sábado, 7 de outubro de 2006

Política

A expressão política, que surge no vocabulário ocidental a partir do século XIII quando começa a circular a versão latina do tratado homónimo de Aristóteles, tem a ver com uma invenção dos gregos e dos romanos que o primeiro grande renascimento medieval trouxe ao Ocidente. Acontece que politika, o plural de politikós, as coisas políticas, não é o mesmo que politeia, ou regime político, que deu origem à expressão medieval politia, nem se identifica como politikè, ou arte política, a soma de polis mais teknè.
Este aparente jogo vocabular, que recobre a expressão portuguesa política, foi desde sempre resolvido na língua inglesa, onde politics é o mero espaço de competição política, polity é o modo de organização das sociedades humanas, e policy, o programa, a estratégia da competição política.
As coisas políticas, as coisas da polis, são as coisas que vão além do doméstico, além da casa, as coisas que começam na praça pública, ágora, forum ou largo do pelourinho, esse lugar de encontro do conselho, onde se exerce o diálogo entre homens livres. Fazem parte do espaço público e não do espaço privado. Logo há o político, tudo o que diz respeito à polis, o regime político, os princípios referentes à organização interna da polis, a arte política, a arte de governar os povos, os modelos políticos, o estilo de dirigir um governo, e o poder político, aquilo que fazem os políticos. O du politique distingue-se assim de la politique, tal como polity, o modo de organização do Estado, não se confunde com policy, o programa e tipo de acção, nem com politics, o domínio onde entram em rivalidade os políticos.
Posted by JAM

Plutocracia

A plutocracia (do grego ploutos: riqueza; kratos: poder) é um sistema político no qual o poder é exercido pelo grupo mais rico. Do ponto de vista social, esta concentração de poder nas mãos de uma classe é acompanhada de uma grande desigualdade e de uma pequena mobilidade.
Actualmente tal sistema é essencialmente um conceito teórico pois jamais foi realmente institucionalizado em parte alguma, mesmo que se note uma grande correlação entre o poder político e a riqueza. Portanto, o termo "plutocracia" é mais um argumento dentro do debate político do que um regime propriamente dito.
(Retirado da Wikipédia)

