sexta-feira, 4 de maio de 2007

Albuquerque, Martim de

Professor catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa, do grupo de históricas. Começa a carreira docente no Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina, sendo um dos inspiradores da Antologia do Pensamento Político Português de 1965. Circunstâncias várias, alheias à qualidade da dissertação, levam a que tenham elaborado três textos doutorais. O primeiro, para o ISCSPU, sobre O Poder Politico no Renascimento de Lisboa. O segundo, A Sombra de Maquiavel na Ética Tradicional Portuguesa, para a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Só o terceiro, Jean Bodin na Península Ibérica, lhe permitem ser doutor em Direito pela Universidade Complutense de Madrid. Membro da Academia Portuguesa de História.
Retirado de Respublica, JAM

Altruísmo

Do lat. alter, o outro, através do fr. altruisme, vocábulo criado por Auguste Comte por volta de 1830, em nome da máxima vivre pour autrui. O oposto ao egoísmo. Isto é a capacidade que um indivíduo tem de se preocupar com os outros, sem pensar nos seus próprios interesses. Crença segundo a qual as decisões morais de um agente devem ser conduzidas tendo em consideração os interesses e o bem-estar de outras pessoas, mais do que o interesse próprio, como manda o egoísmo. Porque a decisão ética de cada hum deve dar a máxima importância à felicidade dos outros. Expressão abundamentemente usada pelo positivismo, visando a substituição do conceito de justiça. Se alguns altruísmos, mais ligados ao formalismo kantiano, poem mais enfâse no dever ou na lei moral que nos interesses actuais de outras pessoas, já outras, marcadas pelo utilitarismo e pelo pragmatismo, acentuam as consequências práticas.

Positivismo

Na senda do programa de vivre pour autrui, com que Comte procura reagir contra o egoísmo individualista do sistema Hobbes, os positivismos tentam analisar a justiça considerando-a como um simples facto que poderia observar-se na evolução social. Para Léon Duguit, por exemplo, se a justiça é uma noção mais ou menos vaga que os homens formam numa determinada época e num determinado grupo sobre o que é justo e o que é injusto, se a noção do justo e do injusto é infinitamente variável e está sempre a mudar, nem por isso o sentimento do justo e do injusto deixa de ser um elemento permanente da natureza humana. A justiça, como diz Gaston Jèze, se é aquilo que os homens de uma determinada época e num determinado país crêem ser justo, onde verdade para aquém dos Pirinéus, erro dalém, também não pode deixar de atender à clássica lamentação de Pascal: Linda Justiça, limitada por um rio ou por uma montanha! Verdade para cá dos Pirinéus, erro mais além. Com efeito, o positivismo liga a ideia de justiça ao sentimento de altruísmo. Herbert Spencer proclama mesmo que os homens têm um sentimento de justiça, um instinto do justo que deve ser tomado como um facto que se deve satisfazer, sendo inútil procurar o respectivo fundamento racional. A mesma posição é adoptada pelo solidarismo de Léon Bourgeois para quem a necessidade de justiça existe em qualquer consciência e aí reina imperiosamente. Malapert, por seu lado, fala em que há uma ideia ou um instinto, um apetite de justiça e que não vale a pena procurar-lhe nem a origem histórica, nem o fundamento racional, nem a definição, nem o conteúdo positivo, tarefas que apenas cabem à metafísica.

Retirado de Respublica, JAM

Althusser, Louis (1918-1990)

Autor francês criador de uma variante do marxismo. Na linha de Gramsci, cria as categorias de aparelho ideológico e aparelho repressivo do Estado. Os aparelhos ideológicos, são movidos pela ideologia. Os repressivos, pela violência. Considera que Marx teria fundado o continente teórico da história, a terceira idade, depois da idade do continente teórico das matemática (gregos, com Platão) e do período do continente teórico da física, com Galileu e Desacartes. Entende o marxismo como a luta de classes na teoria. O althusserianismo tem grande influência em Portugal na década de setenta, principalmente nos meios intelectuais universitários marcados pela geração do Maio 68. Fiel à visão trinitária da história,que fora de Vico e de Comte, salienta que depois de um "continente" teórico, marcado pelas matemáticas,com os gregos e Platão, seguiu‑se o da física,com Galileu e Descartes, sendo Marx o fundador da terceira idade,o continente teórico da história. Salienta que "o marxismo não é uma (nova) filosofia da praxis,mas uma prática(nova) da filosofia",até porque a filosofia não passa da "luta de classes na teoria". Marx "funda a ciência da história onde não existiam senão filosofias da história".Considera também que o materialismo dialéctico é "a ciência da evolução das formações sociais".

·Montesquieu, la Politique et l’Histoire

Paris, Presses Universitaires de France, 1959 [trad. port. Montesquieu, a Política e a História, Lisboa, Editorial Presença, 1977].

·Pour Marx

Paris, Éditions Maspero, 1965.

·Lire le Capital

2 vols., Paris, Éditions Maspero, 1965. Com Étienne Balibar.

·«Idéologie et Appareils Idéologiques de l’État»

In La Pensée, n.º Jul., Paris, 1970 [trad. port. Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado, Lisboa, Editorial Presença, 1974].

·Réponse a John Lewis

Paris, Éditions Maspero, 1973 [trad. port. Resposta a John Lewis, Lisboa, Editorial Estampa, 1973].

4Câmara, João Bettencourt, Análise Estrutural Contemporânea. A Emergência de um Modelo. Louis Althusser, Lisboa, ISCSP, 1993.4Rocha, Acílio Silva Estanqueiro, «Louis Althusser», in Logos, 1, cols. 190-197.

Retirado de Respublica, JAM

Althusius (1557-1638)

Johannes Althaus. Alemão, natural da Vestefália. Estuda em Colónia (Aristóteles) e Basileia (direito romano). Doutor em 1586, ensina direito romano na academia calvinista de Herborn. Conselheiro jurídico da cidade de Emden, na Frísia holandesa, desde 1604, funções que, a partir de 1617, acumula com as de chefe da igreja local, até à data da sua morte. Cabe-lhe uma das primeiras grandes justificações doutrinárias do separatismo das Províncias Unidas. A sua obra fundamental é a Politica methodice digesta, atque exemplis sacris et prophanis illustrata ("a política metódicamente concebida e ilustrada com exemplos sagrados e profanos"), publicada pela primeira vez em 1603 e reeditada, com correcções, em 1617, obra que, apesar de reimpressa oito vezes no século XVII, só voltará a ser publicada em 1932. Curiosamente, os antecedentes deste consensualista protestante estão na catolicísima neo-escolástica peninsular da Escola de Salamanca, com destaque para os juristas Menchaca e Covarrubias, os mesmos que, aliás, constituirão o substracto teórico dos nossos juristas da Restauração. Deste modo se retomam as teorias políticas de Aristóteles, bem como a perspectiva do direito natural de Cícero, a quem Althusius também vai buscar a ideia-força de consociatio ou symbiosis.

