segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

Caetano, Marcello José das Neves Alves (1906-1980)

Jurista e político. Um dos principais juspublicistas portugueses do século XX e chefe do governo de 1968 a 1974. Destaca-se como constitucionalista, administrativista e historiador do direito, fundando a Escola de Direito Público de Lisboa. Começa como funcionário do registo civil em Óbidos (1928-1929). Auditor jurídico do ministério das finanças (1929-1934). Doutorado em direito (1931). Comissãrio nacional da Mocidade Portuguesa (1940-1944). Ministro das colónias (1944-1947). Presidente da Comissão Executiva da União Nacional desde 1947. Opõe-se então à facção de Santos Costa. Presidente da Câmara Corporativa (1949-1955). No III Congresso da União Nacional, realizado em Coimbra, em Novembro de 1951, assume-se contra a tese que defendia a restauração da monarquia, sugerindo a candidatura de Salazar à presidência da república. Ministro da presidência (1955-1958). Reitor da Universidade de Lisboa (1959-1962). Nomeado presidente do conselho de ministros em 27 de Setembro de 1968, é derrubado em 25 de Abril de 1974.

Em 1931 doutora-se em Ciências Político-Económicas, assumindo a regência da cadeira de Direito Constitucional no ano lectivo de 1951-1952, por doença do anterior titular, Domingos Fezas Vital. Abandona então a regência da cadeira de Administração e Direito Colonial, para a qual foi contratado Joaquim da Silva Cunha, já professor da Escola Superior Colonial, onde deixou uma vaga que será ocupada por Adriano Moreira.
Ideólogo do Corporativismo
Caetano que, como ideólogo do regime, já editara O Sistema Corporativo em 1938, e Problemas da Revolução Corporativa em 1941, publicará, a partir desta experiência docente,
Política Ultramarina
Em Os Nativos na Economia Africana, Lisboa, 1954, influenciado pelo apartheid sul-africano, considera que os negros em África devem ser olhados como elementos produtores enquadrados ou a enquadrar numa economia dirigida por brancos... os africanos não souberam vaorizar sozinhos os territórios que habitam há milénios, não se lhes deve nenhuma invenção útil, nenhuma descoberta técnica aproveitável, nenhuma conquista que conte na evolução da Humanidade, nada que se pareça ao esforço desenvolvido nos domínios da Cultura e da Técnica pelos europeus ou mesmo pelos asiáticos.
Conceito de Estado
-Elementos do Estado, 75, 501 CAETANO, Marcello
-Estado (povo, território, poder político), 75, 504 CAETANO, Marcello
-Poder, 55, 352
-Corporativismo, 135, 942 Marcello Caetano (1906-1980) que, Marcello Caetano, é constituída por um povo fixado num território, de que é senhor, e que, dentro das fronteiras desse território, institui, por autoridade própria, órgãos que elaborem as leis necessárias à vida colectiva e imponham a respectiva execução.
Tal unidade a que se dá o nome de Estado e que, em português, tem direito a maiúscula , segundo aquelas escolas de direito público dominantes que marcaram o subsolo filosófico da nossa Constituição, é susceptível de ser decomposta, quase mecanicamente, em três elementos: o povo, o território e o poder político sendo-lhe atribuídos outros tantos fins a segurança, a justiça e o bem-estar social.
Conceito de Poder Político
"o poder político é uma autoridade de domínio, isto é, que impõe a obediência a quantos pertençam à sociedade política, constrangendo‑os à observância das normas jurídicas e quebrando resistências eventuais", dado que a função do poder político é a de "subordinar os interesses particulares ao interesse geral segundo os princípios racionais de justiça, traduzidos por um direito comum a todas as sociedades primárias englobadas na sociedade política". (
se o poder em geral é entendido como "a possibilidade de eficazmente impor aos outros o respeito da própria conduta ou de traçar a conduta alheia", existiria um poder de facto, exclusivamente assente ne força, e um poder legítimo que "resulta do reconhecimento por aqueles a quem a vontade do sujeito se dirige de que ele actua de acordo com uma lei digna do acatamento geral".
Fazia uma distinção entre o Estado "na acepção lata", que, dotado de soberania, constituiria uma "pessoa colectiva de direito internacional", e o Estado "na acepção restrita", que constituiria uma "pessoa colectiva de direito público interno", um Estado Administração que "não é soberano ‑ titular de um poder superlativo, incondicionado e independente", gozando apenas "de uma autoridade derivada da soberania ‑ a autoridade pública ‑, regulada pela manifestação do poder soberano que é a lei". Um Estado Administração que é "o que resta da organização politico‑administrativa depois de criadas ou reconhecidas por lei as pessoas colectivas de direito público cuja existência o legislador repute necessária à boa gestão dos interesses gerais".
Retirado de Respublica, JAM

