adulta). A lei vigora durante cerca de uma década, permitindo aos governamentais cerca de uma centena de deputados, sem que as oposições baixassem das três dezenas.


Lei eleitoral de 1895 (28 de Março)

Decreto ditatorial do governo regenerador de Hintze/ Franco. Terminam os círculos uninominais. Estabelecidos círculos plurinominais distritais, sem protecção das minorias. Sistema de lista completa. Considerado o mais retrógrado dos diplomas eleitorais da monarquia constitucional. Dá-se uma redução para metade do colégio eleitoral. 50% da população masculina maior, cerca de 863 280 eleitores. Fixa-se a capacidade eleitoral activa para os cidadãos masculinos maiores de 21 anos que saibam ler e escrever, colectados em contribuições não inferiores a 500 réis, deste modo se reduzindo o anterior censo, que implicava rendimentos anuais não inferiores a 1000$000 réis. Regresso aos círculos plurinominais distritais (entre 2 e 14 deputados), com lista completa e sem protecção das minorias. Desaparecem todos os círculos uninominais e as minorias obrigatórias. 104 deputados por 17 círculos no continente. 10 deputados e 4 círculos plurinominais nas Ilhas. 6 círculos uninominais no Ultramar. Lisboa e Porto são agregados aos respectivos distritos. Votação por escrutínio de lista, sendo eleitos os cidadãos mais votados. Acaba com as candidaturas por acumulação de votos, instituída em 1884. Sistema de quotas máximas para certas profissões (limite de 40 para funcionários públicos e de 20 para médicos e advogados).

Lei eleitoral de 1896 (21 de Maio)
O governo regenerador de Hintze propõe, na ratificação do decreto ditatorial de 1895, depois de realizadas as eleições de 17 de Novembro de 1895, uma conciliação com o modelo anterior. Surgem 96 círculos uninominais no continente. Estabelecem-se dois grandes círculos plurinominais em Lisboa e no Porto, agregados às respectivas parcelas rurais. De acordo com este diploma realizam-se as eleições de 2 de Maio de 1897. Deu-se o alargamento da inelegibilidade absoluta a deputado a todos os membros da Câmara dos Pares.

Lei eleitoral de 1899 (26 de Julho)
118 círculos uninominais no continente. Círculos plurinominais em Lisboa e no Porto, sem as parcelas rurais, com representação das minorias. Lisboa passa a agregar Cascais e Oeiras. Atribuída missão constituinte às próximas Cortes. Capacidade eleitoral activa para os menores de 21 anos possuidores de qualquer curso de instrução superior ou especial.

Lei Eleitoral de 1901 (Decreto de 8 de Agosto, a chamada ignóbil porcaria).

Neste contexto, o governo hintzáceo emitiu a lei eleitoral de 8 de Agosto de 1901, onde, para além de se aumentar o número de deputados (para 157) e de se restaurar o processo de representação das minorias que havia sido extinto em 1895 (foram atribuídos 37 deputados às mesmas), criaram-se 26 grandes círculos plurinominais, 4 dos quais nas ilhas. Segundo o relatório do diploma procurava evitar-se a fragmentação dos partidos em clientelas e, com efeito, os influentes locais, a nível de freguesia e de concelho, deixaram de ter o tradicional poder. Por outro lado, os grandes partidos do sistema saíram altamente beneficiados, dado que o resultado eleitoral passou a ser controlado pelo acordo estabelecido entre o partido no governo e o principal partido da oposição. Naturalmente, os outros membros da oposição, percebendo a manobra, logo protestaram, principalmente João Franco que, num dos seus rasgos de baptismo verbal, logo acusou o diploma de ignóbil porcaria, visando o estabelecimento de uma ditadura eleitoral. Na prática, esta teoria funcionou com nova vitória do governo nas eleições de 6 de Outubro de 1901. Uma vitória de tal monta que os próprios franquistas só conseguiram eleger um deputado por Arganil, que não o respectivo líder. Com efeito, face ao desaparecimento da influência dos caciques locais, tudo passou a ser decidido por um acordo central entre a situação e a oposição, atingindo-se assim o nível do rotativismo puro. O partido no governo, com efeito, só não atingiu as maiorias em Aveiro e do Funchal e os próprios republicanos, apesar de aumentarem a votação, não conseguiram ver nenhum deputado eleito (só em 15 de Dezembro é que Afonso Costa apareceu eleito pelo círculo do Dondo, em Angola).

