terça-feira, 2 de outubro de 2007

Queda (A) de um Anjo, 1866

Romance de Camilo Castelo Branco, satirizando a classe política.

Para alguns, a caricatura de D. António Aires Gouveia, bispo de Betsaida (1828-1916). Na ficção, o deputado Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda, morgado da Agra de Freimas, nascido em 1815, é eleito deputado com 44 anos, por Miranda do Douro, quando nas Câmaras havia três deputados legitimistas e os "liberais" estavam na oposição. Ele que era santo homem lá das serras, o anjo do fragmento paradisíaco do Portugal velho caiu (p.265). Caiu o anjo, e ficou simplesmente o homem, homem como quase todos os outros, e com mais algumas vantagens que o comum dos homens (p.265). Os miguelistas chamaram-lhe liberal e acérrimo. Respondeu: estou português do século XIX (p. 241) no rumo em que o farol da civilização alumiava com mais clara luz I(id.) Disse que escolhia o seu humilde posto nas fileiras dos governamentais, porque era figadal inimigo da desordem, e convencido estava de que a ordem só podia mantê-la o poder executivo, e não só mantê-la, senão defendê-la para consolidar as posições, obtidas contra os cobiçosos delas. Reflexionou sisudamente, e fez escola. Seguiram-se-lhe discípulos convictíssimos, que ainda agora pugnam por todos os governos, e por amor da ordem que está no poder executivo (p. 243) Depois de se enlevar nas delícias de França (p. 262) de se falagelar na ciência moderna e na leitura de livros modernos (p.262) e fechado o triénio da legislatura, foi agraciado com o título de barão de Agra de Freimas, e carta de conselho. Sondou o ânimo de alguns influentes eleitorais de Miranda para reeleger-se pelo seu círculo. Disseram-lhe que o mestre-escola lhe hostilizava a candidatura, emparceirado com o oboticário. Arranjou o barão dois hábitos de Cristo, que fez entregar com os respectivos diplomas, aos dois influentes. Na volta do correio foi-lhe asseguarada a eleição. que, de mais a mais, o Governo apoiava (p.263).

. Adriano Moreira, «A Queda de um Anjo e a Classe Política», in Roteiros, n.º 11, Jul./Dez., Lisboa, 1990.

Retirado de Respublica, JAM