Cádis, Revolução de

A revolução liberal espanhola de 1812 que deu origem a uma Constituição que inspirou a portuguesa de 1822.
Retirado de Respublica, JAM
Constituição de Cádis
A Constituição de Cádis, também conhecida por Constituição Espanhola de 1812 ou La Pepa, aprovada a 18 de Março de 1812 pelas Cortes Gerais Extraordinárias reunidas na cidade de Cádis, e promulgada no dia imediato, foi o primeiro documento constitucional aprovado na Península Ibérica e um dos primeiros no Mundo, sendo, no sentido moderno, apenas precedida pela Constituição Corsa de 1755 (a primeira constituição verdadeiramente democrática), pela Constituição dos Estados Unidos da América (1767) e pela Constituição Francesa de 1791. Oficialmente, a Constituição de Cádis esteve em vigor dois anos, desde o dia sua promulgação, 19 de Março de 1812, dia de São José, daí o cognome de La Pepa que lhe deu o povo andaluz, até 24 de Março de 1814, dia em que foi revogada com o regresso a Espanha do rei Fernando VII. Embora efemeramente, foi restaurada por duas vezes: de 1820 a 1823, durante o chamado Triénio Liberal; e em 1836 - 1837, como norma constitucional transitória durante a elaboração da Constituição Espanhola de 1837. Apesar desta curta vigência, o seu texto exerceu profunda influência no desenvolvimento do constitucionalismo espanhol, português e latino-americano, tendo as suas instruções eleitorais sido adoptadas, na sequência da Martinhada, para a realização das eleições para as Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, realizadas em Dezembro de 1820, e servido de inspiração na elaboração da resultante Constituição Política da Monarquia Portuguesa de 1822.
Origens e enquadramento sócio-político
A Constituição de Cádis nasceu na sequência das profundas mudanças sociais desencadeadas na Europa pela expansão do iluminismo, pela Revolução Francesa e pelo período de grande instabilidade sócio-política que se lhe seguiu, e que alastrou por todo o continente tendo como catalisador imediato as Guerras Napoleónicas. Neste contexto, teve particular importância o surgimento da chamada Constituição de Baiona, uma carta constitucional imposta por Napoleão Bonaparte aos representantes espanhóis chamados em 1808 à cidade francesa de Baiona.
Em consequência da Carga dos Mamelucos, um levantamento do povo de Madrid contra os franceses ocorrido a 2 de Maio de 1808 (imortalizado por Francisco Goya na sua obra El 2 de Mayo de 1808 en Madrid), surgiu em numerosas localidades um fenómeno espontâneo de resistência que se agrupou em torno das chamadas Juntas. Estas compreenderam que com a sua união numa estrutura nacional única obteriam maior eficácia, pelo que a 25 de Setembro do mesmo ano foi constituída a Junta Suprema Central Governativa, com sede primeiro em Aranjuez e depois em Sevilha. As suas funções principais eram dirigir a guerra contra a ocupação francesa e preparar a posterior reconstrução do Estado.
No que respeitava à reconstrução do Estado, colocavam-se duas possibilidades distintas sobre o futuro político espanhol: a primeira delas, representada fundamentalmente por Gaspar Melchor de Jovellanos, consistia na restauração das normas prévias da monarquia absoluta e o retorno à situação anterior à intervenção francesa; a segunda, de cariz liberal, implicava a promulgação de uma Constituição para o Estado espanhol e uma modernização global das suas estruturas, de acordo com os preceitos liberais implícitos nas ideias iluministas e racionalistas. Foi esta última a opção que teve vencimento, convocando-se para tal Cortes Generales y Extraordinarias com poderes constituintes.
O estado de guerra que então se vivia na Península Ibérica, consequência da Guerra Peninsular que então estava no seu auge, levou a que as Cortes tivessem de procurar refúgio fora da cidade de Madrid, então controlada por forças francesas. Em resultado, as Cortes reuniram em Sevilha, ao tempo uma das poucas cidades que não estavam sob ocupação militar estrangeira. Durante o curso dos seus trabalhos, as Cortes foram forçadas a procurar refúgio em San Fernando, localidade então conhecida por Isla de León, já que uma epidemia de febre amarela tornava pouco segura a realização de reuniões em Sevilha.
As Cortes, cuja primeira reunião ocorreu a 24 de Setembro de 1810 no edifício actualmente conhecido por Teatro de las Cortes, tinham a seguinte composição sócio-profissional:
90 eclesiásticos
56 juristas
30 militares
14 nobres
15 catedráticos
49 altos funcionários
8 comerciantes
20 sem profissão definida.
Perante o avançar das forças francesa, os trabalhos das Cortes voltaram a deslocar-se para Cádis, tendo a Constituição sido promulgada no Oratório de San Felipe Neri daquela cidade no dia 19 de Março de 1812, dia de São José. Aquela coincidência de datas levou a que a Constituição de recebesse a alcunha de La Pepa, o diminutivo carinhoso de Josefa, alcunha que durante muitos anos foi utilizada como grito revolucionário pelos seus apoiantes.
As Cortes ratificaram quase de imediato os princípios fundamentais pelos quais se guiaria a elaboração da Constituição: a soberania popular, afirmando que a soberania reside no povo e não no rei; a legitimidade dinástica de Fernando VII de Espanha como chefe de Estado; a separação de poderes, com a independência e inamovibilidade dos juízes; e a inviolabilidade dos deputados no exercício do seu mandato. O trabalho das Cortes foi árduo e rápido, aprovando um texto constitucional de grande complexidade (são 384 artigos, uma das mais longas Constituições de sempre), num período muito curto.
A Constituição de Cádis não foi um acto revolucionário, nem mesmo uma ruptura com o passado. Desde la legalidade do momento, determinando cuidadosamente quem eram os legítimos representantes do povo, tudo foi objecto de discussão e acordo. Começaram os actos do dia da abertura com procissão cívica, missa e uma exortação, proferida pelo Presidente da Regência, o bispo de Orense, aos deputados reunidos para que cumprissem fiel e eficientemente as suas obrigações.
Quando Fernando VII foi restaurado no trono, em Março de 1814, em consequência da derrota francesa na Guerra Peninsular, foi obrigado a jurar que respeitaria a Constituição. Contudo, encorajado pelas forças conservadoras que dominavam a sociedade espanhola, com destaque para a hierarquia da Igreja católica Romana, a 4 de Maio repudiou formalmente a Constituição de Cádis e a 10 de Maio mandou prender os líderes liberais, justificando a sua acção com a alegação de que as Cortes tinham reunido na sua ausência e sem a sua autorização. Com estes actos pões termo à incipiente vigência da Constituição e restabeleceu a doutrina de que a autoridade soberana era uma prerrogativa pessoal do rei, não requerendo legitimação popular.
Retirado da Wikipédia