·Jurisprudentia Romana Methodice Digesta

1586.

·Politica Methodice Digesta

Herborn, 1603. Cfr. trad. cast. de Primitivo Mariño, Juan Altusio, La Politica Metodicamente Concebida e Ilustrada con Ejemplos Sagrados y Profanos, apresentação de Antonio Truyol y Serra, Madrid, Centro de Estudios Constitucionales, 1990).

4Albuquerque, Martim, «Contributo Português para a Obra de Althusius», Lisboa, in Estudos Políticos e Sociais, VII, nº 4, 1969.4Friedrich, Carl Joachim, Introduction to the Politica, Cambridge, 1932.4Gierke, Otto von, Johannes Althusius und die Entwicklung der naturrechtlichen Staatstheorien, 1880.4Yves Guchet e Demaldent, Jean-Marie, Histoire des Idées Politiques. Tomo 2 De l'Antiquité à la Révolution Française, Paris, Armand Colin, 1996, pp. 259-262.4Reibstein, Ernst, Johannes Althusius als Fortsetzer der Schule von Salamanca, 1935.4Maltez, José Adelino, Princípios de Ciência Política. Introdução à Teoria Política, Lisboa, ISCSP, 1996, pp. 201, 202, 216, 219, 237, 270 e 380.4Prélot, Marcel, As Doutrinas Políticas, II, pp. 147 segs..4Serra, Antonio Truyol, Historia de la Filosofia del Derecho y del Estado. 2 - Del Renacimiento a Kant, Madrid, Alianza Universidad, 1982, pp. 119 segs..4Silva, Nuno Espinosa Gomes, «João Altúsio», in Logos, 5, cols. 735-736.4Theimer, Walter, História das Ideias Políticas, trad. port., pp. 123 segs..

Retirado de Respublica, JAM

Alsácia

Alsace (fr.) Elsass (al.) Desde os finais do século XIX que constitui um emaranhado de principados laicos e eclesiásticos alemães; no século XIII, os Habsburgos apropriaram-se da Alta-Alsácia; em 1648 a França anexou as possessões imperiais do território, embora as cidades imperiais continuassem a enviar deputados para a dieta de Ratisbona; Luís XIV exigiu que as mesmas rompessem com o Império; em 1681, a França conquista Estrasburgo; conservando algumas autonomias sob a administração francesa, apenas as perdeu com a Revolução. O território permanece na França depois de 1815, mas em Agosto de 1870, a Alsácia-Lorena foi conquistada pela Prússia, permaneceu como Reichsland Elsass-Lothringen até 1918, quando regressou à França; volta a ser ocupada pelos alemães em 1940.

Almond, Gabriel A. (n. 1911)

Professor de ciência política em Stanford, especialista em política comparada e cultura política. Um dos monstros sagrados da politologia contemporânea, chefe de fila da escola desesenvolviemntista. Considera que a política em sentido lato tem uma função integradora do social, cabendo‑lhe a socialização dos indivíduos, a preparação para o desempenho de papéis políticos , a comunicação de símbolos e mensagens e o confronto e ajustamento de interesses, enquanto à política como governo cabe a elaboração e aplicação de regras. Em qualquer caso, a política exerce a respectiva função pelo recurso ou ameaça de recurso à utilização legítima da coacção física. Reconhece, aliás, que todos os sistemas políticos realizam as mesmas funções e que todas as estruturas políticas são multifuncionais. Distingue a construção do Estado, que ultrapassa o quadro infra‑estatal da tribo e do clã, dotando um determinado território de um aparelho político e administrativo, da construção da nação. Enquanto a primeira se exerce no plano da ordem estrutural, já o segunda se situa a nível da cultura política. Porque não basta a criação de novas estruturas políticas,é necessário que as mesmas sejam recebidas e aceites. A construção da nação, enquanto forma de desenvolvimento político, significa, portanto,a ruptura com a visão paroquial, que limita o horizonte do grupo social ao que se vê.

Almeida, António José de (1866-1929)

Segundo Raúl Brandão, é um orador, até os seus artigos são discursos... mas justiça, liberdade e povo que para outros não passam de plavras, são para ele realidades profundas. Médico, deputado republicano antes de 1910. Quando estudante, com 24 anos, publica um célebre artigo, Bragança, o Último, pelo qual é condenado a três meses de prisão.

Exerce a clínica em S. Tomé, donde regressa em 1903. Em 24 de Janeiro desse mesmo ano, faz um vibrante discurso no funeral de Rafael Bordalo Pinheiro. Detido em 31 de Janeiro de 1908. Director da revista Alma Nacional. Fundador do partido evolucionista. O mítico tribuno dos tempos da propaganda heróica, o palavroso ideológo da revista Alma Nacional, impulsivo no discurso, volúvel de feitio, todo ele uma sucessão rápida de amores e ódios, misturando táctica com estratégia, tanto não tinha ideias gerais assentes em linhas filosóficas mínimas. Romântico, homem de crenças, reduzia as ideias ao prazer do discurso. Ministro do interior do governo provisório de 5 de Outubro de 1910 a 4 de Setembro de 1911. É então o ministro da província. Começa por ser apoiado por Machado Santos, mas em breve constitui uma terceira força, aproveitando os confrontos entre o grupo de Camacho/ Relvas e o de Costa/ Bernardino. Presidente do ministério da união sagrada, de 15 de Março de 1916 a 25 de Abril de 1917, onde acumula a pasta das colónias. Presidente da república eleito em 6 de Agosto de 1919. Exerce as funções de 5 de Outubro de 1919 a 5 de Outubro de 1923. É o único que consegue cumprir o seu mandato. Morreu em 30 de Outubro de 1929. A partir de Janeiro de 1911 desenha um movimento de ruptura com a facção dominante no governo provisório. Nesse mesmo mês apresenta no conselho de ministros, projecto sobre o horário de trabalho, que não é aprovado. É então que começa a publicar-se o jornal República, de que é fundador (15 de Janeiro). Dá apoio frouxo ao segundo governo, presidido por João Chagas, em Setembro de 1911, quando se esboça uma manobra entre camachistas e afonsistas para o afastar. No mês seguinte é vaiado e sovado no Rossio por afonsistas.Tinha-se declarado independente do Partido Republicano em nota publicada em A República. Nov 11 António José de Almeida e Afonso Costa vão de comboio ao Porto em propaganda. Na chegada ao Porto, Almeida é insultado e Costa aplaudido. Repete-se a cena no regresso a Lisboa, no dia 6 de Novembro. Manifestantes gritam vários morras e Almeida, em charrette, tem de sacar da pistola para se defender. Costa vai de automóvel e é ovacionado. Como salienta Vasco Pulido Valente a chegada ao Rossio juntou num único dia o 4 de Maio de Hintze Ribeiro e o 18 de Junho de João Franco. António José de Almeida em artigo publicado em A República de 7 de Novembro retira apoio ao governo de João Chagas: o governo está em crise total? Não se sabe. No entanto não vemos razão para que o governo abandone o poder. Um só homem tem que sair e deve sair. É o sr. João Chagas. A pasta do interior tem de ser confiada a um homem de critério, mas a quem não faleça o pulso. Ou entramos na ordem, ou. Este pede imediatamente demissão a Manuel Arriaga.