Lei Eleitoral de 1915 (Lei nº 290, de 11 de Janeiro)
Emitida durante o governo de Vítor Hugo de Azevedo Coutinho. Não entra em vigor. Sufrágio directo e secreto. Militares no activo sem direito a voto. 163 deputados no total. 146 no continente. 9 nas ilhas. 155 deputados no continente e ilhas. 35 círculos plurinominais no continente e ilhas. 2 círculos uninominais (Angra do Heroísmo e Horta). 8 círculos uninominais no Ultramar. Escrutínio maioritário a uma volta. Para as minorias, 1 deputado em círculos de 2, 3 e 4 deputados; 3 nos de 10.

Lei eleitoral de 1915 (Decreto nº 1352, de 24 de Fevereiro)
Emitida pelo governo de Pimenta de Castro. Não entra em vigor. Com efeito, durante o governo de Pimenta de Castro chegou a ser elaborada nova lei eleitoral, o decreto de 24 de Fevereiro. Os unionista logo falaram em perigo plebiscitário. Sufrágio directo e secreto. Dá direito de voto a oficiais, sargentos e equiparados (art. 3º). Número total de 163 deputados. 37 deputados reservados às minorias. Minorias de 1 em círculos de 3 a 6 deputados; de 2 em círculos de 7 a 10 deputados; de 3 nos de 11. 22 círculos plurinominais no Continente, dos quais 17 coincidem com os distritos. As cidades de Lisboa e do Porto foram anexadas aos círculos limítrofes. Este decreto foi feito ao abrigo da autorização parlamentar de 8 de Agosto de 1914, atendendo a que na actual conjuntura não é possível recorrer para esse efeito aos meios normais, vista a situação do Congresso, as dúvidas suscitadas sobre a sua legalidade, e as perturbações que já tem determinado o seu funcionamento (do preâmbulo). Revoga a lei de 11 de Janeiro de 1915 que reintroduzia o escrutínio de lista incompleta nas cidades de Lisboa e do Porto. Segundo esta última lei, Lisboa era dividida em dois círculos de 10 deputados e Porto passava a constituir um círculo de 10 deputados. Redução para 159 deputados.

Lei Eleitoral de 1915 (Lei nº 314 de 1 de Junho).
Emitida depois da queda do governo de Pimenta de Castro. Direito de voto a militares no activo, ao contrário do estabelecido na lei de Julho de 1913 e de acordo com o decreto de Pimenta de Castro. Nova divisão dos círculos eleitorais. Aumento da representação das minorias: 1 em círculos de 3 e de 4 deputados; 2 em círculos de 8. Isto é 44 mandatos minoritários num total de 163 deputados (a proporção na lei de Pimenta de Castro era de 37 para 163).

Retirado de Respublica, JAM

Julgamos ser recomendável a consulta da interessante síntese de Materiais para a História Eleitoral e Parlamentar Portuguesa, 1820-1926.

Ver o excelente quadro sinóptico do grupo de trabalho do CEPP

Lei de bronze (ehernes Gesetz) dos salários

Tese de Ferdinand Lassalle de 1864, onde defende que os salários não devem estar abaixo de um mínimo vital, dado que aumentando a população trabalhadora de forma contínua, os salários, por força da lei da oferta e da procura, poderão ficar abaixo desse nível, dado que a população aumenta mais depressa que os postos de trabalho.


