Discursos à nação alemã
(Reden an die deutschen Nation). Série de catorze conferências proferidas por Fichte em 1807-1808, na Academia de Berlim, na ressaca da invasão napoleónica, depois da derrota de Jena, onde se defende a existência de um eu nacional germânico baseado no chão, na unidade da língua e na identidade da raça. Primeiro, considera que a superioridade do povo alemão está no seu enraizamento territorial, no facto dos primeiros alemães terem ficado no habitat natural dos seus antepassados. Em segundo lugar, a língua que não recorreu a estrangeirismos, uma língua viva que tem a força das fontes originárias. Em terceiro lugar a raça enquanto cultura, uma cultura de liberdade que permite aos alemães o acesso ao supra-sensível. Predestinação. Retoma a tese de Lutero sobre a predestinação do povo alemão, concluindo pela necessidade do estabelecimento de um Estado forte. Aí especula sobre o germanismo (Deutschtum) ou germanidade (Deutschheit). Urvolk considerando que o povo alemão é o povo original ou o povo primitivo (Urvolk), entendido como um povo puro, livre de toda a contaminação histórica, uma individualidade que, em vez de derivar da universalidade, seria, pelo contrário, a originadora da universalidade. Os outros povos da terra é que seriam os idólatras, corrompidos, degenerados. Só nós somos o Povo vivo. Nós somos o Povo primitivo, o verdadeiro Povo de Deus. O povo alemão seria pois um postulado eterno da Razão, um princípio metafísico, um povo absoluto, o que existe em si, o povo simplesmente (das Volk schlechtweg) . Saliente-se que Fichte começara por um estrito individualismo kantiano, marcado por uma espécie de panteísmo do eu, considerando, nessa primeira fase, que o espírito era o criador de todas as coisas, incluindo as próprias regras disciplinadoras do espírito, ao mesmo tempo que saudava entusiasticamente a Revolução Francesa. É o chauvinismo da pós-revolução napoleónica, sobretudo o objectivismo da ocupação dos territórios alemães pelos herdeiros da bandeira tricolor da liberté, égalité et liberté, que o obriga a passar desse panteísmo do eu individual para uma deificação do eu colectivo, como ele qualifica a nação. A partir de então proclama que o espírito concebe a vida terrestre como uma vida eterna e a pátria como a representação terrestre dessa eternidade. Reconhece, no entanto, que, apesar de haver um espírito alemão, ainda não existe uma nação alemã, pelo que os alemães devem começar por se fazerem a eles próprios conscientemente . Que construir a nação alemã é o dever do espírito alemão para com a humanidade, dado haver um destino histórico e que tudo se conseguirá pela educação nacional, um caminho pela convicção moral, por dentro, e não pelo poder material, de fora . Assim, conclui que o povo absoluto deve bastar-se a si mesmo e não depender dos outros, exigindo tanto um Estado comercial fechado, como um Estado entendido como uma instituição jurídica, aquela que deve alcançar o fim inferior (v. g. a legalidade) através do fim superior (v. g. a moralidade) e, portanto, converter-se numa instituição educativa. O que até nem impediria o surgimento de um Ditador que pela violência levasse o mundo a ser alemão, porque um povo metafisicamente predestinado tem o direito moral de se realizar por todos os meios da astúcia e da força.
Retirado de Respublica, JAM
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