Afastando-se do Partido Republicano em Outubro de 1911, alia-se a Brito Camacho, esboçando a criação de uma União Nacional Republicana. Mas, em 24 de Fevereiro de 1912, funda o Partido Republicano Evolucionista. No mês seguinte propôe, em pleno parlamento, nada mais, nada menos, que uma amnistia geral para os católicos e conspiradores monárquicos, coisa que não teve vencimento, nomeadamente pela actuação do deputado Alexandre Braga. Afonso Costa, por seu lado, reforçou o controlo do PRP.

Nos primeiros dias de Janeiro de 1913, Duarte Leite, naquilo que Machado Santos qualificou como um ataque de neurastenia, apresentava a demissão, tendo como pretexto a divisão formal do Partido Republicano e invocando a necessidade de um governo assente numa maioria parlamentar. Arriaga ainda tentou a hipótese de António José de Almeida, que contou com o apoio de Brito Camacho, mas que não conseguiu mobilizar os independentes, por causa da respectiva proposta de amnistia. Chegava o tempo

António José de Almeida defendeu a necessidade de realização imediata de eleições locais, mas a maioria das câmaras municipais disse que não, invocando o facto do eleitorado ser adverso à república ou dominado pelo clero. O ministro da guerra continuava a ser apoiado pelo jovens turcos.

1913 A outubrada impende que se consume a Liga das Oposições, com a junção do grupo de Brito Camacho a António José de Almeida e Machado Santos, e onde alinhavam o jornal O Rebate, influenciado por Alfredo de Magalhães.

Junho 14 Afonso Costa desafia António José de Almeida para duelo, sabendo que este o não aceita, por ser defensor do modelo dos tribunais de honra.

Dez 14 António José de Almeida recusa governo de concentração. Afonso Costa diz que a união é impossível por causa das guerras pessoais. Almeida considera que a questão tem a ver com princípios, nomeadamente com as divergências quanto à Lei da Separação. Brito Camacho está contra o governo de concentração e até contra a hipótese de governo extrapartidário, defendendo um governo de base parlamentar demo-evolucionista ou demo-unionista. Mas põe obstáculos até à concretização deste último.

Jan 15 apoia gov. de P. machado

António José de Almeida, elogiando Pimenta de Castro, promete uma oposição tenaz, formal e intransigente

António José de Almeida na Câmara dos Deputados considera que, perante a guerra, a alma portuguesa ainda não encontrar aquela vibração suprema. Jaime Cortesão havia defendido a criação de um sistema de propaganda face à nossa participação na guerra (20 de Maio)

António José de Almeida, eleito em 6 de Agosto, tomou posse como Presidente da República em 5 de Outubro de 1919

Em 26 de Agosto de 1922, António José de Almeida partia para uma viagem oficial ao Brasil (chega ao Rio de Janeiro em 17 de Setembro e regressa a Lisboa no dia 11 de Outubro)

Jan 23 António José de Almeida impõe o barrete cardinalício ao novo Núncio Apostólico, Monsenhor Acquille Locatelli, em 4 de Janeiro. Choques entre revolucionários e polícias em Lisboa e no Porto.

·Quarenta Anos de Vida Literária e Política

4 vols., Lisboa, 1933-1934. Ver Governo de António José de Almeida.

Alma do povo

Volksseele

Conceito do idealismo e do romantismo alemães, estabelecido por Herder e desenvolvido por Savigny que a III República Francesa adopta e que em Portugal vai ser assumida por republicanos e monárquicos. Joaquim de Carvalho, na Compleição do Pa

Herder

Cabe a Herder o lançamento da ideia de alma do povo (Volksseele), considerando que cada povo gera algo que é singular, maravilhoso, inexplicável, indizível. Porque cada povo é um povo orgânico, não uma simples sociedade atomística, mas uma unidade natural, o produto de um crescimento natural, valorizando-se a diferença, o particularismo, a especificidade do tempo e do lugar.

Renan

O romantismo, na sua faceta republicana, à maneira de Renan, gera um nacionalismo místico que começa a falar na alma dos povos, na sequência do Volksgeist da Escola Histórica de Savigny. Junta-se, assim, à ideia clássica de respublica a ideia de nação, surgindo um novo estilo de patriotismo republicano, consagrado pela III República francesa.

Eça de Queirós

Em Portugal esta ideia é, desde logo, defendida por Eça de Queirós, para quem a alma dum povo define-se bem a si mesma pelos heróis que ele escolhe para amar e para cercar de lenda.

Fernando Pessoa

Fernando Pessoa, por seu lado, considera que uma nação tem uma alma, um corpo espiritual invisível à razão, que é suprema apenas no mundo da experiência, um destino indeterminável pela lógica, incriável pela vontade serva e pelo pensamento pseudo-nosso. Nada nos diz que essa alma não exista; antes nos segreda a experiência intuitiva da vida que, deveras, uma nação tem um espírito, uma pessoa, um seu destino, como cada homem.