Retirado de Respublica, JAM

Lei

Segundo o direito romano, uma declaração solene com valor normativo, assente num compromisso da comunidade e que é tornada pública para se cumprir. Hoje, a criação deliberada e intencional de direito novo, uma norma jurídica decidida e imposta por uma autoridade, com poder para o fazer. Conforme Papiniano, a communis rei publicae sponsio, um compromisso da comunidade. No direito romano, havia a lex publica, a que era feita pelo povo nos comícios, aprovando-se uma proposta de um magistrado, diferente da lex privata, a declaração solene com valor normativo que tinha por base um negócio privado. Só com o concentracionarismo do Baixo Império Romano é que a lex publica passou a ser vista como a norma emitida de cima para baixo, a norma imposta por um superior ou imperante, como algo de vertical, supra-infra-ordenado, contra a anterior tradição horizontalista. Se as leis são expressão de uma decisão de um órgão político, elas também expressam a procura da racionalidade, quando prtendem integrar-se num determinado sistema, dito ordem jurídica.

Lei como declaração solene da vontade geral ROUSSEAU

Lei como pacto sacrossanto da sociedade humana OSORIO.

Retirado de Respublica, JAM

Legitimidade

O poder que se liberta do medo, através do consentimento, activo ou passivo, daqueles que obedecem. Para Weber, é a crença social num determinado regime, a fonte do repeito e da obediência consentida. Para Adriano Moreira, é a relação entre o aparelho de poder e um certo sistema de valores, tendo a ver com o sistema de crenças do grupo, a ideia institucional, o regime político. Difere da legalidade, da relação do poder com a lei estabelecida, dado que esta se mede nos limites do direito posto.

Legitimidade (Weber)
Segundo Max Weber, a legitimidade é a crença social num determinado regime, visando obter a obediência, mais pela adesão do que pela coacção, o que acontece sempre que os respectivos participantes representam o regime como válido, pelo que a legitimidade se torna na fonte do respeito e da obediência consentida.

Para Guglielmo Ferrero (1871-1942) a legitimidade como um acordo tácito e subentendido entre o Poder e os seus súbditos, sobre certos princípios e certas regras que fixam a atribuição e os limites do poder. Assim, um governo legítimo é um poder que se libertou do medo, porque aprendeu a apoiar-se no consentimento, activo ou passivo, e a reduzir proporcionalmente o emprego da força. Um governo legítimo é, pois, aquele que governa pelo consentimento e pela persuasão, aquele que, como o tecelão, sabe harmonizar contrários e que não usa a violência e a opressão. A legitimidade está para o poder político como a justiça está para o direito. Se o direito sem força seria impotente, eis que se a força se substituísse ao direito apenas haveria arbítrio. Adriano Moreira, por sua vez, define a legitimidade como a relação do poder com certo sistema de valores, com o sistema de crenças do grupo, com a ideia institucional, com o regime político do grupo.