Partido

Na polis grega, a palavra correspondente era stasis, que começando por corresponder à nossa conotação de partido, depressa passou a corresponder a uma denominação pejorativa, entendida como facção e depois como sedição. Como o sinal de uma guerra interior, de uma guerra civil, um estado doentio, uma degenerescência da política.
Aliás, num dos primeiros inventários funcionalistas sobre as características dos partidos políticos, de Joseph La Palombara e Myron Weiner, são enumeradas as seguintes características dos mesmos: durabilidade, estrutura complexa, vontade de implantação popular, vontade deliberada de exercer directamente o poder).
Porque os partidos organizam a opinião pública, comunicam as reivindicações aos centros de decisão; articulam para os seus seguidores o conceito e o significado de uma comunidade em geral; estão intimimanete ligados ao recrutamento político.
Deles, pode dizer-se o que vem em qualquer manual de estasiologia do princípio do século. Por exemplo, seguindo Ostrogorski, de 1902, podemos dizer que os nossos partidos também são meros instrumentos de elites escondidas por trás daquilo que designava por programas omnibus (programas que oferecem soluções universais que nunca se realizam, programas tipo pai natal que oferecem tudo a todos). Que quanto mais cresce o elitismo dos organizadores dos partidos, mais cresce o indiferentismo das massas (o não vale a pena).
Acrescentemos o que deles disse Robert Michels, em 1911. Que todos eles estão sujeito à lei de ferro da oligarquia; que a democracaia desemboca naturalmente numa oligarquia, marcada pela vontade de poder, porque quanto mais massificação mais organização. Que quanto mais divisão de trabalho, mais necessidade de uma classe de políticos profissionais e de peritos. Até porque todo o partido político, para ganhar votos, tem de perder a sua virgindade política e entra em relação de promiscuidade com os elementos políticos mais heterógéneos;
Robert Michels analisando o SPD, o principal partido de organização de massas na viragem do século XIX para o século XX, vem falar na lei de ferro da oligarquia, segundo a qual quem diz organização diz necessariamente oligarquia, na emergência dentro destes novos grupos, de uma nova minoria organizada, que se eleva à categoria de classe dirigente.
Com efeito, o que escreviam Ostrogorski em 1902 e Michels em 1911, analisando os recentes partidos de militantes, agrava-se quando enfrentamos os novos modelos de partidos do pós-guerra, os partidos catch all, attrape tout ou pigliatutto, especialmente em tempo de teledemocracia e de sondajocracia.
Já no começo da década de cinquenta Maurice Duverger, na sua classificação tripartida do unipartidarismo, bipartidarismo e multipartidarismo, relacionando-a com o regime eleitoral salientava que um modelo de escrutínio maioritário a uma volta apontaria para o bipartidarismo.
Neumann veio, entretanto, acrescentar que o bipartidarismo seria acirrado por uma série de circunstâncias como a homogeneidade social e a continuidade política. Isto porque, em tal modelo, os partidos procuram ganhar votos ao centro, a fim de conquistarem uma maioria. Pelo contrário, o sistema multipartidarista seria marcado pelas tendências centrífugas dos diversos grupos políticos, sendo típico de sociedades multiformes e pouco conexas.
Contudo, Arend Lijphart salientou a existência de modelos de estabilidade política com multipartidarismo, como nos países escandinavos, contrariando o pressuposto de que o modelo bipartidário seria o único existente em sociedades politicamente estáveis, como aconteceria nos países anglo-saxónicos. Assim, distinguiu um multipartidarismo integral de um multipartidarismo moderado ou temperado pela existência de alianças estáveis e coerentes, porque grandes coligações, que apresentassem aos eleitores uma plataforma comum e que actuassem concertadamente no parlamento, modificariam profundamente o multipartidarismo. E quando se desse o dualismo das alianças até poderia cair-se num modelo quase bipolarista, a chamada bipolarização.
Utilizando a terminologia de Lapolombara e Weiner, diremos que, em Portugal, vivemos em regime de sistema político relativamente competitivo para os dois partidos dominantes do sistema, que têm tido ciclos de hegemonia, findos os quais se geram situações de alternância. Contudo, ultrapassando o espaço desta bipolarização dentro do grande centro, o sistema é claramente não competitivo, dado que os grandes partidos marginais não podem aspirar autonomamente à governação.
Saltando agora para o modelo de Giovanni Sartori, diremos que interessa considerar, para além do número de partidos, a multiplicidade da dinâmica política, procurando saber em que medida o poder político está fragmentado ou não fragmentado, disperso ou concentrado. Assim, podemos dizer que, entre nós, existe um pluralismo limitado, dado que é polarizado por dois grandes partidos com pouca fragmentação e alguma competição.

Posted by JAM

Obediência

Do latim obediscere, submeter-se à vontade de outrem e executá-la. Acção de realizar a ordem dada por um superior. Aquiescência, tácita ou expressa, face a um determinado comando. A ideia foi particularmente acentuada pelo paternalismo e pelo absolutismo, gerando o modelo do hábito de obediência dos súbditos face a uma entidade superior, o soberano. Outra é a perspectiva da obediência pelo consentimento, onde aquele que obedece apenas o faz relativamente àquilo a que dá consentimento, pelo que, de certa maneira, obedece a si mesmo, assumindo-se, ao mesmo tempo, como súbdito e soberano, isto é, como cidadão. É esta a perspectiva do consensualismo. Do mesmo modo se procura a autoridade, aquele quid que procura a obediência espontânea. O normal numa comunidade política é a obediência espontânea exigida pela sociabilidade, pelo sentimento comunitário, pelo interesse individual de obedecer e só depois pela coacção, tanto a psicológica, como a virtual ou em potência, dita coercibilidade, ou coacção potencial

. Milgram, Stanley, Obedience to Authority, Nova York, Harper Colophon Books, 1974.

. Moore, Barrington, Injustice. The Social Bases of Obedience and Revolt, Basingstoke, Macmillan Press, 1969.

. Walzer, Michael, Obligation. Essays on Disobedience, War and Citizenship, Cambridge, Massachussetts, Harvard University Press, 1970.