JOAQUIM DE CARVALHO em Compleição do Patriotismo Português, Coimbra, Atlântida, 1953, fala na existência de uma "alma dos povos": "a História dá-nos assim, simultaneamente, o testemunho real e as dimensões existenciais da compleição da alma dos povos, da capacitação, qualidades e defeitos que a constituem, da hierarquia de valores que a singularizam, das tradições que a mantêm, das aspirações que a alentam e das vicissitudes dos ideais que a orientam"(pp. 11-12). FR. JOAO FERREIRA, em Existência e Fundamentação Geral do Problema da Filosofia Portuguesa, Braga, Editorial Franciscana, 1965, considera que "existe no seio da nação portuguesa uma alma portuguesa, com um carácter, uma personalidade espiritual, donde tem procedido o seu destino social e humano. Esta alma expressa em formas e oculta em atitudes e sentimentos já revelados e ainda por revelar, constitui a realidade interior do histórico português, realidade que compete descobrir à filosofia da história"(p. 115). Cit. por ANTONIO QUADROS, A Ideia de Portugal..., p. 11. Já em A Nova Poesia Portuguesa, texto publicado na revista Aguia, em 1912, considera que "por vitalidade de uma nação não se pode entender nem a sua força militar, nem a sua prosperidade comercial, coisas secundárias e por assim dizer físicas das nações; tem de se entender a sua exuberância de alma, isto é, a sua capacidade de criar, não já simples ciência, o que é restrito e mecânico, mas novos moldes, novas ideias gerais, para o movimento civilizacional a que pertence"( in Textos de Crítica e Intervenção, p. 15). Refira-se que o ambiente de neo-romantismo do princípio do século propiciou o aparecimento de várias revistas marcadas pela procura do nossso "Volksgeist". Desde a republicana Alma Nacional, à monárquica-integralista Alma Portuguesa, surgida em 1913, no exílio de Gand, que deu lugar em 1914 à Nação Portuguesa, para além, dessas tentativas de conciliação de monárquicos, republicanos e modernistas que, em 1916, foram as revistas Ideia Nacional e Exílio

Allgemeines Staatslehre, 1900

Obra de Georg Jellinek, marcada pelo positivismo estadualista, onde se considera que há um elemento objectivo e um elemento jurídico no Estado ou, mais explicitamente, um Estado Sociológico e um Estado Jurídico.

Estado sociológico/Estado Jurídico

O primeiro, a formação social do Estado, tem a ver com o Estado situado no mundo dos factos, no domínio do ser;o segundo, a formação jurídica do Estado, coloca o Estado no domínio dos conceitos, onde apenas existem sujeitos de direito.

Estado sociológico

O Estado enquanto realidade social não passa de uma mera soma de determinadas relações sociais, que se traduzem em actividade entre os homens. Ora, na realidade social, existem unidades teleológicas, isto é, comunidades humanas marcadas por fins comuns, onde se detectam relações entre aqueles que comandam e aqueles que obedecem. O Estado Sociológico é, assim, a união autoritariamente considerada, de homens fixados num território, e dotada de originária força de império.

Imperar

Isto é, o Estado pode imperar, está em situação de impôr incondicionalmente a outros a sua própria vontade, está em condições de prevalecer incondicionalmente contra a vontade alheia. E isto porque o poder de império é um poder irresistível. Imperar significa comandar incondicionalmente e estar em condições de obrigar os outros a obedecer ao comando.O sujeito pode escapar‑se a qualquer outro poder, só não é possível fazê‑lo quanto ao poder de império.

Estado Jurídico

Outra é a realidade jurídica do Estado, situada no mundo dos conceitos. Dos conceitos, embora não da ficção, porque os conceitos jurídicos são abstracções que têm um substracto real; apenas traduzem em fórmulas jurídicas, factos da vida real. Aqui o Estado é visto como a cooperação territorial provida de uma originária força de império.

Auto-limitação do Estado

Se o Estado Sociológico fica acima e fora do direito, já o Estado Jurídico é o criador do direito, mas que se coloca a si mesmo dentro do direito; que aceita submeter‑se ao seu próprio direito; que aceita limitar os seus poderes. É o Estado vinculado no seu próprio direito, e isto porque um poder de império torna‑se jurídico quando é limitado.

O poder do Estado como poder jurídico

Daí concluir que o poder do Estado não é, portanto, o puro poder, mas poder exercido dentro de limites jurídicos e, por isso, poder jurídico.

Os fins do Estado

Neste sentido, assinala ao Estado três fins fundamentais: um fim de direito (que seria prosseguido pelas funções legislativa e jurisdicional); fins de conservação; e fins de cultura (sendo os dois últimos prosseguidos pela função executiva).

Allgemeines Staatslehre, 1852

Obra onde se defende uma perspectiva organicista do Estado, considerenado este como "a pessoa políticamente organizada da nação". É uma "pessoa viva",com corpo e com espírito,com uma cabeça ‑ o governo‑, um corpo, braços e pernas. Importa‑se, inclusive, com o próprio sexo desse organismo,atribuindo‑lhe uma masculinidade patente,ao contrário da sensibilidade feminina da Igreja, bem diversa da "sensibilidade activa do Estado". Conforme salienta, "a história,ao revelar‑nos a natureza orgânica do Estado, dá‑nos a conhecer também que este não figura na escala dos organismos inferiores como os animais ou as plantas,mas que é uma de espécie superior. Revela‑a como organismo etico‑espiritual, como um grande corpo que é susceptível de fazer seus os sentimentos e ideias dos povos,e expressá‑los em leis,realizá‑los com acções próprias.Ela própria nos informa àcerca das propriedades morais,do carácter de cada um dos Estados. Atribui ao Estado uma personalidade dotada de corpo e espírito,capaz de possuir e emitir a sua própria vontade". Para Bluntschli "o fim verdadeiro e directo do Estado é o desenvolvimento da nação,o aperfeiçoamento da sua vida,a sua conformação por uma marcha progressiva,que não está em contradição com os destinos da humanidade". O Estado é "a humanidade organizada,mas a humanidade em sua manifestação masculina,não em seu organismo feminino".Assim, considera que "o Estado procede substancialmente do mesmo modo que qualquer ser orgânico sobre a terra.Percorre todas as transformações internas e as diferentes fases duma vida cheia de juventude e forte, e atinge a maturidade e a velhice". Neste sentido, considerava negativo para o Estado a separação dos poderes porque "separar a cabeça do corpo para dela fazer um seu igual é matar o homem".

Alienação

Do lat. alienatio, acção de tornar alguém ou alguma coisa alheia a alguém. O mesmo que alheação. Pode, aliás, haver uma alienação psicológica quando uma pessoa se torna alheia a si mesma. Juridicamente diz-se da operação de transferência da propriedade de um bem. No plano sociológico tem a ver com a separação violenta de dois seres que deveriam estar unidos. Conceito de Marx, herdado de Hegel e de Feuerbach, que analisou especialmente o mecanismo da alienação religiosa. Em alemão, Entfremdung, vem de Fremd, estrangeiro, tal como em latim o alienus era também o estrangeiro. Segundo as teorias do contrato social, dá-se a alienção quando um indivíduo renuncia aos seus direitos originários e naturais, entregando-os ao todo que, depois, os transforma em direitos civis que atribui aos cidadãos. Isto é, a alienação acontece quando o indivíduo se afasta da natureza e dos produtos sociais, culturais e económicos que resultam da respectiva actividade. Segundo o marxismo, a alienação é um processo pelo qual um trabalhador é desapossado do produto do seu trabalho. Havendo propriedade privada dos meios de produção, dá-se assim a despersonalização dos trabalho. Há separação entre o homem, enquanto membro da sociedade civil, e o homem enquanto cidadão do Estado. É a partir deste conceito que Marx elabora o de exploração. Althusser salienta que a alienação em Marx ainda é uma noção pré-marxista, do humanismo do jovem Marx, aparecendo nos Manuscritos de 1844. Wilhelm Reich tenta identificar o conceito freudiano de repressão dos instintos ao conceito marxista de alienação económica.

