quarta-feira, 25 de julho de 2007

Proletariado

Do latim proletarius, aquele indivíduo que, nos recenseamentos e cadastros, não tinha outra riqueza a declarar, a não ser os filhos, a prole. Passou a designar em Roma a população de nível social mais baixo.

Retirado de Respublica, JAM

Projectistas da paz

Na Idade Média, face aos conflitos entre o Império e o Papado e já depois da divisio regnorum, começaram a surgir teorias visando o restabelecimento da unidade dessa res publica fidelium, conforme a expressão de Roger Bacon. Surge então a primeira visualização de uma entidade integradora supra regna, onde, de um lado, estão aqueles que podemos qualificar como os projectistas da paz universal, herdeiros dos defensores da monarquia papal universal e antecessores dos chamados mundialistas, e do outro, os defensores do Império, da instauração de uma monarquia universal pelo imperador. Se os primeiros apenas advogam o recurso a meras instituições do antigo direito das gentes, utilizando o método clássico da arbitragem ou o recurso a associações de unidades políticas autónomas, destinadas a proibir o recurso à força, já os segundos apostam na criação de uma autoridade temporal superior às unidades políticas particulares.

O direito das gentes cristão

Os projectistas da paz são herdeiros da unificação promovida pela Igreja na res publica christiana, geradora de um direito das gentes cristão que, segundo Truyol Serra, introduziu três importantes novidades: primeiro, quando veio adoçar e limitar o direito de guerra, tanto pela difusão do ideal da cavalaria, como pelo estabelecimento de instituições como a paz de Deus a trégua de Deus que, ou impediam actos de guerra em certos dias, ou punham ao abrigo da guerra certos grupos da população; segundo, quando instituiu a arbitragem, uma instituição diversa da simples mediação, dado que o árbitro já tinha de cingir-se ao direito, enquanto o mediador podia actuar conforme a equidade, e fez do papado uma instância arbitral permanente; terceiro quando, promoveu a reunião de concílios, participados por eclesiásticos e leigos, que não se limitavam apenas à discussão de questões teológicas e que também promoviam arbitragens.

Utilizando uma linguagem actual, diremos que os primeiros apenas defendem um fenómenos de organização internacional, que apenas pode actuar inter-estadualmente, enquanto os segundos já advogam a integração internacional, de carácter transnacional. Entre os integracionistas, vários podem ser os modelos. Alguns advogam o método da hegemonia, considerando que todos os centros políticos particulares devem ceder perante um deles. Outros defendem deveria instaurar-se uma sociedade política mundial, um governo mundial, com ligação directa entre esse centro político e todos os homens. Um terceiro grupo, por seu lado, apenas sugere a criação de um directório ou uma aliança entre unidades políticas dominantes. Diremos, a este respeito, citando Claude Lévi-Strauss, que a noção de civilização mundial é paupérrima, esquemática, com um conteúdo intelectual e afectivo de escassa densidade. Aliás, até talvez não possa haver civilização mundial, uma vez que civilização implica a coexistência de culturas oferecendo cada uma delas o máximo de diversidade, e consiste mesmo nessa coexistência. A civilização mundial não pode ser outra coisa do que a coligação, à escala mundial, de culturas, preservando cada uma delas a sua originalidade, impondo-se. preservar a diversidade das culturas, num mundo ameaçado pela monotonia e pela uniformidade. Contudo, as várias civilizações nem por isso deixam de constituir, para utilizarmos a linguagem de Arnold Toynbee, um só mundo (One World), uma super-civilização, sem bárbaros nas fronteiras. Este mesmo autor falava em cinco civilizações: a ocidental-cristã, a cristã oriental, a islâmica, a indiana e a chinesa, referindo que todas elas ousaram transformar-se em Estado Universal. Segundo as respectivas teses, cada civilização seria produto de uma minoria criadora, que responderia a sucessivos reptos, desenvolvendo-se. Haveria contudo um momento de paragem, quando a minoria deixa de ser criadora e passa ao estádio de Igreja Universal, aquela que nasce da existência dos humilhados e ofendidos da conjuntura interna (o proletariado interno) para se unir aos bárbaros vindos do exterior (o proletariado externo) e uma posterior desintegração, já no momento da instituição do Estado Universal. Noutra perspectiva, e ainda com linguagem actual, diremos que se alguns preferem um novo centro marcado pelo unitarismo, outros defendem uma estrutura federal. Mas, entre os não unitaristas, se há teses federalistas propriamente ditas, que advogam o imediatismo de um novo contrato, eis que surgem também posições marcadas por aquilo que alguns qualificam como o federalismo funcionalista e gradualista que prevê a transferência para o novo centro de apenas algumas funções dos anteriores centros políticos. Numa posição terceirista, surgem também os que, na linha de Kant, advogam uma república universal, entendida como uma exigência ética, no sentido de levar cada Estado existente a comportar-se como se todos os Estados existentes, formassem um Estado Mundial, uma civitas humana, a fim de poderem limitar-se os poderes do Estado-Leviatã. É a posição assumida por Wilhelm Röpke que defende um plano global de luta contra o espírito de guerra, o nacionalismo, o maquiavelismo e a anarquia internacional, capaz de inverter o facto da soberania dos Estados tender para o absolutismo, por gerar a identificação da massa com a nação e com o Estado, marcado por um maquiavelismo que é não apenas uma má moral, mas também uma má política Utilizando a terminologia da escola funcionalista norte-americana, a integração internacional poderá ser definida como o processo através do qual os agentes políticos transferem para um novo centro político interesses, expectativas e lealdades, assentando em doutrinas e em instituições que têm como objectivo a aplicação de um direito universal acima das jurisdições nacionais, segundo as quais pode atribuir-se a uma entidade superior aos Estados um poder decisório que penetra na tradicional jurisdição interna dos Estados.