Obediência em consciência

Quando a coacção é entendida como uma afirmação da liberdade. Porque, como refere Jacques Maritain, a autoridade deve ser obedecida em consciência, isto é, da maneira como os homens livres obedecem e no interesse do bem comum. O animal apenas tem obstáculos naturais, não tem liberdade e não sente a coacção. E esta, como ensina Castanheira Neves, não é mais que aquele instrumento de que as colectividades organizadas se servem para impor ao arbítrio a vinculação jurídica válida... a coacção defende a liberdade contra o arbítrio, mas a coacção só será válida se for o instrumento da aplicação de um direito válido e um direito válido é aquele que recebe o seu fundamento e encontra o seu limite na consciência ética, será esta também o fundamento e o limite da coacção aceitável

Obediência pelo Consentimento

Doutrina, segundo a qual quem manda, manda, sobretudo, pelo reconhecimento daqueles que estão sujeitos ao mando. Porque todo o poder tende a ser um ofício, um simples poder-dever. Penetra-se assim na zona da autoridade, onde a obediência pelo consentimento é bem diferente da obediência pelo temor. Utilizando palavras de Georges Burdeau, a autoridade é assim a qualificação para dar uma ordem, distinta do simples poder que é apenas a possibilidade de ser obedecido. Já não se trata de um dominium servile, produto do pecado, mas antes de um dominium politicum, que já exige legitimidade. Como diz Rousseau, ainda o mais poderoso de todos os homens não será suficientemente poderoso, se não souber converter o seu poder em direito e a obediência dos outros em dever. Porque a força é uma potência física, de cujas actuações não pode resultar nenhuma moral. Também Schiller refere que a única coisa que torna poderoso aquele que manda é a obediência daquele que obedece.

Obediência gera o Estado BENTHAM

Obediência faz o imperante

A partir do absolutismo é a obediência que faz o imperante (oboedientia facit imperantem). O soberano é absoluto porque não está limitado a não ser pela sua própria vontade. O soberano não está limitado pelo direito, porque é ele que cria o direito. O soberano nem sequer está dependente das próprias leis que edita. Aquilo que o principe quer, aquilo que o principe diz, tem valor de lei. O direito deixa de ser fundamento e limite do soberano. A soberania enquanto circuito directo de comando é determinada pela adesão ou submissão de um povo relativamente ao seu governo. A qualidade soberana, afinal, nasce de um hábito de obediência de uma determinada sociedade face a um superior.

Obediência passiva dos súbditos DONOSO

Obediência como dever

Como dizia Schiller, a única coisa que torna poderoso aquele que manda é a obediência daquele que obedece. Porque, como dizia Rousseau, ainda o mais poderoso de todos os homens não será suficientemente poderoso, se não souber converter o seu poder em direito e a obediência dos outros em dever (le plus fort n'est jamais assez fort pour être toujours le maître s'il ne transforme sa force en droit et l'obéissance en devoir). Também Espinosa observa que a obediência não se refere tanto à acção externa quanto à acção anímica interna. Donde resulta que quem está mais submetido a outro, é quem decide com toda a sua alma obedecer- lhe em todos os seus preceitos; assim, quem tem a máxima autoridade, é quem reina sobre os corações dos súbditos.

Obediência e Reconhecimento.

Para Weber, se o poder enquanto Macht é a mera possibilidade de alguém impor a sua vontade a outrem, mesmo contra a vontade dele, já a segunda forma de poder, Herrschaft, implica a probabilidade de se encontrar obediência, que haja a presença efectiva de alguém mandando eficazmente em outros. Se no Macht o comando não é necessariamente legítimo, nem a submissão é obrigatóriamente um dever, já no Herrschaft, a obediência fundamenta-se no reconhecimento, pelos que obedecem, das ordens que lhe são dadas, isto é, tem de haver consentimento.

Obediência e resistência

Alain salientava que o cerne da política estava na relação entre a resistência e a obediência: o cidadão pela obediência assegura a ordem; pela resitência assegura a liberdade, dois termos que não seriam opostos, mas sim correlativos, porque não há liberdade sem ordem e a ordem de nada vale sem liberdade, pelo que haveria que obedecer resistindo, porque um homem livre contra um tirano, tal é a célula da política, isto é, obedecer em corpo; jamais obedecer em espírito; ceder absolutamente e, ao mesmo tempo, resistir absolutamente.