— Distinções básicas: medo e consentimento; obediência e lealdade; anomia e alienação.
— O confronto entre legalidade e legitimidade. A legalidade como relação entre o aparelho de poder e a lei. A legitimidade como relação entre o aparelho de poder e um certo sistema de valores.
— A legitimidade implicando a análise da política do ponto de vista axiológico-normativo.
— As distinções clássicas entre basileus (tem uma potestas que aspira tornar-se em direito de governar, que é um poder de jure) e tiranno ou usurpador (tem potentia, mero poder de facto).
— A distinção de Bártolo de Saxoferrato entre a legitimidade de título (o modo de designação) e a legitimidade de exercício
— A tese de Edmund Burke. A prescrição como fonte da legitimidade.
— A tese de Benjamin Constant: o poder legítimo como provindo, não da força mas da vontade geral.
— A classificação weberiana. A legitimidade tradicional (patriarcalismo, gerontocracia, patrimonialismo e sultanismo) e a acção tradicional, a conduta mecânica na qual o indivíduo obedece inconscientemente a valores considerados evidentes. A legitimidade carismática (profetas, heróis e demagogos) e a acção afectiva, a confiança total no valor pessoal de um homem e no seu destino, fundada na santidade, no heroísmo ou na infalibilidade. A legitimidade racional-normativa e a legitimidade racional-axiológica. A acção racional em finalidade onde os indivíduos são capazes tanto de definir objectivos como de avaliar os meios mais adequados para a realização desses objectivos. A acção Wertrational, a racionalidade em valor. Onde os indivíduos se inspiram na convicção e não encaramm as consequências previsíveis dos seus actos. A distinção entre a moral da responsabilidade e a moral da convicção. O consentimento não racional (tradição e carisma), o consentimento wertrational e o consentimento racional.
— A tese de Guglielmo Ferrero. O governo legítimo como o governo que se libertou do medo, onde há um acordo tácito entre o poder e os governados sobre certas regras e sobre certos princípios que fixam as atribuições e os limites do poder. Os quatro princípios da legitimidade (o princípio hereditário, o princípio aristocrático-monárquico, o princípio democrático e o princípio electivo). A ideia dos génios invisíveis da cidade que nascem, crescem e morrem.
— A tese de Niklas Luhman sobre a legitimação pelo procedimento criticando a concepção tradicional, acusada de ficção. A legitimidade entendida como um processo, sendo obtida por uma série de interacções, previamente estruturadas em subsistemas sociais.
— A crise da legitimidade no Estado Contemporâneo. A transformação da questão da legitimidade numa secura de fórmulas processuais. O dessangramento dos valores democráticos e do Estado de Direito. A perspectiva neomarxista sobre a matéria (Habermas).

Legitimidade e sacralização do poder.
Segundo Georges Burdeau refere a legitimidade como a metamorfose moderna da sacralização do poder, que laiciza o seu fundamento sem lhe enfraquecer a solidez, visto que substitui a investidura divina pela consagração jurídica.

Legitimidade e Legalidade.
A legitimidade difere da legalidade, da relação do poder com a lei estabelecida, exigindo um padrão superior que permita considerar certas leis como injustas, tendo mais a ver com a conformidade relativamente ao direito do que com a conformidade face à lei, como dizia Carl Schmitt. Se a legalidade é um mero requisito do exercício do poder, a justificação do respectivo exercício, já a legitimidade é o requisito da titularidade do poder, a justificação do seu título.

Legitimidade, Princípios da.
Ferrero salientaque os princípios da legitimidade nascem, crescem, envelhecem e morrem e que, depois de, durante séculos, se identificarem com o princípio aristocrático, hereditário e monárquico, eis que, nos séculos XIX e XX, se tornaram democráticos, assentes na delegação do poder pelo povo e na existência de direito de oposição e de liberdade de sufrágio. Os princípios da legitimidade servem para humanizar e adoçar o poder são um exorcismo do medo. Porque o Poder tem sempre medo dos sujeitos que comanda, todos os Poderes souberam e sabem que a revolta é latente mesmo na obediência mais submissa, e que pode rebentar num dia ou noutro, sob acção de circunstâncias imprevisíveis; todos os Poderes sentiram-se e sentem-se precários na medida em que são obrigados a utilizar a força para se impor. Chega mesmo a considerar que a única autoridade que não tem medo é a que nasce do amor.

Legitimidade, os génios invisíveis da cidade.
Ferrero equipara a legitimidade aos génios invisíveis da cidade, a certas forças que actuam no interior das sociedades e que as impedem de se cristalizar numa forma definitiva, forças que nascem, crescem e morrem, forças que se assemelham aos seres vivos, mas que não são visíveis nem tangíveis, equivalentes aos genii dos romanos, esses seres intermediários entre a divindade e os homens.

Legitimidade, Tipos de.
Segundo Weber, há três tipos-ideais ou três tipos puros de Herrschaft (Typen der Herrschaft) legítimo: a legitimidade tradicional, a legitimidade carismática e a legitimidade racional, subdividindo-se esta última na racional-normativa e na racional-axiológica. Haveria, aliás, uma coincidência entre estes tipos de legitimidade e os tipos de acção social, pelo que a cada tipo de consentimento corresponderia um certo tipo de Herrschaft.