Schwartz, D. C., Political Alienation and Political Behavior, Chicago, Aldine de Gruyter, 1973. Perroux, François, Aliénation et Societé Industrielle, Paris, Éditions Gallimard, 1970.

Alienação definitiva do poder

Na Idade Média, entre os defensores da mediação popular, há três escolas a assinalar. Para uns o povo aliena definitivamente o poder no Principe; para outros, o poder supremo fica repartido entre a comunidade e o monarca ‑ é o sistema da monarquia limitada pelas ordens, defendido por S. Tomás e que alguns qualificam como monarquia estamental; finalmente, um terceiro grupo considera que a comunidade conserva o poder legislativo e o controlo permanente dos actos do rei, que, pelo mesmo povo, pode ser deposto em certas circunstâncias. Os defensores da alienação definitiva do poder político consideram que o povo renunciou a todo o poder, perdendo a faculdade de fazer leis e nem sequer podendo anular a translatio. Consideram, assim, que o Principe é mais do que o povo, Princeps major Populo, como dizia Baldo. O mesmo autor referia que a translatio consistia numa alienação de pleno direito, já que, de outro modo, o Principe não seria um dominus, mas um simples commissarius populi. No campo oposto, a transferência do poder é perspectivada como uma simples concessio. Transmite‑se ao Principe um simples officium publicum e um usus, dado que o povo é mais do que o Principe, tendo o direito de legislar e o poder de retomar sempre o poder supremo ‑ é a posição de Guilherme Occam.

Aliança Republicana e Socialista (1931)

Grupo fundado em 4 de Julho de 1931 e com alguma actividade até 1934. Pretende assumir-se como uma espécie de resposta à institucionalização da União Nacional. Presidido por Norton de Matos, então Grão-Mestre da Maçonaria, conta com a participação de Tito de Morais e de Mendes Cabeçadas e nasceu da inciativa de Sá Cardoso. O directório, em 8 de Julho de 1931, chega a solicitar uma audiência a Carmona, onde reivindica direitos de partido político.

Aliança Democrática

Coligação fundada em 5 de Julho de 1979, com o PSD, CDS e PPM, liderados então por Sá Carneiro, Freitas do Amaral e Gonçalo Ribeiro Teles. Vence as eleições de 2 de Dezembro desse ano com 42,2%. O I governo da AD toma posse em 3 de Janeiro de 1980. Volta a vencer as eleições legislativas de 5 de Outubro de 1980, com 47,1%, mas o candidato presidencial apoiado pela coligação perde a favor de Ramalho Eanes, em 7 de Dezembro. Entretanto morre Sá Carneiro em 4 de Dezembro e surge novo governo presidido por Pinto Balsemão em 9 de Janeiro de 1981, sem a participação de Freitas do Amaral. O terceiro e último governo da AD toma posse em 4 de Setembro de 1981. Após a demissão do novo PM em 19 de Dezembro de 1982, a aliança dissolve-se e os partidos congregantes apresentam-se isoladamente àsa eleições de 25 de Abril de 1983.

Aliança Nacional 1911

Sampaio Bruno, Basílio Teles e Machado Santos tentam criar uma Aliança Nacional para eleger homens honrados capazes de pôr fim ao domínio dos provisórios, defendendo uma república ampla e aberta a todos os portugueses com cérebro e coração de portugueses, mas não aos serventuários impudentes da Monarquia (Maio de 1911).

Aliança

Do latim ad ligare, o mesmo que juntar a. A expressão entra no vocabulário contemporâneo através do fr. alliance. No plano das relações internacionais, é uma forma permanente de colaboração ou de cooperação entre Estados. Diz-se alinhamento quando não é formalizada através de um escrito. Abrange também a cooperação entre partidos e forças políticas. Em qualquer dos casos as entidades participantes na aliança conservam a respectiva independência ou autonomia. As alianças podem ser feitas tanto por ideias e princípios como por interesses.


Álgebra da revolução

Qualificação dada por Herzen ao pensamento de Hegel, dado que este procura conciliar Platão e Heráclito, pelo que todo o ser passa a ser dever‑ser. Trata‑se, aliás, de uma "álgebra" que quebra as anteriores regras algébricas, assentando numa nova filosofia da identidade, que diz que o real é igual à razão, e numa nova filosofia da verdade, que diz que a crença, o subjectivo, é igual à verdade, ao objectivo. Para utilizar as palavras do próprio Hegel, "a Ideia é a união do Subjectivo e do Objectivo (...) A Ciência pressupõe que a separação entre ela e a Verdade já foi abolida".

Aldeia

Segundo Aristóteles, a aldeia (kome) é a união de várias casas e de várias famílias, que, continuando a ter em vista a satisfação de necessidades vitais, já não se reduz apenas à satisfação das necessidades quotidianas. Segundo as próprias palavras de Aristóteles, a primeira comunidade formada por várias famílias tendo em vista a satisfação de necessidades que já não são puramente quotidianas. E que parece ser uma extensão da família. Só depois da associação de várias aldeias pode surgir a polis.

