segunda-feira, 30 de julho de 2007

Descartes, René (1596-1659)

Estuda com os jesuítas e forma-se pela Universidade de Poitiers. Antigo combatente da Guerra dos Trinta Anos, servindo os exércitos do duque de Nassau e do eleitor de Colónia, a partir de 1617. Radica-se nos Países Baixos a partir de 1629. Vai frequentemente a França. A partir de 1649 instala-se na Suécia, a convite da rainha Cristina. Autor do célebre Discours de la Méthode pour bien conduire sa raison et chercher la verité dans la science,editado pela primeira vez na Holanda em 1637, e que constitui o ponto de partida para os chamados "temps modernes". Vamos assistir, a partir de então, a uma série de de tentativas destinadas a levar a filosofia a desempenhar o mesmo papel e a mesma função cultural que,na Idade Média, cabiam à fé e à teologia.Começa, então, a caminhar‑se para uma espécie de "morte de Deus" ou de "desdivinização do mundo", visando tentar‑se a ocupação da cúpula da humanidade, esse vértice integrador do próprio conhecimento.Só que , depois dessa "morte" , talvez tenha sucedido um infinito vazio que,desde então,temos tentado preencher frustradamente.Sozinhos ,diante nós mesmos, ensimesmados,eis‑nos presos nas teias de uma solidão cósmica,que a razão, em si mesma, não consegue compensar nem preencher.Com efeito,como observa Darlu,"sempre que reflectimos sobre as coisas, o nosso pensamento tem o seu centro na nossa consciência individual (é o cogito cartesiano),o nosso humilde pensamento toma a medida do mundo;a nossa pequena vontade acrescenta o ser à realidade onde está inserida.Não somos senão um fio na tela imensa que se balança ao vento e, contudo, sentimos o movimento do conjunto e sabemos afrouxá‑lo ou acelerá‑lo". Também Jacques Maritain considera que "a revolução que começa com Descartes e continua com os filósofos dos séculos XVIII e XIX,e que não fez mais do que libertar as forças destruidoras sempre em actividade na mente dos filhos de Adão,é um cataclismo histórico infinitamente maior que as mais terríveis perturbações da crosta terrestre ou da economia das nações". Na verdade,Descartes veio consagrar, como único método possível para a ciência, o método axiomático‑dedutivo ,típico da matemática e da geometria,reagindo contra todos os que continuavam a considerar fundamental a argumentação e o confronto dialéctico do aristotelismo e da escolástica. O tal "cataclismo" cartesiano pode facilmente resumir‑se nos quatro preceitos do método analítico e da decomposição pela reflexão que o mesmo Descartes enumera:‑"jamais receber por verdadeira coisa alguma que eu não conhecesse evidentemente como tal"(a chamada regra da evidência);‑"dividir cada uma das dificuldades ... em tantas parcelas quanto ... possível ...para melhor as resolver"(regra da análise);‑"conduzir por ordem os ... pensamentos ,começando pelos objectos mais simples e mais fáceis de conhecer,para subir, pouco a pouco,como que por degraus,até ao conhecimento dos mais complexos,e supondo a existência de ordem entre aqueles que não se sucedem naturalmente uns aos outros"(regra da síntese);‑"fazer sempre enumerações completas e revisões tão gerais que se fique seguro de nada omitir"(regra da verificação).Estes são com efeito os principais mandamentos daquilo que Bernard Roger qualifica como "o marxismo da burguesia,o instrumento teórico da sua conquista do poder e da sua luta contra a aristocracia".

Retirado de Respublica, JAM

Foto picada de Carlos Eduardo Tibúrcio