Cacique

Nome dado a um antigo chefe dos índios da ilha de S. Domingos e que logo se estendeu a toda a América espanhola, abrangendo as autoridades indígenas reconhecidas pela administração colonial. Estendeu-se a designação em Espanha, durante o século XIX às oligarquias extra-legais que exerciam em Portugal as funções dos agentes eleitorais, dos influentes e dos notáveis locais. Expressão pejorativa que substituiu em Portugal a palavra influente, equivalente ao coronel no Brasil e ao boss anglo-saxónico. Oliveira Martins considera que cacique ou influente, em Espanha e em Portugal, é quem todo lo manda numa determinada zona do terreno, numa freguesia, num concelho, num distrito

Robert Kern (ed. ), The Caciques. Oligarchical Politics and the System of Caciques in the Luso-Hispanic World, Albuquerque, University of New Mexico Press, 1973.
Retirado de Respublica, JAM

Cachemira

Região situada entre a Índia e o Paquistão. De maioria muçulmana, mas governada por hindus. Guerra em 1948-1949, com a União Indiana a ocupar dois terços do território. Nova guerra em 1965-1966.
Retirado de Respublica, JAM

Cabral, Amílcar Lopes (1924-1973)

Um dos pais fundadores do independentismo da Guiné-Bissau e de Cabo Verde. Mestiço de pai cabo-verdiano e mãe guinenese. Engenheiro agrónomo por Lisboa, desde 22 de Fevereiro de 1952, sendo colega de Sousa Veloso e de Mário Barreira da Ponte. Em Setembro seguinte já exerce funções técnicas públicas na Guiné. Afastado do território em 1955, vem para Lisboa até 1959, data em que regressa à terra clandestinamente. Aproveita as circunstâncias que rodearam o chamado massacre do Pidjiguiti em 3 de Agosto de 1959. A partir de 1960 instala-se em Conakry. Fundador do PAIGC em Outubro de 1960, juntamente com Aristides Pereira, Luís Cabral, Júlio de Almeida, Fernando Fortes e Eliseu Turpin. Desencadeia a luta armada no Sul da Guiné em 23 de Janeiro de 1963. Assume uma importante imagem internacional, principalmente depois da chamada batalha do Como, de 1964, participando na Conferência Tricontinental de Havana (1966). A chegada de Spínola em 1968, altera as circunstâncias da guerra e o PAIGC é comprimido tanto no terreno como no campo político e psicológico. Amílcar volta a actuar no palco internacional. Em 1970 é recebido nos Estados Unidos da América, tanto na Universidade de Siracusa, a propósito de uma homenagem a Eduardo Mondlane, como pela própria comissão dos negócios estrangeiros do Congresso. Em Junho deste mesmo ano chega a ter uma audiência com o Papa Paulo VI, juntamente com Marcelino dos Santos da FRELIMO e Agostinho Neto do MPLA, não faltando uma visita triunfal à URSS.. Assassinado em 20 de Janeiro de 1973. Esteve para o marxismo-leninismo anticolonialista como Léopold Senghor esteve para o ocidentalismo. O respectivo conceito de nação é de clara marca estalinista.
Retirado de Respublica, JAM