Alcobaça, Juntas de

Foi em 27 de Setembro de 1820 que os movimentos revoltosos de Lisboa e do Porto, depois de troca de correspondência entre Hermano Sobral e Francisco de São Luís, se fundiram em Alcobaça. No dia seguinte criavam-se dois órgãos unificados, desde uma Junta Provisional do Governo Supremo do Reino a uma Junta Provisional Preparatória das Corte. Já então começavam a esboçar-se as fricções no núcleo director do movimento, com o partido militar, encabeçado por António da Silveira e Sebastião Drago Cabreira opor-se ao partido dos magistrados, liderado por Manuel Fernandes Tomás, com o apoio de Francisco de S. Luís, dado que os primeiros, que alcunhavam os segundos como os becas e os rábulas, tinham apenas como objectivos a expulsão de Beresford e dos oficiais ingleses, com o regresso do rei e a convocação das Côrtes à maneira tradicional. Mas, mesmo antes do movimento se iniciar, já Portugal estava insanavelmente fraccionado. Numa carta que a Junta do Porto dirigiu à regência, em 3 de Setembro, reconhecia-se expressamente: V. Exas sabem que para cúmulo das nossas desgraças se haviam formado, e iam engrossando em Portugal, nessa própria cidade, na pátria da honra e da lealdade, três diversos partidos, que com aparente intuito de salvar a Nação, mas em realidade para salvarem seus particulares interesses, urdiam o indigno projecto, ou de nos entregarem a uma nação estranha (a espanhola), ou de nos manterem debaixo da vergonhosa tutela de outra (a inglesa), ou de derrubarem do trono o nosso augusto soberano, para lhe substituírem o chefe de uma ilustre casa portuguesa (a de Cadaval). Refira-se que os governadores do reino, depois de tentarem o controlo militar da situação, despachando para Leiria uma força militar comandada pelo conde de Barbacena, tentaram, depois, controlar politicamente a situação, com a convocatória de Cortes à maneira tradicional, despachando o marechal Coutinho Póvoas para parlamentar com os homens da Junta do Norte. Em 4 de Outubro as juntas entraram em Lisboa. Dois dias depois, surgiu uma portaria da Junta Provisional Preparatória das Cortes solicitando de academias, homens doutos ou prudentes, quaisquer alvitres, lembranças ou conselhos que a pudessem guiar ou ajudar no seu desejo de acertar, base fundamental do seu trabalho.

Albânia Republika e Shqiperise

A actual República da Albânia tem 28 748 km2 e 3 335 000 habitantes, dos quais 9% são gregos. O território albanês esteve integrado no Império Otomano do século XV até 28 de Novembro de 1912, data em que, sob a liderança de Ismail Qemali, foi proclamada a independência. Antes foi província romana e, depois, bizantina, e parcela dos impérios búlgaro e sérvio. Pelo Tratado de Londres de 30 de Maio de 1913, dava-se o reconhecimento internacional do novo Estado, circunstância que interessava à Áustria, mas que desagradava à Sérvia e ao Montenegro; no entanto, dois quintos dos albaneses continuavam em regime de minoria nacional no Kosovo e na Macedónia oriental, sob domínio sérvio, bem como na Grécia. Primeiro, o reino teve um príncipe alemão, Guilherme de Wied, apenas em 1914. Depois, passou a república e o presidente Ahamed Zog, tornou-se em 1938 no rei Zog (1895-1961). Em 1939, o território foi ocupado pelos italianos que favoreceram a constituição em 1941 de uma Grande Albânia pela integração do Kosovo. Logo em Outubro de 1944 era constituído governo sob a direcção de Enver Hodja, ainda durante a ocupação, que só vai terminar em Novembro. Em Dezembro de 1945 realizam-se eleições, onde a Frente Democrática conquistou a totalidade dos assentos. Em Janeiro de 1946 já se instituía uma República Popular, enquanto em Novembro de 1948, o Partido Comunista mudava o nome para Partido do Trabalho Depois do fim da guerra, a república foi marcada pela liderança de Enver Hoxha, até à sua morte em 1985; em 1948, quando se deu a ruptura entre a Jugoslávia de Tito e Moscovo, o regime de Tirana conservou fidelidade ao estalinismo para além da morte do georgiano, em 1953; quando se deu a desestalinização na URSS, a Albânia aproximou-se da China maoísta, mas acabou também por entrar em ruptura com Pequim, a partir de 1978. O antigo partido único ainda conseguiu ganhar as primeiras eleições livres de Abril de 1991, mas em Março de 1992, já era suplantado pelo Partido Democrático, rebaptizando-se como Partido Socialista da Albânia

Alain (1868-1951)

Pseudónimo de Émile Auguste Chartier. Um dos inspiradores teóricos da fase radical da III República Francesa. Autor francês. Marcado pelo espinosismo e pelo cartesianismo, é um dos principais teóricos do individualismo contemporâneo. Inspirador do novo pensamento radical francês é também um dos herdeiros da chamada república dos professores. Destaca-se durante a chamada questão Dreyfus, pelos seus curtos Propos, publicados diariamente em La Dépêche de Rouen. Neles, faz a defesa moralista da liberdade individual contra a tirania do Estado. Glosando Lord Acton, diz que se o poder enlouquece, o poder absoluto enlouquece absolutamente.

Agnosticismo

Termo cunhado por T. H. Huxley em 1869 (agnosticism), e, depois, divulgado por Herbert Spencer. Formado a partir do grego agnostos, isto é, aquilo que é relativo ao desconhecido. Doutrina segundo a qual não é possível conhecer o que está para além da experiência. Os seres humanos nunca têm suficientes provas para sustentarem uma afirmação ou para negarem uma proposição. Neste sentido, a tese admite a impossibilidade do entendimento humano aceder ao absoluto. Que não é possível saber se Deus realmente existe ou não. A doutrina está ligada ao movimento céptico do cientismo, visando principalmente a rejeição das crenças cristãs. Distingue-se do ateísmo.

Agitação

Do latim agito, sacudir, conduzir rapidamente de um lado para outro. Forma do verbo ago, agere, equivalente a pequeno salto. O agitador está assim próximo do salteador. Agitação tem, pois, a ver com uma perturbação da ordem estabelecida visando, não derrubá-la, mas miná-la. É um movimento de excitação lançado sobre a opinião pública visando atingir-se pelas vias legais um qualquer objectivo de ordem política e social. Neste sentido, agitador é aquele que provoca, desenvolve e dirige o movimento. Os partidos comunistas durante a Guerra Fria e no âmbito da estratégia indirecta dispunham de uma secção dita de agitprop, de agitação e de propaganda.

A.G.I.L.

Iniciais de Adaptation, Goal-attainment, Integration, Lattern Pattern maintainance. As quatro funções que cabem ao sistema social: adaptação ao ambiente (A); prossecução de fins, ou goal-attainment (G); integração das tendências internas (I); manutenção dos modelos culturais, a função de conservação dos modelos ou latent pattern maintenance (L). As duas primeiras correspondem à relação do sistema social com o respectivo ambiente; as duas últimas estão voltadas para as relações internas do mesmo sistema.

É neste contexto que o político é perspectivado como o subsistema social que tem como função o goal-attainment, a organização e a mobilização dos recursos necessários para a realização dos fins de uma determinada colectividade, a capacidade de fazer com que as unidades que pertencem a um dado sistema de organização cumpram as respectivas obrigações, sendo entendido como um sistema autónomo e aberto que mantém relações e trocas constantes com os outros subsistemas da sociedade: o conjunto das actividades económicas, o conjunto dos processos de socialização (família e educação), o conjunto de instituições que tem por função manter as solidariedades que uma sociedade pode exigir dos seus membros (o aparelho legislativo e o aparelho judicial).

