Criar Valor
Mais uma lição de Economia Social,
Nesta escola que é o Jornal de Negócios
por João Borges de Assunção
Porém, a criação de valor é difícil de medir ou aferir. A contabilidade empresarial tem muita dificuldade em medir o valor criado. Na nossa economia, em que as empresas têm liberdade para entrar e sair dos mercados, os lucros são uma medida, imperfeita, imprecisa e de curto prazo, do valor criado para os accionistas de uma empresa no longo prazo.
Acresce que convém saber para quem se está a criar valor: para os accionistas, para os consumidores, para a sociedade ou para os gestores. Cada uma destas entidades vê de forma diferente o valor criado. Mas de uma forma ou doutra só vão sobrevivendo as empresas que criam valor suficiente que justifique os recursos que consomem. A sobrevivência e perenidade de uma empresa são um sinal de que tem feito coisas bem feitas através do tempo. Ou isso ou tem tido sorte, o que também é muito útil nos meios empresariais.
Convém ainda saber como é criado o valor. O que é que cada empresa faz que a torna útil aos outros? Cada empresa faz coisas diferentes e, dessa forma, contribui positivamente para a sociedade. Essa fórmula de criação de valor é muitas vezes difícil de perceber para as entidades externas, e mesmo para muitas das pessoas que constituem a organização.
A criação de valor não pode ser dissociada do conhecimento, da produtividade e da inovação. A evolução tecnológica vai modificando rapidamente a forma como cada empresa cria valor. Para a maior parte das empresas ficar parado significa criar cada vez menos valor. A partir de certa altura as empresas podem mesmo começar a destruir valor, isto é, a consumir mais recursos do que o valor dos bens e serviços que produzem. Nessa altura o normal é que as empresas saiam do mercado.
Uma melhor alternativa a sair do mercado é ir sempre melhorando a forma como se cria valor. Isso exige que a empresa, em particular a sua liderança de topo, tenha uma visão de futuro e uma estratégia para executar essa visão. Nesta perspectiva, o aproveitamento de regras especiais ou tratamento privilegiado podem dar lucro a uma empresa, mas dificilmente criam valor para a sociedade. É por isso que as alterações fiscais em benefício de uma determinada indústria, região ou classe profissional dificilmente pode criar valor. Quanto mais simples, uniformes e transparentes forem as regras vigentes numa sociedade, mais fácil é para as empresas focarem-se na criação de valor para a sociedade e não na forma como podem dobrar as regras a seu favor.
É a gestão de topo que deve assumir a responsabilidade se os objectivos organizacionais não forem atingidos. Passar a culpa para os colaboradores é indício de incompetência. Quando o líder de uma empresa já não sabe o que fazer para criar valor deve dar lugar a outro. É por isso que hoje a rotação de líderes empresariais é tão elevada. Os accionistas reconhecem rapidamente quando a criatividade e entusiasmo de um líder se esfumou.
Quando olhamos para o universo empresarial português temos de reconhecer que a estabilidade excessiva, quer nas empresas quer nas suas lideranças, sugere que há muitas oportunidades de mudar para melhor a liderança e a estratégia das empresas.
Também o Estado devia tentar perceber como cria valor para os cidadãos. Porém, ao contrário das empresas, em que o lucro é uma medida razoável da criação de valor, o Estado não tem nenhuma medida sintética do valor criado. Certamente que a diferença entre impostos cobrados e despesas efectuadas não reflecte o valor criado pelo Estado. Seria muito útil ao país que alguém percebesse o valor criado pelas despesas do Estado. Infelizmente, muitas despesas são assumidas sem qualquer preocupação com a criação de valor. Esta sim seria uma grande reforma. Passar a justificar a acção do Estado com uma resposta simples à seguinte pergunta: como é que esta medida cria valor para a sociedade portuguesa?
A preocupação com o valor não é uma questão de “economicismo”. É acima de tudo uma visão do mundo que centra a atenção dos líderes no essencial e importante em detrimento do mediático ou acessório."