1. Poder político legítimo de carácter tradicional.
A acção tradicional, considerada como uma conduta mecânica na qual o indivíduo obedece inconscientemente a valores considerados evidentes, dá origem à chamada legitimidade tradicional, onde emergem os fiéis como seria timbre do patriarcalismo, da gerontocracia, do patrimonialismo e do sultanismo. Ela seria baseada na crença quotidiana na santidade das tradições vigentes desde sempre e na legitimidade daqueles que, em virtude dessas tradições, representam a autoridade.

2. Poder político legítimo de carácter carismático.
A acção emocional ou afectiva, marcada pelo instinto e pela emoção, onde há confiança total no valor pessoal de um homem e no seu destino, uma acção fundada na santidade, no heroísmo e na infalibilidade, onde seria marcante a legitimidade carismática. De um lado, o chefe, o profeta, o herói ou o demagogo; do outro, os adeptos ou os leais, os discípulos ou seguidores. A mesma seria baseada na veneração extraquotidiana da santidade, do poder heróico ou do carácter exemplar de uma pessoa e das ordens por esta reveladas ou criadas. Tudo depende do carisma, isto é, de uma qualidade pessoal considerada extra-quotidiana (...) e em virtude da qual se atribuem a uma pessoa poderes ou qualidades sobrenaturais, sobre-humanos ou, pelo menos, extra-quotidianos específicos ou então se a toma como enviada por Deus, como exemplar e, portanto, como líder . Contudo, o mesmo Weber salienta que uma das formas de legitimidade carismática aparece na democracia de líderes, com um demagogo a aproveitar-se da democracia plebiscitária, surgindo uma legitimidade carismática oculta sob a forma de uma legitimidade que deriva da vontade dos governados .

3.1 Legitimidade racional referente a fins.
A acção racional referente a fins (zweckrational), onde os indivíduos são capazes tanto de definir objectivos como de avaliar os meios mais adequados para a realização desses objectivos, uma acção social marcada pela moral de responsabilidade, onde o valor predominante seria a competência. Aqui já nos situaríamos no campo do Estado racional-normativo ou do Estado-razão, onde domina a acção burocrática, aquela que faz nascer o poder burocrático, o poder especializado na elaboração do formalismo legal e na conservação da lei escrita e dos seus regulamentos, onde dominam a publicização, a legalização e a burocracia.

3.2 Legitimidade racional referente a valores.
A acção racional referente a valores (wertrational), a racionalidade em valor, onde os indivíduos se inspiram na convicção e não encaram as consequências previsíveis dos seus actos. Seria uma forma de actividade polítitica inspirada por sistemas de valores universalistas, onde o agente actua de acordo com a moral de convicção, vivendo como pensa sem pensar como vive, em nome da honra, isto é, sem Ter em conta as consequências previsíveis dos seus actos. Aquele agente que é comandado pelo dever, pela dignidade, pela beleza ou pelas directivas religiosas. Uma acção que está sujeita à antinomia da moral da convicção (Gesinnungsethik) e da moral da responsabilidade (Verantwortungsethik). A primeira, incita cada um a agir segundo os seus sentimentos, sem referência às consequências, diz, por exemplo, para vivermos como pensamos, sem pensar como vivemos, à maneira do pacifista absoluto. A Segunda interpreta a acção em termos de meios–fins e é marcada pelo supra-individualismo, defendendo a eficácia de um finalismo que escolhe os meios necessários, apenas os valorando instrumentalmente, dizendo, por exemplo, como em Maquiavel, que a salvação da cidade é mais importante que a salvação da alma. Mas, as duas, segundo Weber, não são contraditórias, elas completam-se uma à outra e constituem em conjunto o homem autêntico.