Obedecer a si mesmo (Rousseau).

O fim do contrato social. Aquela forma de associação pela qual cada um, unindo-se a todos, não obedece senão e si mesmo e continua tão livre como antes. É que importava encontrar uma forma de associação pela qual cada um, unindo-se a todos, não obedeça todavia senão a si mesmo e continue tão livre como dantes . Onde cada indivíduo, contratante, por assim dizer, consigo mesmo, encontra-se comprometido numa dupla relação, isto é, como membro do soberano em relação aos particulares e como membro do Estado em relação ao soberano. Assim, os associados tomam colectivamente o nome de povo, e chamam-se em particular cidadãos, quando participantes da autoridade soberana e súbditos quando submetidos à lei do Estado.

Retirado de Respublica, JAM

Mito

Porque o homem que está sempre mergulhado no desconhecido, o mistério envolve-nos de tal maneira que mesmo antes de se fazer ciência, é preciso crer na ciência, como assinala Jean Lacroix, contrariamente ao progressismo racionalista que apenas aceita um tempo linear, que quase sempre nos leva ao vazio. Com efeito, o mistério dá profundidade ao tempo, ao introduzir-lhe uma dimensão vertical, dando-lhe sentido, permitindo e permitindo tanto a revelação como o desvelamento. É assim que Fernando Pessoa refere que as nações todas são mistérios. Aliás, segundo Mircea Eliade, o mito conta uma história sagrada, referindo um acontecimento que teve lugar num tempo primordial, no começo, assumindo-se como um relato da criação. É uma alegoria ou uma fábula, que explica uma determinada ordem, alimentando, desta forma, o imaginário social. Para George Sorel, o mito como poesia social, é o conjunto das representações mobilizadoras de um grupo, enquanto Bronislaw Malinowski o considera como um instrumento de explicação e de justificação de uma situação de superioridade. Como justamente observa Paul Ricoeur, toda a razão tem um horizonte sobredeterminado pela crença, havendo um ponto, onde o racional comunica com o mítico, donde deriva toda uma constituição simbólica do laço social. Com efeito, toda a ética que se dirige à vontade para a lançar no agir deve ser subordinada a uma poética que abre novas dimensões à nossa imaginação. Eric Voegelin assinala também que a sociedade é iluminada por um complexo simbolismo, com vários graus de compactação e diferenciação - desde o rito, passando pelo mito, até à teoria - e esse simbolismo a ilumina com um significado na medida em que os símbolos tornam transparentes ao mistério da existência humana a estrutura interna desse pequeno mundo, as relações entre os seus membros e grupos de membros, assim como a sua existência como um todo. A auto-iluminação da sociedade através dos símbolos é parte integrante da realidade social, e pode mesmo dizer-se que é uma parte essencial dela, porque através dessa simbolização os membros da sociedade a vivenciam como algo mais que um acidente ou uma convivência; vivenciam-na como pertencendo a sua essência humana. Finalmente, Edgar Morin vem considerar que não podemos fugir ao mito, mas podemos reconhecer a sua natureza de mitos e relacionar-nos com eles, simultaneamente por dentro e por fora. Porque o problema consiste em reconhecer nos mitos a “sua” realidade e não a realidade. Em reconhecer a “sua” verdade e não em reconhecer neles a verdade. em não introduzir neles o absoluto. Em ver o poder de ilusão que segregam constantemente e que pode ocultar a “sua” verdade. Devemos demitificar o mito, mas não fazer da demitificação um mito.
Posted by JAM