Cabeçadas, Governo de (1926)

Em 28 de Maio de 1926 as instituições republicanas foram derrubadas por uma sedição militar, iniciada em Braga por Gomes da Costa e coordenada em Lisboa por Mendes Cabeçadas, antigo revolucionário da Rotunda, ligado à União Liberal Republicana. A Junta revolucionária de Lisboa era constituída, entre outros, por Cabeçadas, Gama Ochoa, Jaime Baptista e Carlos Vilhena, tendo o apoio do comandante da polícia, Ferreira do Amaral, que logo em 30 de Maio foi nomeado governador civil. Uma revolução quase à procura de autor que recebeu inicialmente apoio de variadas facções, de anarco-sindicalistas a católicos, passando por seareiros, integralistas, republicanos conservadores e monárquicos, mas cujos líderes foram sucessivamente devorados (primeiros Cabeçadas e depois Gomes da Costa), até se atingir a estabilidade com Carmona, apoiado pelo Ministro das Finanças, Oliveira Salazar que, pouco a pouco, emergiu como verdadeiro líder da nova situação. Com efeito, Gomes da Costa, Cabeçadas e Carmona foram as três principais figuras de um puzzle sediciosos que, durante três meses, personificou um movimento que, sem autor, procurou um chefe.
Em 30 de Maio de 1926:
Cabeçadas, o Presidente começa por assumir todas as pastas, mas nesse mesmo dia logo é instituído um triunvirato;
· Cabeçadas na presidência, marinha e justiça.
· Gomes da Costa na guerra, colónias e agricultura.
· Gama Ochoa no interior, estrangeiros e instrução.

Em 3 de Junho de 1926:
· Cabeçadas na presidência e interior.
· Oliveira Salazar nas finaças.
· Manuel Rodrigues na justiça.
· Gomes da Costa na guerra e colónias.
· Jaime Afreixo na marinha.
· Carmona nos estrangeiros.
· Mendes dos Remédios na instrução.
· Ezequiel de Campos na agricultura e no comércio.
Retirado de Respublica, JAM

Cabeçadas Júnior, José Mendes (1883-1965)

Oficial da Armada. Maçon. Revolucionário do 5 de Outubro de 1910, enquanto comandante do navio Adamastor que bombardeia o Palácio das Necessidades. Deputado em 1911 e 1915. Sucessivamente unionista e liberal, tambem participa com Cunha Leal na União Liberal Republicana, uma dissidência dos nacionalistas, surgida nos começos de 1928. Lidera a revolta de Julho de 1925. Presidente da junta revolucionária de Lisboa do 28 de Maio, tem como colaborador o tenente Carlos Vilhena. Inspira o golpe da Melahada, de 10 de Outubro de 1946 Organizador da conjura da abrilada contra o salazarismo em 1947. Apoia a candidatura de Quintão Meireles em 1949. Salienta, então, que a supressão de direitos ou liberdades gerou o mal estar e o temos. Hoje não há direitos, nada se obtém que não seja por favor. Observa que o 28 de Maio foi prevertido por um técnico de finanças que gerou uma política de ódio e que se criaram instituições que dividem os portugueses. Ainda subscreve em 1961 o Programa para a Democratização da República.
Retirado de Respublica, JAM

Neocorporativismo

O neocorporativism como sistema de representação de interesses oposto ao pluralismo, marcado pelo monopólio da representação atribuído pelo centro. Teses de Leo Panitch e Philippe Schmitter. Surge nos Estados Unidos entre autores preocupados com a crise da representação política e a do sindicalismo. Cawson 1985 Schmitter 79.
Retirado de Respublica, JAM