Retirado de Respublica, JAM

Progresso

Etimologicamente, um passo (gressus) para diante (pro). No século XVIII surge o progressismo, os progressos sucessivos do espírito humano, de Turgot, ou o progresso do espírito humano, de Condorcet.

Retirado de Respublica, JAM

Profissionais da Política

A lei de ferro da oligarquia. O revolucionário profissional. Outro campo de análise tem a ver com os políticos, com os amadores e os profissionais da política, entre activistas, simpatizantes, dirigentes, burocratas e eleitos, todo esse vasto território das chamadas classes políticas, onde também há jobs for the boys. Até porque a política, como actividade simbólica e discurso, como salienta Pierre Bourdieu, tende a ser um corpo de profissionais da política, definido como detentor do monopólio de facto da produção de discursos reconhecidos como políticos. Sobre a matéria, ver, para além das obras de Bourdieu, Gaxie [1973], Julliard [1977], Fournier [1987] e Offerlé [1987], bem como Pellicani [1976] sobre os revolucionários profissionais, Blondel [1991] sobre os ministros, Grelle [1987] sobre os profissionais dos grupos de pressão, e Grémion [1979] sobre os altos funcionários.

Retirado de Respublica, JAM

Profético, Método

O método profético da análise histórica é o que cultiva a Geschichte em vez da Historie, o que não entende a história como mera investigação científica e como simples interrogação objectiva, preferindo enfrentar a globalidade, sem excluir o mito e a consequente imaginação, entendendo a história como a pesquisa do sentido essencial de um determinado grupo de homens, chame-se-lhe missão ou objectivo permanente. Neste sentido, a poesia, como Geschichte, pode ser mais verdadeira do que a história, como Historie. Isto é, a palavra poética e o discurso retórico, defendendo que no princípio era o verbo e que o verbo se fez carne e sangue, podendo iluminar alguns daqueles sentidos que o discurso meramente lógico, apenas racionalmente assimilável, não consegue atingir, por tudo reduzir a enunciados cognoscitivos, a conjuntos de parcelas, encadeáveis e sistematizáveis, more geometrico. Onde o todo é a soma das parcelas e pode decompor-se pela análise e reconstruir-se pela síntese, dado que se supõem atingíveis as leis do funcionamento do todo através de uma série de experimentações laboratorialmente controláveis e academicamente explicáveis. Porque o homem tem de reconhecer nas respectivas comunidades históricas as mãos invisíveis ou os génios invisíveis da cidade que, quase secretamente, ordenam o respectivo simbolismo e podem subverter aquela ordem discursiva que pretende apenas actuar racionalmente. Porque o homem não é apenas razão e vontade, não é apenas um animal intelectivo ou voluntarístico, é também um animal simbólico, onde a imaginação constitui um dos elementos estruturantes da sociabilidade. No fundo, o culto da filosofia da história tenta cumprir o plano exposto pelo Padre António Vieira, para quem haveria que misturar o lume da profecia com o lume da razão, que seriam as duas fontes da verdade humana e divina. Isto é, procura desmistificar a história, mas não a desmitificando.

Retirado de Respublica, JAM

Profano

Etimologicamente, o que está diante (pro) de um templo ou espaço sagrado (fanum). Algo que não está no espaço do sagrado ou do religioso, o que faz parte do natural, da experiência comum, do quotidiano.