Retirado de Respublica, JAM

Legitimação pelo Procedimento

A tese de Niklas Luhman sobre a legitimação pelo procedimento criticando a concepção tradicional, acusada de ficção. A legitimidade entendida como um processo, sendo obtida por uma série de interacções, previamente estruturadas em subsistemas sociais. — A crise da legitimidade no Estado Contemporâneo. A transformação da questão da legitimidade numa secura de fórmulas processuais. O dessangramento dos valores democráticos e do Estado de Direito.

A perspectiva neomarxista sobre a matéria (Habermas). Considera que há uma crise da legitimação no capitalismo tardio quando as procuras de recompensas conformes ao sistema aumentam com maior rapidez que a massa disponível de valores, ou quando surgem expectativas que não podem satisfazer-se com recompensas conformes ao sistema. Na base está uma crise de motivação gerada pelo sistema sócio-cultural. Há uma contradição entre a moral hedonista-consumista e a moral puritana que justifica a acumulação capitalista, pelo que o ethos da classe média e o fatalismo dos estratos inferiores tendem para o regresso ao sagrado, numa defesa contra a anomia.

Retirado de Respublica, JAM

Legistas

A partir do século XII, na Europa ocidental, surge a nova classe dos legistas, normalmente filhos de burgueses que, à custa da família ou graças aos subsídios dos reis, vão estudar para Itália o direito romano renascido do Corpus Iuris Civilis do imperador Justiniano. E é esse direito romano renascido que constitui o quadro ideológico conformador do novo modelo de poder real que também vai fundar novas universidades, autênticas fábricas de legistas, construtoras e alimentadoras das burocracias.

Retirado de Respublica, JAM

Legendre, Pierre

Membro da filosofia do desejo. Considera que o grande objectivo do poder consiste em fazer-se amar. A obediência e a submissão permitem receber o amor. Desobedecer leva à angústia de não se receber o fluxo do amor.
Para este autor, o poder vem sempre de uma autoridade primeira, do pai e do desejo de protecção que o mesmo engendra. O pai dá-nos amor.
LEGENDRE – Estado presente da Igreja Católica e do d. canonico,79,526. em Jouir du pouvoir. Este último refere, aliás, que todo o poder, seja o do patrão, ou do chefe político ou o de Deus, vem de uma autoridade primeira, do pai e do desejo de protecção que engendra. O poder, com efeito, é um facto marcado por um sinal que partindo dos factos, os faz participar na meta‑política. O poder político visa, desde sempre, mobilizar os factos sem ser pela heteronomia da força, mas pelo consentimento. Visa o ideal de um "governo obtido pelo consenso do corpo de cidadãos" que "pressupõe a articulação dos cidadãos individualmente considerados até ao ponto em que eles se possam tornar cidadãos activos na representação da verdade através do peitho, a persuasão". Todo o poder, com efeito, tende a ser simbólico, tende a ser "um poder que aquele que lhe está sujeito dá àquele que o exerce um crédito com que ele o credita, uma fides, uma auctoritas, que ele lhe confia pondo nele a sua confiança", pelo que "o homem político retira a sua força política da confiança que um grupo põe nele. Ele retira o seu poder propriamente mágico sobre o grupo da fé na representação que ele dá ao grupo e que é uma representação do próprio grupo e da sua relação com os outros grupos".
O Estado como entidade centralista que surgiu na Idade Média, mais precisamente, no século XII, como um presente da Igreja Católica e do direito canónico, sob o influxo do renascimento do direito romano. O mesmo Legendre refere , aliás, que o Estado Centralista seria um "substituto monoteísta". Com efeito o poder político dos reis foi moldado à imagem e semelhança do Imperador romano,enquanto pontifice único, dando‑se, deste modo uma "transferência para o Estado dos signos sagrados da omnipotência". O rei é o vigário de Deus. Isto é, está no lugar do Outro, "re‑presenta‑o", faz "o discurso do Outro" é uma simples voz da instituição. Também o Imperador detinha o oráculo; também o Pontifice era um simples mestre que apenas transmitia. A este facto acresceria o facto de, com a centralização do poder real, se ter transformado a lei no seu principal instrumento. O rei passou a ser a "lei viva" e a lei transformou‑se no substituto do anterior Texto. Deu‑se, deste modo, a laicização do poder e a lei passou a "ocupar um lugar eminente, verdadeiramente soberano... tornou‑se a categoria fundamental, substitutivo daquela onde se justificava a Palavra do Pontifice". Como diz o mesmo autor, visou induzir‑se "o amor da subordinação no coração do povo, através do amor da lei" e a "lei laica tende a substituir‑se a toda a religião".