Corrupção

Do lat. corruptio, acção de romper pelo meio, de rasgar em partes iguais, de ir ao centro da coisa e desintegrá-la. De corrumpere, tornar podre, decompor. A c. começa sempre pelo centro e visa a destruição total do ser. Diz-se de todo o processo de compra do poder, onde o comprador deseja obter parcelas do poder. Trata-se efectivamente de um roubo de poder. Como se assinalava na nossa Arte de Furtar: os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais já com manha, já com força, roubam e despojam os povos. Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos: os outros furtam debaixo do seu risco, este sem temor nem perigo; os outros, se furtam, são enforcados, estes furtam e enforcam. Para Lord Acton "o poder tende a corromper e ´o poder absoluto corrompe absolutamente". O mesmo pessimismo leva-o a dizer que se devia "desconfiar do poder mais do que do vício" e que "a História não é uma teia trançada por mãos inocentes. Entre todas as causas que degradam e desmoralizam os homens, o poder é a mais constante e a mais activa".
  • Della Porta, Donatella, Démocratie et Corruption en Europe, Paris, Éditions La Découverte, 1995.
  • Heidenheimer, A. J., Johnston, M., Levine, V. J., Political Corruption. A Handbook, Nova York, Transaction Books, 1989.
  • Holmes, Leslie, The End of Communist Power. Anti-Corruption Campaigns and Legitimation Crisis, Oxford, Oxford University Press, 1993.
  • Mény, Yves, La Corruption de la République, Paris, Librairie Arthème Fayard, 1992. 4 Rocca, Jean-Louis, La Corruption, Paris, Éditions Syros, 1993.
  • Scott, James C., Comparative Political Corruption, Englewood Cliffs, Prentice-Hall, 1972.
Retirado de Respublica, JAM

Corpos intermédios

Hauriou se considera o Estado como "un sommet d'ou l'on ne peut que redescendre", salienta, na senda de Montesquieu, a existência de corpos intermédios, como instituições situadas entre o indivíduo e o Estado. Esta tese, de remota origem consensualista, coincide com as perspectivas do pluralismo anglo-saxónico, expresso pelo guildismo, sendo claramente adversária do verticalismo absolutista e do centralismo. Inspira também o corporativismo associativo, mas acabou por ser instrumentalizada pelas experiências políticas do corporativismo de Estado que transformaram os corpos intermédios em meras delegações do poder central, sem autonomia originária, como meros elementos estruturais de uma nação estadualizada num politicamente organizado que não respeitou o princípio da subsidiariedade e manteve a herança do concentracionarismo absolutista, sem qualquer autenticidade descentralizadora ou o mínimo de respeito pela autonomia da chamada sociedade civil.
Retirado de Respublica, JAM

Corporativismo de Estado

Analisando o modelo do corporativismo de Estado do salazarismo, Juan Linz aproxima-o do regime brasileiro instaurado em 1964. Assinala que nos dois modelos autoritários há uma delegação de certos atributos do Estado em corpos intermediários de natureza profissional, cultural ou educativa. Neste sentido, qualifica os dois como autoritários, distinguindo-os do totalitarismo, dado que admitem um pluralismo limitado, não têm identificação com uma ideologia e não procuram a mobilização de massas, preferindo-se a despolitização das mesmas.
Retirado de Respublica, JAM