Retirado de Respublica, JAM

Administração

De ad + ministratio. O aparelho organizado do Estado, a burocracia, visando preparar e executar a legislação e as políticas públicas. Se é ministro aquele que presta um serviço, administra aquele que está junto a quem resta um serviço. A constituição de 1976 considera o governo como órgão superior da A.P.


Administração das coisas Engels no Anti-Duhring, considera que quando desaparecer o Estado, sucederá a administração das coisas, entendida como direcção das operações de produção, em vez do governo das pessoas.

Administração e política Há uma diferença substancial entre o circuito administrativo e o circuito político. O circuito administrativo produz uma mera decisão técnica, é uma simples decisão sobre meios postos ao serviço de fins que são definidos pela política. O circuito político, acrescendo aos circuitos administrativos que lhe são anteriores, mas sem os eliminar nem substituir, visa sempre uma decisão sobre fins, dado que o decisor político é um decisor situado acima das partes, procurando conciliar os contrários da liberdade e do poder.

Administração Pública

Adenauer, Konrad (1876- 1967)

Natural de Colónia. Jurista, burgomestre de Colónia de 1917 a 1933 e deputado. Membro influente do partidodemocrata-cristão alemão Zentrum. Preso por duas vezes, em 1934 e 1944. Volta a ocupar tal cargo em 1945, mas os britânicos logo o destituem, acusando-o de ineficácia. Dedica-se, então, à construção daquilo que virá a ser a CDU. Vence as eleições de 1953. Chanceler alemão desde 14 de Setembro de 1949 até 1963. Obtém grande apoio norte-americano, dado ser considerado um bom aluno atlântico, cultivando especiais amizades com John Mac Cloy, alto-comissário norte-americano, e Foster Dulles, secretário de Estado de Eisenhower. Vai também ter um entendimento especial com o general de Gaulle, a partir de 1958.

Adams, John Quincy (1767-1848)

O sexto presidente dos Estados-Unidos (1825-1829). Filho de John Adams. Puritano da Nova Inglaterra. Foi embaixador na Europa, chegando a passar por Lisboa. Um dos inspiradores da chamada doutrina de Monroe, de quem foi secretário (1817-1825). Discípulo de Burke, de quem recebe a defesa do princípio da continuidade social e das normas consuetudinárias, também acredita na ideia de progresso e na perfectibilidade da natureza humana. Teme as maiorias absolutas, defende a necessidade de um federalismo centralizador. Considera, em 1842, que a democracia é a pedra angular da religião cristã. É o elemento primordial de todos os governos legais da terra. A democracai é o autogoverno da comunidade pela vontade conjunta da maioria dos seus membros.


Adams, John (1735-1826)

Advogado de Massachusetts. Sucede a George Washington, como segundo presidente da república norte-americana, sendo apoiado pelos federalistas. Grande rival de Thomas Jefferson, na altura em que este funda o partido republicano, durante a administração de George Washington, antecedente do actual partido democrático. Durante a respectiva presidência surge, dentro dos federalistas, a facção dissidente de Alexander Hamilton, que se distancia de Adams quando este, em 1799, aposta num tratado de paz com a França, enquanto Hamilton, mais pró-britânico, tende para a continuação da guerra. Adams, no plano das teorias políticas, é influenciado por Harrington e Vattel. Um dos fundadores do modelo conservador norte-americano, defende um governo forte, opondo-se ao poder das massas. Pugna por um sistema das duas câmaras. Adopta o princípio da soberania divisível. Critica as constituições-pudim. Muito à maneira de Montesquieu, considera que o poder deve opor-se ao poder, a violência à violência, a força à força, o interesse ao interesse, assim como a razão à razão, a eloquência à eloquência e a paixão à paixão. Distancia-se das posições de Benjamin Franklin e de Condorcet. Considera que a revolução norte-americana não foi um levantamento inovador, mas a restauração das antigas liberdades e prerrogativas coloniais dos Tudor. Neste sentido, subscreve a tese de Burke, para quem a mesma foi uma revolução evitada, não realizada. Critica o abuso de conceitos apriorísticos, adoptados por Jefferson e Madison que, então, constituem o chamado partido republicano, base dos actuais democráticos. Adepto do conservadorismo à maneira de Burke, procura conciliar as ideias liberais com o saber consuetudinário. Como salienta em 1789, numa carta dirigida à mulher, tenho de estudar política e guerra, para que os meus filhos possam ter a liberdade de estudar matemática e filosofia, geografia, história natural e arquitectura naval, navegação, comércio e agricultura, a fim de darem aos seus filhos o direito a estudarem pintura, poesia, música, arquitectura, escultura, tapeçaria e cerâmica.

Aclamação

De clamare, chamar. Quer significar em sentido etimológico grito unânime. Uma unanimidade espontânea que expressa o consentimento geral e a que se chega sem discussão e sem qualquer possibilidade de oposição. Manifestação ruidosa de um sentimento comum ou de uma decisão colectiva, denotando uma certa espontaneidade irresistível. Nalguns casos chega a substituir as manifestações silenciosas e reflectidas da vontade colectiva, nomeadamente o voto secreto. A expressão tem um significado especial em Portugal, qualificando a subida ao trono de D. João VI, duque de Bragança, a partir do dia 1 de Dezembro de 1640, como é assinalado na história comparada do direito político.

Acção Realista Portuguesa (1923)

Depois de uma carta de Alfredo Pimenta a Aires de Ornelas, em 8 de Dezembro de 1923, pedindo para integrar a Causa Monárquica, tentando misturar o apoio a D. Manuel II com as doutrinas tradicionalistas, é criada a Acção Realista Portuguesa, independente da Causa, mas subordinada ao lugar-tenente. Integram o novo grupo António Cabral, ex-ministro da monarquia, e Caetano Beirão, dissidente do Integralismo Lusitano.