Retirado de Respublica, JAM

Legalismo

Diz-se do movimento que levou a lei a monopolizar as fontes do direito. Depois do legalismo, gerou-se a racionalização codificadora e, finalmente, a nacionalização, com o direito nacional a excluir os direitos estrangeiros e os direitos supra-estaduais, como o direito canónico e o direito romano.

Retirado de Respublica, JAM

Lefort, Claude

Crítico radical do totalitarismo, não advoga, contudo, a perspectiva liberal. Em 1981 fala na desincorporação do social levada a cabo pelo sufrágio universal com a consequente desincorporação dos indivíduos, os quais perdem as suas marcas de identidade, pelo que o poder se transforma num lugar vazio, apenas ocupado temporariamente, gerando-se uma espécie de atomização dos indivíduos. Usando a perspectiva psicanalítica de Adler, salienta que os chefes servem o Estado por narcisismo, observando que os ideais do serviço público e do sentido de Estado servem para dissimular a libido dominandi. Até porque o amor que o chefe dirige relativamente às massas não passa de uma mistificação dado que ussufrui delas por prazer.

Retirado de Respublica, JAM

Foto retirada de Madinin'Art

Lefebvre, Henri (n. 1901)

Comunista francês. Membro de partido desde 1928, é expulso em 1958. Professor do liceu de filosofia desde 1929. Doutor em letras na Sorbonne em 1954. professor em Estrasburgo desde 1961 e em Nanterre desde 1965. A partir de 1976 adopta as teses psicanalíticas de Adler sobre a vontade de poder. Considera que a fruição do poder tem qualquer coisa de erótico, que não se manifesta directamente como tal, mas através de artifícios e de dissimulações.

Retirado de Respublica, JAM

Foto picada de Sociology Professor

Leçons de Sociologie

Leçons de Sociologie Émile Durkheim procurando superar a incapacidade demonstrada pelo demoliberalismo da época em que viveu face à pressão dos grupos intermediários, considera o Estado como o cérebro social, como o órgão que está encarregue de representar o corpo social no seu conjunto e de o dirigir. É que toda a vida do Estado propriamente dito passa-se não em acções exteriores, em movimentos, mas em deliberações, isto é, em representações. Assim, a sua função essencial é a de pensar dado que não executa nada. O Estado é entendido como a sede de uma consciência especial, restrita, mas mais alta, mais clara, tendo dele mesmo um mais vivo sentimento, situando-se de tal modo longe os interesses particulares que não pode ter em conta condições especiais, locais, etc., nas quais se encontram. Considera também que o Estado é o órgão do pensamento social. Não que todo o pensamento social emane do Estado. Mas está lá de duas formas. Uma vem da massa colectiva e é difusa: é feita destes sentimentos, destas aspirações, destas crenças que a sociedade elaborou colectivamente e que estão dispersas em todas as consciências. A outra é elaborada neste órgão especial que se chama Estado ou governo(...) Uma (...) permanece na penumbra do subconsciente. Mal nos damos conta de todos estes preconceitos colectivos (...) Toda esta vida tem qualquer coisa de espontâneo e de automático, de irreflectido. Pelo contrário, a deliberação, a reflexão é a característica de tudo o que se passa no órgão governamental. É verdadeiramente um órgão de reflexão. Neste sentido, o papel do Estado, com efeito, não é de exprimir o pensamento irreflectido da multidão, mas de acrescentar a este pensamento irreflectido um pensamento mais meditado e que, por consequência, tem de ser diferente. O Estado surge, pois, como um mecanismo de comunicação e de transmissão de informações, constituindo um instrumento neutro e funcional, claramente separado da sociedade (Leçons de Sociologie, Paris, PUF, 1950).