Corporativismo

A expressão portuguesa corporativismo comporta uma pluralidade de significações, dado que a palavra é fixadora de variadas ideias e de contraditórios sentidos. A conotação semântica dominante faz ligar a palavra ao mais estrito dos significados da mesma, a doutrina oficial que adjectivava, na lei fundamental, o regime político da Constituição de 1933, aí dito república corporativa dado pretender assentar nos então chamados elementos estruturais da nação, isto é, da família, das autarquias locais e dos organismos corporativos. Um círculo semântico maior associa a palavra à ideia de ordem corporativa da sociedade, conforme foi vocabularmente defendida pela doutrina social da Igreja Católica, desde as encíclicas Rerum Novarum, de 1891, e Quadragesimo Anno, de 1931, ao próprio discurso do papa Pio XII. A terminologia foi, entretanto, abandonada e o actual discurso da doutrina social e política da Igreja Católica, mantendo os mesmos príncípios, nomeadamente o entendimento da sociedade como o conjunto de pessoas ligadas, de modo orgânico, por um princípio de unidade, que ultrapassa cada uma delas (in Catecismo da Igreja Católica, 1880), prefere invocar o princípio da subsidariedade, isto é, defender que nem o Estado nem qualquer sociedade mais abrangente devem substituir-se à iniciativa e à responsabilidade da pessoa e dos corpos intermédios (idem, 1894), e utilizar os nomes de comunitarismo e de solidariedade. Curiosamente, o princípio da subsidariedade também foi recuperado pelos textos fundamentais da União Europeia e, através de uma releitura tecnocrática, voltou a estar vigente em Portugal, agora para traduzir a ideia da relação da ordem comunitária com as ordens estaduais, regionais e locais, querendo significar que uma das ordens superiores não pode interferir na esfera de autonomia da, ou das, ordens inferiores, impondo uma devolução de poderes para baixo, bem como uma concepção funcional dos que se situam nas ordens que se encontram no vértice ou nas partes cimeiras desta estrutura escalonada. De forma ainda mais ampla, o corporativismo pode coincidir com uma concepção orgânica do Estado e da sociedade, abrangendo tanto os corporativismos de Estado, de cunho hierarquista, como os corporativismos de associação, de matriz consensualista e pluralista. Começando pelo sentido mais lato da expressão, podemos dizer que ela abarca todas as tentativas doutrinárias que tentaram ultrapassar a perspectiva jacobina, simultaneamente individualista e estatista, que apenas admitia um diálogo directo entre o cidadão e o centro do aparelho de poder, sem admissão de corpos intermediários, dotados de politicidade. Neste sentido alargado e aberto, o corporativismo aproxima-se das palavras corporatism da língua inglesa e corporatisme dos franceses, as quais podem ser traduzidas pelos neologismos corporacionismo ou corporatismo, abrangendo todas as perspectivas que, na senda da defesa dos corpos intermediários de Montesquieu, assumiram as concepções organicistas, consensualistas e pluralistas do político. Aí podem caber os teóricos do historicismo romântico, que tomaram partido por um conceito de povo orgânico, marcado por um espírito, por uma alma ou por uma consciência, elentos que vão marcar os nacionalismos; os variados positivismos defensores do organicismo naturalista e quase biologista, como Bluntschli (1808-1881), Zachariae (1769-1843), Sãchffle (1831-1904), Lorenz von Stein (1815-1890) e Ludwig Gumplowicz (1838-1909), bem como os nossos Joaquim Maria Rodrigues de Brito (1822-1873) e Manuel Emídio Garcia (1838-1904); os teóricos do organicismo psíquico como Otto von Gierke (1841-1913) que falam no Estado como unidade vital e nas comunidades sociais com uma natureza simultaneamente corpórea e espiritual; os defensores da antropogeografia e os primeiros teóricos da geopolítica, como Rudolf Kjellen (1864-1922); os defensores do evolucionismo organicista como Herbert Spencer (1820-1903); os que perspectivaram o Estado como cérebro social, como Émile Durkheim (1858-1917); e os próprios socialismos utópicos, nomeadamente os que fizeram ponte com o federalismo, como os das teses de Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865). Nestes termos, podemos dizer que, no plano do subsolo filosófico, o século XIX tentou preparar o século seguinte como o século do estruturalista ou institucionalista, para darmos sentido paralelo à desiganção de siècle du corporatisme, do romeno Manoïlesco, tão invocado pelos nossos corporativistas dos anos trinta. Entre nós, ganharam, contudo, relevo quatro correntes doutrinárias, duas de influência germanista, como o krausismo e o socialismo catedrático e duas de importação francesista, do solidarismo ao institucionalismo. Em primeiro lugar, importa destacar o krausismo, isto é, as vulgarizações do idealismo alemão consagrado por Krause (1781-1832), através das lições de direito natural do professor de Bruxelas Heinrich Ahrens (1807-1874), que, entre nós, recebe o impulso da criatividade de Vicente Ferrer Neto Paiva (1798-1886) e chega a António Costa Lobo(1840-1913). Foi, graças a este correctivo que o nosso