Acção Escolar de Vanguarda (1934)

Organização criada em 1934, dirigida pelo estudante Ernesto de Oliveira e Silva e por António Eça de Queirós. Defesa da Ordem Nova e de um Estado Totalitário. Em 28 de Janeiro de 1934, há uma sessão no Teatro São Carlos de apresentação do movimento, promovida por João Ameal e Manuel Múrias. Preside Carmona. Discursos de António Ferro e de Salazar: não reconhecemos liberdade contra a Nação, contra a família, contra a moral... comunismo... a grande heresia da nossa idade. Insere-se numa estratégia de liquidação do nacional-sindicalismo por parte do governo. Seguiu-se em Fevereiro o facto de dissidentes do Nacional Sindicalismo começarem a publicar a revista Revolução Nacional, dirigida por Manuel Múrias. Dois anos depois, era criada a Mocidade Portuguesa.
Retirado de Respublica, JAM

Acção directa

Quando um grupo, para atingir os respectivos objectivos, actua sem utilizar os canais de comunicação ou os processos de decisão institucionalizados e aceites como regras do jogo. Diz-se, normalmente, das actividades de grupos de trabalhadores que entram ou greve sem o apoio sindical ou quando praticam actos de sabotagem.
Retirado de Respublica, JAM

Acção Democrato-Social

António Sérgio, Jaime Cortesão e Mário Azevedo Gomes criam em Dezembro de 1950 o Directório Democrato-Social. Esta estrutura mantém-se até depois de 1974. Este grupo começou por reunir Mário de Azevedo Gomes, Jaime Cortesão e António Sérgio, os barbas. Entrou depois Mário Soares, em 1956, em nome da Resistência Republicana e Socialista. O grupo faz, sobretudo, exposições ao Presidente da República, naquilo que Humberto Delgado chama a pequena guerra dos papéis. Entre os fundadores, Acácio Gouveia, Artur Cunha Leal, Carlos Sá Cardoso, Carlos Pereira, comandante Moreira de Campos, Nuno Rodrigues dos Santos e Raúl Rego.
Retirado de Respublica, JAM

Acção colectiva

A mobilização de grupos de indivíduos em torno de objectivos comuns, segundo as teses de Mancur Olson. Movimento que unifica diversos actores sociais, mobilizados conjuntamente para a satisfação de interesses comuns. Apesar de, na aparência, parecer unitária, há, para cada grupo, uma lógica diversificada. O autor em causa em The Logic of Collective Action. Public Goods and the Theory of Groups, Cambridge, Massachussetts, Harvard University Press, 1965, para quem os grupos não se comportam segundo a lógica de racionalidade dos indivíduos. Os indivíduos apenas se entregam espontaneamente numa acção colectiva, quando ela lhes dá uma vantagem própria. Daí que nos grupos de grande dimensão, como num Estado ou num partido, os indivíduos apenas participem nas acções colectivas quando podem delas retirar vantagens específicias ou quando a não participação dá origem a sanções. Olson, Mancur.
Crozier, Michel, Friedberg, Ehrard, L’Acteur et le Système. Les Contraintes de l’Action Colective, Paris, Éditions du Seuil, 1977.
Retirado de Respublica, JAM

Acção Católica Portuguesa

Pio XI em 10 de Novembro de 1933 institucionaliza a Acção Católica Portuguesa, levando à dissolução na prática do Centro Católico, considerado a partir de então como mero órgão de defesa da Igreja no campo legal, embora distinto e separado da Acção Católica, conforme a nota oficiosa do episcopado de 16 de Novembro de 1933. Trata-se de um movimento católico de leigos de carácter internacional. Um dos primeiros a ser institucionalizado foi a Acção Católica Italiana, em 1931. Quanto a Portugal, em Dezembro de 1934, uma série de militantes do centro aparecia como deputado salazarista, como Diogo Pacheco de Amorim, Pinheiro Torres, José Maria Braga da Cruz, Joaquim Diniz da Fonseca, Juvenal de Araújo, Mário de Figueiredo, António Sousa Gomes e o cónego Correia Pinto. Salazar considera então o Centro como inconveniente e dispensável, porque era intromissão da política na religião levando a uma confusão indesejável da Igreja com um partido. Em Dezembro de 1937 começam as emissões da Rádio Renascença, a segunda estação radiofónica católica do mundo, depois da Rádio Vaticano.
Retirado de Respublica, JAM

Abrilada

Nome pelo qual são conhecidos vários golpes de Estado e intentonas do Portugal Contemporâneo. A primeira, promovida por D. Carlota Joaquina e D. Miguel, deu-se em 30 de Abril de 1824. A movimentação começa pelo pronunciamento no Rossio com o Infante a proclamar querer acabar de vez com a infernal raça maçónica. O rei estava no paço da Bemposta e o corpo diplomático, reunido nos salões da legação britânica festejando o aniversário do rei Jorge IV. Com o apoio deste grupo, dinamizado pelo embaixador britânico, Thornton, e pelo francês, Hyde de Neuville, o rei refugia-se a bordo da Windsor Castle. Em 14 de Maio a situação estabiliza com D. João VI a regressar à Bemposta, demitindo o ministro da justiça, o rainhista Leite de Barros, e obrigando D. Miguel a partir para o exílio.

Retirado de Respublica, JAM

Abranches, João de Pina Madeira

Krausista português. Em 1864, considera que o Estado deve organizarse sobre o modelo do eu humano, constituindose como uma espécie de eu social, entendido como a coagulação da vontade livre e reflectida do povo. O eu social harmonizase com as actividades sociais através da ideia de contrato político, que o mesmo autor identifica com a Constituição. O Estado, em suma, não passa de um organismo especial do organismo total que é a Sociedade, cabendolhe, em nome do princípio da justiça, garantir o equilíbrio e o vínculo entrelaçante das várias esferas e instituições sociais. O Estado tem, assim, um duplo fim: administrar a justiça e condicionar todas as instituições sociais, mas sem uma intervenção tirânica e totalizante: o direito, subministrando os meios de desenvolvimento às diferentes esferas da actividade humana, uneas por laços orgânicos e chega até a firmar uma legítima solidariedade, bem semelhante ao sistema nervoso, que, ligando todas as partes do corpo, torna cada uma delas condição para a conservação das outras.

Retirado de Respublica, JAM

Abelardo, Pedro (1079-1142)

Natural da Bretanha, ensina em Paris desde 1108. A sua vida pessoal, marcada pela paixão por Heloísa, uma sua estudante, ainda adolescente, tem ofuscado os escritos filosóficos, da Introdução à Teologia, de 1115, a Da Unidade e da Trindade Divina. Marcadamente racionalista, considera que os próprios mistérios cristãos podem ser explicados pela razão, contrariando, deste modo, as teses de Santo Alberto Magno. Tenta conciliar o nominalismo e o realismo, através do conceptualismo, apontando uma via para a resolução da contenda dos universais, num terceirismo seguido por São Tomás de Aquino e Duns Scottus. Os universais ou essências não são meras palavras (flatus vocis) existindo realmente, antes, por dentro e por trás das coisas. Apenas existem as coisas individuais, mas os termos gerais têm aplicabilidade universal a coisas cujas qualidades comuns se conhecem através de um processo de abstracção mental. Considera que a verdade só pode ser atingida dialecticamente pesando os prós e os contras de cada perspectiva que dela se aproxima. Ver Oeuvres Choisies, apresentação e notas de Maurice de Gandillac, Paris, Aubier, 1945. O autor escreveu também uma autobiografia célebre Historia Calamitatum Mearum, bem como Sic et Non, de 1122, e Scito te Ipsum.

Retirado de Respublica, JAM