Mercado político

A aplicação da ideia de mercado político foi feita principalmente pelos cultores da rational choice, na linha do utilitarismo e do individualismo metodológico. Já Max Weber refere que o mercado político se caracteriza pelo confronto de empresas políticas, consideradas como empressas de interesses. Assim, Jean-Jacques Rosa proclama que o mercado político é um lugar onde se trocam votos contra promessas de intervenções públicas.
O político é visto como um espaço de confronto entre a oferta e a procura, base do entendimento da relação entre governantes e governados. Estes assumem-se como consumidores ou clientes de governantes entendidos como gestores de empresas que tem como objectivo a maximização da capacidade de resposta face à s exigências dos governados. No caso concreto do mercado eleitoral hà ofertas públicas de programas de partidos e procura dos eleitores, desvalorizando-se o papel dos valores e da fidelidade partidária, aceitando-se a ideia de um eleitor individualista e racional. Os políticos entram em concorrência agindo segundo uma lógica racional equivalente à dos empresários económicos.
Posted by JAM

Maquiavelismo

Utilizando as categorias weberianas, diremos que Maquiavel adopta a moral de responsabilidade em vez da moral de convicção. Adopta aquela moral onde os fins justificam os meios, onde se admite que o homem pode perder a alma para salvar a cidade: se se trata de deliberar sobre a sua salvação (da pátria), ele (o cidadão) não deve ser paralisado por qualquer consideração de justiça ou injustiça, de humanidade ou de crueldade, de ignomínia ou de glória. Porque para se alcançar o fim do salute della patria, non vi debbe cadere alcuna considerazione nè di giusto nè di ingiusto, nè di pietoso, nè di crudele, nè di laudabile, nè de ignominioso, é preciso defender a pátria gloriosamente ou não, todos os meios são bons desde que ela seja defendida. Assim, não pode, portanto, um senhor prudente, nem deve, observar a fé jurada, quando tal observância redunde em seu prejuízo, e quando tenham desaparecido as razões que fizeram que a jurasse. É que se os homens fossem todos bons, este preceito não seria bom, mas porque são maus e não respeitarão para com o príncipe a palavra dada, não tem o príncipe que a respeitar para com eles.
Segundo Hannah Arendt, a questão, tal como Maquiavel a viu, não era se amava mais Deus do que o mundo, mas se seria capaz de amar mais o mundo do que a si próprio. E, de facto, esta decisão foi sempre crucial para todos os que dedicaram a sua vida à política.
A maior parte dos argumentos de Maquiavel contra a religião são dirigidos contra os que se amam a si mesmos, ou seja, a própria salvação mais do que o mundo; não são dirigidos contra os que realmente amam a Deus mais do que amam, quer o mundo, quer a si próprios.
Utilizando agora palavras de Cabral de Moncada, diremos que ele apenas veio dizer alto aquilo que todos, ou antes, muitos, particularmente os príncipes, diziam já em voz baixa, e, mais do que tudo, praticavam. Basta recordar estas palavras do florentino: há dois géneros de combate: um que se serve das leis, outro que se serve da força: o primeiro é próprio do homem, o segundo dos irracionais: mas porque o primeiro muitas vezes não basta, convém recorrer ao segundo. A um príncipe é necessário, portanto, saber usar ou o animal ou o homem que estão dentro dele (... ) Estando, então, um príncipe necessitado de saber usar bem o animal, deve eleger como tal a raposa e o leão; porque o leão não se defende das armadilhas e a raposa não se defende dos lobos. Necessita, pois, de ser raposa para conhecer as armadilhas, e leão para amedrontar os lobos.
Segundo Jacques Maritain, o resultado prático do ensino de Maquiavel foi, para a consciência moderna, uma cisão profunda, uma irremediável separação entre a política e a moral, e, por conseguinte, uma ilusória, mas mortal, antinomia, entre aquilo a que chamamos idealismo (confundido erradamente com a moral) e aquilo a que chamam realismo (confundido erradamente com a política). Continua e continuará, entretanto, a eterna dúvida de sabermos se, em política, os estados de violência não poderão ser tão ou mais violentos que os próprios actos de violência. O mesmo Maritain tentou responder, salientando que uma política não maquiavélica é obrigada a não cometer o mal. Não é obrigada a fazer reinar a virtude por toda a parte(... ) Não é falta moral aceitar serviços duma mão suja quando esse é o único meio de assegurar o êxito duma empresa tão arriscada como uma campanha militar, porque a política é arte de escolher entre grandes inconvenientes.
Posted by JAM