demoliberalismo se regenerou e se nacionalizou, a partir de 1851, numa posição paralela às próprias teses do emigrado Silvestre Pinheiro Ferreira (1769-1846), influenciador de Proudhon e Blanc, mas que acabou por não ser profeta na sua própria terra. Neste sentido, um corporacionismo organicista marca toda a perspectiva portuguesa da segunda metade do século XIX, como transparece do Manual Político do Cidadão Portuguez de Trindade Coelho, de 1906. Em segundo lugar, a intuição de um intervencionismo estadual na questão social, face às experiências de Napoleão III e Bismarck, quando ficam delineados os esquemas do Estado-Providência, chega-nos através do chamado socialismo catedrático que, entre nós, teve como pioneiros Oliveira Martins (1845-1895) e José Frederico Laranjo (1846-1910). Os sinais dos tempos deste novo intervencionismo são entretanto reforçados pelas doutrinas francesas da École Social de Pierre-Guillaume le Play (1806-1883) que, através do Professor Marnoco e Sousa (1869-1916), vão influenciar directamente o assistente deste, António de Oliveira Salazar (1889-1970). Segue-se o influxo, também galicista, do solidarismo de Léon Bourgeois (1851-1925) e Émile Boutroux (1845-1921) que tanto marca as novas correntes do socialismo francês, como, pela perspectiva de Léon Duguit (1859-1928), influencia, nos anos vinte, o sindicalismo integral do nosso Fezas Vital (1888-1953). Este mesmo professor, um dos redactores do projecto da Constituição de 1933, é também um dos introdutores em Portugal das teorias institucionalistas de Maurice Hauriou (1856-1929) e Georges Renard (1867-1943) que, nos anos trinta, permitem uma actualização das teorias corporativistas, fazendo-as ligar ao próprio neotomismo. Curiosamente, não têm influências em Portugal as teses organicistas que marcam o renascimento do pluralismo liberal e socialista no mundo anglo-saxónico, como transparece das obras de F. W. Maitland (1850-1906), John Neville Figgis (n. 1866), H. Belloc (1870-1953), Arthur Fisher Bentley (1870-1957) e Harold Laski (1893-1950). Toda uma geração que, em nome de uma variedade de crenças, acabou por convergir num modelo consensualista e pluralista que se insurgiu contra o estatismo. Passando para o primeiro círculo semântico, pela concepção restrita, que faz ligar a expressão à imagem de poder do regime salazarista, diremos que tal corporativismo pretendia assumir-se como uma espécie de dupla terceira-via que tanto visava superar o capitalismo e o socialismo, como responder aos desafios dos totalitarismos fascista e comunista. Era esse o tom dos principais doutrinadores do regime, desde os discursos de António de Oliveira Salazar aos vários autores de lições de direito corporativo das universidades públicas, nos anos áureos do Estado Novo, entre os quais se destacaram os professores Marcello Caetano e Cunha Gonçalves - em 1935 -, Mário Figueiredo e Costa Leite - em 1936 -, Teixeira Ribeiro - em 1938 -, e Fezas Vital -em 1940. Neste ambiente sobressaem, aliás, duas teses de doutoramento em direito, a de Francisco Inácio Pereira dos Santos, em Lovaina, 1935, sobre o Estado Corporativo, e a de António Jorge da Motta Veiga, em Lisboa, 1941, sobre a economia corporativa e o problema dos preços. Como excepção à regra, destaque para a defesa do corporativismo fascista, por Castro Fernandes, em 1938. Acrescentaremos que a experiência portuguesa do construtivismo salazarista quando falava em corporativismo, dentro da contraditória genealogia das ideias a que poderia recorrer, escolheu sempre as influências da doutrina social da Igreja Católica e do socialismo catedrático. Na prática, as circunstâncias levaram a que a teoria fosse outra, gerando-se uma nebulosa ou um hibridismo que tanto recebeu inequívocas influências do corporativismo fascista de Mussolini nomeadamente nalgumas das palavras fundamentais da Constituição e do Estatuto do Trabalho Nacional, como acabou por pautar-se pelos modelos neutros de intervencionismo económico do Estado-Providência. Assim, principalmente por influência da economia de guerra, foi sendo adiado o lançamento dos chamados organismos corporativos e, contra o programa inicial, ganharam relevo os organismos de coordenação económica que, no pós-guerra, se adequaram à perspectiva portuguesa do planeamento, sendo paralelos aos modelos sócio-profisssionais, às organizações de produtores e às entidades mistas de regularização dos mercados da restante Europa ocidental. Contudo, o corporativismo salazarista, paralelo à experiência austríaca de Dolfuss, liquidada pelo nazismo, acabou por se transformar num corporativismo estatal, sem economia de mercado, mas com economia privada, aproximando-se do intervencionismo proposto pelo socialismo catedrático. Paradoxalmente, algumas das fundamentais contestações ao corporativismo salazarista vêm de correntes com idênticas origens. A contestação do socialismo cooperativista de António Sérgio (1883-1969) mergulha num associativismo guildista e numa ideia de autogoverno tão anticapitalista e tão não-individualista quanto as concepções sociais de Salazar. A contestação dos católicos critica o mesmo corporativismo