Retirado de Respublica, JAM

Leclercq, Jacques (1891-1971)

Doutor em direito (1911) e em filosofia. Começa como professor das Facultés Universitaires de Saint-Louis em Bruxelas. A partir de 1938 instala-se em Lovaina. Considera que o objectivo da moral é determinar as regras pelas quais o homem atingirá o seu perfeito desenvolvimento ou o seu fim. O objectivo do direito é dirigir as actividades dos homens na vida social de maneira a que esta os ajude a atingir o fim que lhes assinala a moral. Por outras palavras, se o problema da moral se coloca essencialmente do ponto de vista do indivíduo, o do direito põe-se do ponto de vista da ordem social, sendo o respectivo problema o de como organizar a sociedade de maneira que os homens possam atingir a sua perfeição.

Retirado de Respublica, JAM

Foto picada da Wikipedia

Leão XIII (1810-1903)

Giochino Peccei. Papa de 1878 a 1903. Responsável pelo neotomismo com a encíclica Aeterni Patris, de 1879, e fundador da doutrina social da Igreja Católica, com a encíclica Rerum Novarum, de 15 de Maio de 1891. Núncio em Bruxelas de 1843 a 1845. Sucede a Pio IX. Na encíclica Immortale Dei, de 1885, considera que a Igreja não está ligada a qualquer forma específica de governo. Restabelece as relações diplomáticas com a Alemanha (1882), com a Bélgica (1884) e com a Rússia (1894).

Retirado de Respublica, JAM

“Papa Leão XIII, nascido Vincenzo Gioacchino Raffaele Luigi Pecci, (Carpineto Romano, 2 de Março de 1810Roma, 20 de Julho de 1903) foi Papa de 20 de Fevereiro de 1878 ate a data da sua morte.

Nasceu em 2 de Março, 1810 em Carpineto Romano, Itália. Pecci notabilizou-se primeiramente como popular e bem sucedido Arcebispo de Perugia, o que conduziu a sua nomeação como Cardeal em 1853. Em 20 de Fevereiro de 1878, foi eleito para sucessor do Papa Pio IX. Foi o primeiro Papa a surgir num filme.

É frequente referir-se ao Papa Leão XIII pelas suas doutrinas sociais e econômicas, nas quais ele argumentava a falha do capitalismo e do comunismo. Ficou famoso como o "papa das encíclicas".

A mais conhecida de todas, a Rerum Novarum, de 1891, sobre os direitos e deveres do capital e trabalho, introduziu a ideia da subsidiariedade no pensamento social católico. Esta encíclica marcou o início da sistematização do pensamento social católico, chamado vulgarmente de Doutrina social da Igreja Católica e foi um contributo para o despertar de uma esquerda católica que se via no movimento do socialismo cristão. Este documento influenciou fortemente a criação do Corporativismo e da Democracia cristã.

A bula Apostolicae Curae de 1896, afirma que as ordenações de diáconos, padres e bispos nas igrejas anglicanas, incluindo a Church of England, não são válidas e portanto nulas. A Igreja Católica, no entanto, reconhece a validade de ordenações na Igreja Ortodoxa de Leste e Oriental.

Publicou a Encíclica Arcanum Divinae Sapientiae sobre os valores da família, onde faz a abordagem dos problemas relacionados com o matrimônio. Neste documento faz a defesa da indissolubilidade do casamento e críticas ao divórcio.

Leão XIII condenou também a Maçonaria e pela Carta Apostólica de 1899 Testem Benevolentiae condenou a heresia chamada Americanismo.”

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