Retirado de Respublica, JAM

Proença, Raúl (1884-1941)

Raul Sangreman Proença. Jornalista. Diplomado pelo Instituto Superior do Comércio. Começa por ser almeidista. Líder do grupo da Biblioteca (foi nomeado em 1911 conservador da Biblioteca Nacional, cargo de que é exonerado em 1927). Participa na Renascença Portuguesa e colabora em A Águia (1910-1917). Um dos fundadores da Seara Nova em 16 de Outubro de 1921. Coordenador dos dois primeiros volumes do Guia de Portugal (1924 e 1927). Participa na revolta de Fevereiro de 1927. Exílio em França. Regressa em 1931. Tenta um republicanismo socialista, crítico do jacobinismo e das teses de Rousseau. Influenciado pelos modelos do radicalismo francês, principalmente por Julien Benda. Um dos primeiros críticos do modelo totalitário do fascismo italiano, utilizando a expressão tutilitarismo que tenta identificar com o nome português integralismo. Considera que o espírito de Rousseau está na base do bolchevismo e do fascismo. Em 1921, no 3º número da Seara Nova de 5 de Novembro, salienta que mais uma vez a mais perigosa das utopias levou este país à epilepsia da desordem. Na mesma revista fala-se numa revolução de gazua, considerando-se que só há uma maneira de tornar respeitada a vontade revolucionária: é fazer revoluções na opinião pública. Em 1925, durante o penúltimo governo da I República, em artigo publicado na Seara Nova, de 15 de Julho de 1925, observa: as câmaras são já como as antecâmaras das casas bancárias, e a política um meio de fazer fortuna. Quem entra na carreira começa por bramar contra a Finança, adere depois ao conservantismo, penitenciando-se das verduras da mocidade, e acaba por se introduzir na gerência dos bancos, como fruto da idade madura. Comentando as últimas eleições do regime, em 15 de Setembro de 1925: parece que o problema capital desta República é agora o aniquilamento absoluto dos pequenos agrupamentos partidários. É este o mot d’ordre olímpico dos bonzos eleitos no último congresso democrático.

Retirado de Respublica, JAM

Foto picada de Instituto Camões

Processo político

As fases do processo político: persuasão, autoridade, engodo e força. A autoridade. A ocupação de um lugar superior pelo autor do discurso. A ideologia, a propaganda, a manha e o controlo da informação. A força, visando a obediência pelo temor. O poder como rede de poderes e a governação como processo de ajustamento entre grupos. A governação como modo dinâmico de gerir crises. A política como um processo de negociaçãp e de troca.

Retirado de Respublica, JAM

Processo Histórico

Com Hegel somos transportados da civilização do ser para a civilização do devir naquilo que será qualificado como historicismo, essa valorização do aspecto puramente temporal da realidade no plano da história, uma atitude que vai considerar a tarefa da ciência como a contemplação do processo histórico, tudo tendendo a reduzir à filosofia da história, com a consequente fuga para a frente do evolucionismo e do progressismo. Deste modo, a história deixa de ser uma explicação e passa a ser uma explicitação, entendida como um processo histórico, onde, segundo as próprias palavras de Hegel, se dá uma marcha racional e necessária do espírito no mundo, onde cada povo, tal como cada indivíduo, passa por várias etapas de formação, permanecendo igual a si mesmo e tendo sempre em vista atingir o estado universal do seu génio. ÖHistoricismo.

Retirado de Respublica, JAM

Problema

Toda a questão que permite mais do que uma resposta. Na etimologia grega, problema é tudo aquilo que se opõe ou resiste à penetração da inteligência. O problemático é, segundo Aristóteles, diferente do assertório ("A é B") e do apodíctico ("A deve ser B"), dado que nesse tipo de proposição "A pode ser B". Gabriel Marcel distingue o problema, algo que pode ser objectivado, do mistério. A hermenêutica contemporânea veio estabelecer a diferença entre o pensamento sistemático e o pensamento problemático. Com efeito, o pensamento problemático opta pelo processo da conclusão dialéctica, admitindo a possibilidade do conhecimento a partir de simples opiniões, ao contrário dos procedimentos apodícticos, onde existe uma conclusão que se atinge, partindo de proposições primeiras ou verdadeiras, como acontece na filosofia. Para tanto, o primeiro modelo propõe a formulação clara dos problemas a resolver, a escolha de todos os argumentos a favor e contra.

Retirado de Respublica, JAM