por não ser suficiente corporativo. Disso é sintomática a carta dirigida em 13 de Julho de 1958 pelo Bispo do Porto, D. Antonio Ferreira Gomes, a Salazar, segundo a qual o corporativismo foi realmente um meio de expoliar os operários do direito natural de associação, de que o liberalismo os privara, e que tinham reconquistado penosa e sangrentamente. O mesmo Bispo do Porto, aceitando em Salazar a lucidez do raciocínio e o bem fundamentado das posições em matérias de política externa e de política ultramarina, criticava acerbamente o salazarismo social, observando, de forma incisiva, que a Igreja "comprometeu-se", não com o Estado corporativo, mas com a ordem corporativa da sociedade, citando Pio XII, para quem se cometeria uma injustiça, ao mesmo tempo que se perturbaria seriamente a ordem social, se fossem retirados aos agrupamentos de ordem inferior as funções que esses agrupamentos estariam em condições de exercer eles próprios. Com efeito, o corporativismo salazarista distanciou-se da vertente societária ou associativista que o corporativismo em sentido amplo exigia, pelo menos na vertente da doutrina social católica, como veio a ser particada pela economia social de mercado da geração democrata-cristã do pós-guerra, não podendo aproximar-se daquilo que estava em vigor nos regimes não-autoritários de Estado-Providência, essa forma que o neo-marxismo qualifica como Estado social-democrata e que outros referem como corporatismo liberal. Aliás, quando o regime da constituição de 1933 foi derrubado, emergiu um modelo socialista, de cariz colectivista, que manteve alguns dos instrumentos legislativos do intervencionismo salazarista, dado que, com ele coincidia, no plano do estatismo. As formas das nacionalizações e da própria criação de empresas públicas, tão utilizadas pelo gonçalvismo e pelo socialismo revolucionário, depois dos acontecimentos de 11 de Março de 1975, vinham, aliás, do antigo regime. Mesmo na fase pós-revolucionária do regime da Constituição de 1976, mantiveram-se e alargaram-se alguns dos elementos introduzidos pelo salazarismo, principalmente as pessoas colectivas públicas das ordens profissionais. Recentemente, alguns autores, como Schmitter, Wilensky e Panitch, falam num neocorporatism, logo traduzido, entre nós, por um equívoco neo-corporativismo que, pretendendo qualificar os esquemas gestionários do Welfare State, tanto na perspectiva liberal como na social-democrata, apela a uma espécie de restauracionismo do vocabulário salazarista, demonizado depois de 1974. Falam na emergência de novas formas de corporativismo, enquanto modos específicos de representação de interesses do actual modelo de organização do político das sociedades desenvolvidas, onde os actores sociais são organizados num número limitado de categorais funcionais, obrigatórias e, disciplinadas e organizadas, onde não funciona a concorrência, dado que são criadas, autorizadas, fomentadas ou apoiadas pelos governos, beneficiando de uma espécie de monopólio representativo, como acontece quando se atribui o estatuto de parceiro social a determinadas categorias de organizações sócio-profissionais ou se instituem as chamadas ordens, onde o carácter sindical ou patronal se mistura com atributos da soberania. Deste modo, se procura coordenar a vida social e económica, estabelecendo-se as regras do jogo e o próprio modelo de antagonismos dentro do status vigente. Neste sentido, o neo-corporatismo, tende a traduzir a ideia da existência nos actuais modelos práticos de organização política de formas mais amplas do que os meros grupos de interesse, esses novos corpos intermédios, entre a sociedade e o Estado que procuram responder à crise da representação política, do sindicalismo, do associativismo patronal e da própria cidadania. Mas, contrariamente ao pluralismo, onde as organizações são rivais e nascem da autonomia da sociedade civil, essas entidades híbridas resultam da protecção do centro do aparelho de poder estadual, cujos decretos e práticas escolhem as entidades ditas representativas, independentemente da autenticidade associativa das mesmas.
Retirado de Respublica, JAM
Ver, também, Biografias
Corporativismo
O corporativismo é um sistema político no qual o poder legislativo é atribuído a corporações que representam grupos económicos, industriais ou profissionais. É um sistema não-democrático, pois não é o povo, ou os seus representantes, quem detêm o poder. Assim sendo, propô-se a eliminar a luta de classes mediante um modelo de colaboração entre elas. Num suposto equilíbrio, os interesses conflitantes entre capital e trabalho seriam atenuados e direcionados positivamente pelo Estado - aqui visto como uma entidade neutra. O regime que vigorou em Portugal até à revolução de 25 de Abril de 1974 mostrava fortes aspectos corporativistas. Também no Brasil, entre os anos de 1937-45, o chamado Estado Novo, sob a liderança do presidente Getúlio Vargas apelava para um modelo corporativo de Estado, sendo sua legislação trabalhista claramente inspirada na "Carta del Lavoro" de Mussolini. A palavra "corporativismo" provém da palavra latina corpus, corpo.
Retirado da Wikipédia